13 Outubro 2022
A entrevista com Gianfranco Rosi é de Federico Pontiggia, publicada por Il Fatto Quotidiano, 12-10-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Gianfranco Rosi, como é seu último filme, In viaggio?
In viaggio não sugere respostas, é uma via sacra terrena. E um tributo a quem tenta mudar alguma coisa. Começa com o radar que capta as vozes desesperadas de uma embarcação que está afundando no Mediterrâneo: “What is your position?”, pergunta o capitão. Serve de metáfora para todo o filme: qual é a nossa posição em relação à guerra, às armas? Onde estamos, onde está cada um de nós?
E você, Rosi, onde você está?
Esta guerra envolveu a todos nós, precisamos de um momento de reflexão, todos estamos perdendo um pouco.
Devemos encontrar uma saída a todo custo, é hora de passar para a agenda de Bergoglio. E quando então ouço: "Ah, mas é o papa, é claro que ele é contra a guerra e pela paz", como se fosse uma atitude pastoral, como se essa tragédia fosse inevitável, sem poder intervir...
Como surgiu esse seu documentário sobre suas missões apostólicas do Papa Francisco?
Para o Fuocoammare a Lampedusa cruzei com o Papa Francisco em sua primeira viagem, nove anos depois Notturno, como ele, fazia uma escala no Iraque, e em 2010 eu tinha realizado El Sicario no México, destino de outra viagem a Bergoglio: essas coincidências me fizeram refletir. Até hoje fez 37 viagens a 53 países, é um papa em constante movimento, a sua é uma peregrinação ao contrário. Eu o enquadro fora dos muros do Vaticano, queria sair dos labirintos da Igreja, que Francisco nos levasse a cantos do mundo atingidos pelas tragédias de nosso tempo, que suas viagens fossem um mapa da condição humana.
O desafio?
A liberdade total. O Vaticano me deu 800 horas de material, e com meu montador Fabrizio Federico fiz uma primeira montagem: experimental, abstrata, com uma estrutura impressionista, não como tese. Um filme sobre o papa, sem teologia ou ideologia, sem juízos. Partia-se do Iraque e se chegava a Lampedusa por livres associações.
No entanto, não é o filme que encontramos nas salas, o que aconteceu?
A guerra. Ela estourou em fevereiro, cruzou-se com o filme e devorou a montagem. Entrei em crise: como chegar ao conflito? O papa havia tomado uma posição muito dura: “Pare a mão de Caim! Ilumine a nossa consciência, não seja feita a nossa vontade, não nos abandone às nossas ações! Pare-nos, Senhor, pare-nos! E quando tiver parado a mão de Caim, cuide dele também. Ele é nosso irmão. Ó Senhor, coloque um freio à violência! Pare-nos, Senhor!”
Solução?
O mais simples, montar em sentido cronológico, de Lampedusa à guerra na Ucrânia. In viaggio encontrou uma estrutura própria, até uma autodeterminação: um caminho inelutável, que atravessa a história, que na iteração dos vários temas, da pobreza à venda de armas e ao meio ambiente, parece um desdobramento das encíclicas papais.
O filme parte do sonho.
E o sonho hoje é o cessar-fogo que o Papa Francisco pediu. Aspirar à paz pode parecer um sonho, mas as Nações Unidas também nasceram de um sonho, também a paridade de direitos, também os sindicatos e o fim da segregação racial. In viaggio começa com estas palavras de Francisco:
“Nunca pense que a luta que você está travando aqui é totalmente inútil. E, acima de tudo, sonhe, não tenha medo de sonhar”. Acredito que seja um dever de todos aspirar à paz, a agenda de Bergoglio é hoje a única possível.
Quem não pega nas mãos a agenda de Bergoglio?
A política, os EUA com certeza. Os interesses dos EUA muitas vezes não coincidem com aqueles da Europa. Considero que essa seja uma derrota da diplomacia e da Europa. A política estadunidense é marcada por eleições de meio de mandato, então Biden provavelmente entenderá o que fazer: enquanto isso, ganha tempo.
In viaggio é aberto.
Está em devir, porque quero acompanhar o processo do papa rumo à paz. Termina com aquela cortina em movimento, e será mais uma viagem apostólica, espero importante para uma solução pacífica.
Em Kiev ou em Moscou?
Nas duas cidades, provavelmente primeiro Kiev e depois Moscou, mas não se pode excluir uma delas. Há um momento dramático no filme, já em 2016 o papa nos falava dessa guerra. Quando repassei os materiais, perguntei-me: "Mas que guerra?" Bergoglio se encontrava com o patriarca de Moscou Kirill, hoje parece um abraço com o diabo, na época era ecumênico.
Imediatamente depois, ele teria dito algo aos jornalistas que agora soa como uma profecia: "Discutimos sobre as nossas Igrejas, mas sobretudo sobre a guerra, que agora é circunscrita, mas corre o risco de nos envolver". Hoje envolveu a todos nós, e talvez não pudéssemos ter sido equidistantes na época, nos virar para o outro lado. Seis anos atrás, era o momento de intervir com força, mas só descobrimos a guerra em Donbass alguns meses atrás.
Quem se virou para o outro lado?
Todo o Ocidente, a Europa, os EUA.
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“Paz, Biden ignora a agenda de Bergoglio: mas é a única possível”. Entrevista com Gianfranco Rosi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU