09 Setembro 2018
O cardeal Gianfranco Ravasi, presidente do Pontifício Conselho para a Cultura, não está particularmente preocupado com os recentes ataques ao Papa, pois recorda que sempre houve lutas internas, embora agora tenham maior repercussão midiática. Considera, no entanto, que devemos defender Francisco contra os ataques daqueles que têm um conceito de Igreja “esclerosado e muito rígido”, porque eles colocam em crise “a própria arquitetura da fé” ao criar uma “confusão extrema” entre os fiéis.
A entrevista é de Darío Menor e publicada por Vida Nueva, 07-09-2018. A tradução é de André Langer.
Há muitas pessoas preocupadas com as notícias que apresentam o Vaticano como um ninho de corvos. A atmosfera na cúria romana piorou desde que você chegou a ela há onze anos?
Eu diria que não, embora, obviamente, este período que eu conheço de Bento XVI e de Francisco tenha sido diverso do ponto de vista da experiência pastoral. É inegável. Cada pontificado tem sua própria identidade, que faz parte do dinamismo da própria Igreja. A alteração dos horizontes sociais também exige uma mudança de horizontes pastorais. Mas ambos os pontificados têm sido atravessados por tensões. Com Bento XVI houve lutas internas e já existia o problema da pedofilia. Nessa época também surgiu o problema na Irlanda.
Não existe, então, um ambiente irrespirável dentro da cúria romana?
Nada disso. Este também não é nenhum ninho de cobras. Nas reuniões dos prefeitos de dicastérios vaticanos, por exemplo, a imprensa poderia estar perfeitamente presente para que se visse que não há nenhuma atmosfera irrespirável. Isso não exclui a existência de sensibilidades diferentes e visões eclesiais com, obviamente, acentos diferentes. Muitos escândalos são inflados. Pensemos, por exemplo, naquele que ficou conhecido como o caso de Paolo Gabriele, o ex-assistente de Bento XVI.
Quer dizer que a novidade consistiria em que agora os ataques vêm do setor mais conservador, aquele que tradicionalmente tem se sentido mais ligado à figura do Bispo de Roma?
Sim. Dentro do horizonte jornalístico e cultural, há sempre pulsões e expressões que, no final, são instrumentais. Sempre acontece, é inevitável. O fato de que exista essa diversidade é indiscutível. Penso que essa atitude é promovida em parte pelos meios de comunicação, que mudaram muito sua posição desde a época de Bento XVI. Nessa época já existia a internet, mas a potência das redes sociais explodiu nos últimos quatro ou cinco anos.
Como você, pessoalmente, vive o fato de que haja companheiros seus do Colégio Cardinalício que criticam de forma quase agressiva o Papa?
Obviamente, sinto-me muito próximo por sensibilidade do Papa Francisco, mas não esqueçamos que Bento XVI me apoiou totalmente no dicastério e foi ele quem me chamou para Roma. Vejo que existem diferentes sensibilidades e visões eclesiais. Aqui, voltemos sempre ao fato de que o corpo eclesial pode ser concebido não como um corpo ideal, mas como um corpo composto de pessoas concretas e diversas.
Você tem uma ideia de quantos são os inimigos internos do Papa?
Uma vez foi feita uma investigação sobre aqueles que seguem as páginas na internet ultraconservadoras e se viu que são muito poucos. Em alguns casos tinham cerca de mil seguidores. Eu mesmo tenho 105 mil seguidores no Twitter e não é um grande número. Mas eles são muito habilidosos em fazer seu discurso. Eles sabem usar as técnicas da internet. E depois há o eco da mídia, também daqueles meios de comunicação que poderiam ser favoráveis ao Papa, e assim as coisas se inflam cada vez mais. Enquanto isso, o povo, que em sua maioria está em sintonia com Francisco, está perplexo.
Você considera que por trás desses ataques está a vontade de fazer Francisco renunciar ao pontificado?
Pode ser. Mas Francisco não é uma pessoa que deixe de dormir por causa disso. Embora sejam coisas que, sem dúvida, ferem. Comigo acontece o mesmo. Quando me atacam, não tenho problema para dormir; além do mais, fico curioso para ver os argumentos que são usados. Há uma acrimônia pela qual os elementos que podem ser reais são usados de maneira mal-intencionada.
Existe uma estratégia planejada para atacar o Papa?
Há muitos elementos que coincidem na rede que é a internet, mas não há por trás deles um “grande irmão”. Alguns são mais poderosos que outros, mas também entre eles há diferenças. É mesquinho perder-se nessas polêmicas quando se podem tratar questões delicadas e importantes. Mas é necessário apoiar o Papa. Os críticos contam com centros de informação com os quais são capazes de criar uma mitologia. Usam-nos para atacar problemas reais, como os abusos. Eles falam, por exemplo, do “caso McCarrick”, mas foi justamente Francisco quem o expulsou do Colégio Cardinalício, o que não é um fenômeno único, mas muito raro.
Qual é o motivo de base para a falta de sintonia de alguns com o Papa? Aborrecimentos com a reforma, com a sua posição pastoral ou com a luta contra a pedofilia?
É pelo conceito de Igreja. Muitos daqueles que se opõem a Francisco têm um conceito de Igreja esclerosado e muito rígido. Por outro lado, do ponto de vista teológico, eles não têm onde se agarrar. O Papa Francisco colocou o acento mais na parte pastoral do que na parte estrutural, considerando que a estrutura doutrinal já é bastante sólida. Sua pregação está ligada à tradição da Igreja. Nas críticas também pesam os interesses políticos e pessoais, porque alguns querem se afirmar e ganhar poder.
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“Os ataques não tiram o sono do Papa”. Entrevista com Gianfranco Ravasi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU