04 Dezembro 2025
"Tanto Aluísio Mendes quando Guilherme Derrite militam no “Republicanos” de Tarcísio de Freitas, governador do estado cuja capital acaba de registrar recorde de feminicídios, com 53 mulheres assassinadas por serem mulheres num ano da Graça que ainda não terminou."
O artigo é de Hugo Souza, jornalista, publicada no blog Come Ananás, 03-12-2025.
Eis o artigo.
O hoje deputado federal Aluísio Mendes era o secretário de Segurança Pública do Maranhão durante uma das piores ondas de violência da história do estado, na primeira metade da década de 2010, no segundo governo Roseana Sarney, quando a capital São Luís virou um rastilho de ônibus incendiados e delegacias de polícia atacadas a tiros e quando cabeças rolavam — literalmente — no presídio estadual de Pedrinhas.
Policial federal de carreira, Aluísio Mendes foi nomeado por Roseana após servir à pátria como guarda-costas de José Sarney, pai da então governadora. Agora, em setembro, como prêmio por ter fracassado em diminuir a violência no Maranhão, Mendes ganhou de Hugo Motta a presidência da Comissão Especial da PEC da Segurança Pública, para estropiar — junto com o indefectível Mendonça Filho, nomeado por Motta relator — a PEC enviada pelo governo Lula ao Congresso Nacional.
Do modinho igual ao que Hugo Motta nomeou Guilherme Derrite para mutilar outra proposta legislativa séria sobre Segurança Pública, o PL Antifacção, enviada pelo governo ao Congresso. Diante de qualquer, mas qualquer mesmo, plano de Segurança Pública que vá representar uma ameaça às raízes graúdas do crime organizado no Brasil, deputados do “bolsonarismo raiz” e do bolsocentrão entram em pânico mal dissimulado, ao mesmo tempo em que seus chefes-governadores de estados posam sorridentes — “Consórcio da Paz” — diante da chacina de Claudio Castro no Rio de Janeiro.
Tanto Aluísio Mendes quando Guilherme Derrite militam no “Republicanos” de Tarcísio de Freitas, governador do estado cuja capital acaba de registrar recorde de feminicídios, com 53 mulheres assassinadas por serem mulheres num ano da Graça que ainda não terminou.
O feminicídio foi incluído no rol dos crimes hediondos em 2015, primeiro como circunstância qualificadora do crime de homicídio, hoje como crime autônomo.
Não obstante, ano passado, quase uma década depois — e depois de Jair Bolsonaro cortar 90% da verba para enfrentamento da violência contra a mulher ao longo do seu desgoverno, e após a farra armamentista promovida por Bolsonaro resultar num aumento de 1.200% das ocorrências envolvendo CACs em casos de Lei Maria da Penha —, o Brasil registrou recorde de feminicídios, com 1.492 mulheres assassinadas por serem mulheres em 2024.
Nada obstante, no dia 17 de novembro, Aluísio Mendes disse ao jornal O Globo que ele e Mendonça Filho tiveram a ideia de enxertar na PEC da Segurança Pública os crimes “super-hediondos”, “super-graves”, dando o seguinte exemplo: “como em casos de feminicídio quando se mata a mãe na frente do filho”.
Na ocasião, registramos no Come Ananás que quem está encarregado de propor alterações na Constituição brasileira para tentar diminuir a violência no país e aparece falando em crimes “super-hediondos”, em crimes “super-graves”, não quer mudar nada, não quer reduzir a violência no meio social; quer apenas atualizar as definições de jogar para a plateia.
A imprensa corporativa informa que o relatório da PEC da Segurança Pública deve sair nesta quinta-feira, 4. Talvez Aluísio Mendes e Mendonça Filho tenham tido ideias de última hora, diante dos últimos acontecimentos.
Quem sabe irão propor crime “mega-hediondo” para ex-namorado que atropelar e esfolar a ex-namorada no asfalto, arrastando-a por um quilômetro agarrada no carro, fingindo crer mesmo, no duro, o legislador, que cálculos sobre tempo e progressão de pena na hora “passional” falarão mais alto ao feminicida do que o veneno misógino a ele destilado nos últimos anos, dia após dia, pela extrema-direita inimiga das “feminazis”.
Talvez o relatório da PEC da Segurança Pública saia do forno das oligarquias do Nordeste com a tipificação do crime “híper-ultra-maxi-hediondo” para quem cometer duplo homicídio de mulheres em Centro Federal de Educação Tecnológica, ignorando solenemente, o legislador — e jogando dois corpos femininos para a plateia —, que o CAC matou no Cefet e, ato contínuo, meteu uma bala na própria cabeça envenenada com as piores ideias da história da humanidade, como não admitir ser chefiado por quem não tem, no meio das pernas, um pau.
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