27 Novembro 2020
“Não podemos permitir que esta indústria farmacêutica do lucro proceda sem rigorosas avaliações independentes, no maior experimento humano transgênico até esta data. Tampouco que sejam apoiadas com dinheiro do erário e voluntarie pessoas que não são informadas do espectro real de riscos e incertezas que há em jogo. A vacina é o mais delicado dos enfoques na pandemia, e não será solucionado, na verdade, se espera que o mercado subsista por anos”, escreve Silvia Ribeiro, diretora para América Latina do Grupo de Ação sobre Erosão, Tecnologia e Concentração (Grupo ETC), em artigo publicado por Alai, 25-11-2020. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.
O desenvolvimento de vacinas para a covid-19 é um golpe histórico de lucros para a grande indústria farmacêutica. Não somente se conseguem efetividade e a vendem, também desde antes pela especulação financeira com suas ações, e sobretudo, graças aos enormes subsídios governamentais que estão recebendo. Segundo o Financial Times, vender a vacina pode ser pura ganância, porque os custos já foram cobertos com dinheiro público antecipado (Anna Gross, Financial Times, 12-11-2020).
Outro aspecto muito preocupante: as empresas que anunciaram uma efetividade de mais de 90% em suas vacinas para a covid-19, Pfizer/BioNtech e Moderna, utilizam uma nova técnica de engenharia genética (mRNA) nunca antes testada em seres humanos. A vacina é experimental frente à covid-19, porém é a própria técnica e seus efeitos imprevistos em geral. Suas afirmações de que são seguras são mais bravatas comerciais: não existe forma de assegurar que não tenham riscos a médio ou longo prazo. Inclusive a curto prazo, porque não se sabe que efeito são detectados ou não são reportados. A respeito disso, a União de Cientistas Comprometidos com a Sociedade e a Natureza na América Latina (UCCSNAL) emitiu um pronunciamento no qual explica os riscos potenciais e chama a aplicar extrema precaução e avaliação independente antes de autorizar estas vacinas transgênicas.
As empresas sabem desta falta de certeza. O diretor-executivo da Pfizer, Albert Bourla, havia calculado friamente vender grande quantidade de suas ações no dia do anúncio da nova vacina, dia no qual experimentaram um aumento súbito de valor, de 5,6 milhões de dólares. Também a vice-presidente da mesma empresa Sally Susman vendeu ações naquele dia pelo valor de 1,8 milhão de dólares. Além da (permitida) violação de confiança, reflete que ambos estimaram que depois as ações poderiam cair. As ações da Pfizer subiram 7,7% e a das BioNtech 13,9%. As da Moderna subiram 13% uma semana depois.
Recordemos que o interesse principal das grandes transnacionais farmacêuticas não é a saúde, mas o lucro. De fato, seu cliente ideal são as pessoas doentes, porque as saudáveis ou falecidas deixam de consumir. Esta indústria fez tais porcentagens de lucro que foram objeto de análises de várias comissões de concorrência, inclusive nos EUA, que confirmou que tinham porcentagens de retorno de lucros maiores que muitas outras indústrias. Ademais, tem um amplo e péssimo histórico em reconhecer seus erros e os graves efeitos secundários que provocaram diversas pessoas, assim como em assumir os custos destes e indenizá-las. Segundo o instituto de pesquisa Gallup, em 2019, as empresas farmacêuticas passaram a ser as piores consideradas pelo público dos EUA, ainda mais abaixo que as indústrias de petróleo e gás ou as de propaganda por seus abusos.
Ao início da pandemia em 2020, várias grandes farmacêuticas duvidavam em investir em vacinas, porque com as epidemias anteriores, os vírus sofreram mutações e não a viam como um bom investimento. Anna Gross reporta no Financial Times que as empresas mudaram de opinião quando viram que os contágios se transmitiam entre pessoas e que isso assegurava uma área e um período muito maior de permanência da pandemia. Porém, o fator principal, agrega, foram os enormes subsídios públicos “sem precedentes”, especialmente nos Estados Unidos. A “Operação Warp Speed” da administração estadunidense outorgou 1,2 bilhão de dólares a AstraZeneca; 1,5 bilhão a Johnson e Johnson; 1,6 bilhão a Novavax; 1,95 bilhão a Pfizer; 2 bilhões a Sanofi/GSK e 2 bilhões a Moderna, entre investimentos e acordos de compra. David Mitchell, da associação civil Pacientes por Medicamentes Acessíveis, destacou que no caso da Moderna, o governo parece ter pago todos os custos de pesquisa e desenvolvimento, pelo qual o alto preço de venta que anunciou (60 dólares por vacina, 3-6 vezes maiores que outras em curso) é tudo lucro. A colaboração da Moderna com o Instituto Nacional de Saúde, dirigido por Anthony Fauci, no desenvolvimento da vacina prevê ainda mais recursos públicos, como recrutar e supervisionar voluntários, etc.
A Moderna espera lucros adicionais com outras vacinas que tem em caminho, com a mesma tecnologia de mRNA que nunca foi testada. Graças ao estado de aprovação urgente pela pandemia que estão solicitando as empresas, esperam poder logo comercializar as outras vacinas também.
Não podemos permitir que esta indústria do lucro proceda sem rigorosas avaliações independentes, no maior experimento humano transgênico até esta data. Tampouco que sejam apoiadas com dinheiro do erário e voluntarie pessoas que não são informadas do espectro real de riscos e incertezas que há em jogo. A vacina é o mais delicado dos enfoques na pandemia, e não será solucionado, na verdade, se espera que o mercado subsista por anos. O que se necessita é questionar as causas e prevenir. Ademais, há outras vacinas em desenvolvimento que não agregam a nova camada de riscos destas da Pfizer, Moderna e outras de RNA e DNA.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Vacinas, riscos e negócios. Artigo de Silvia Ribeiro - Instituto Humanitas Unisinos - IHU