07 Novembro 2025
Mesmo com adesão expressiva, o governo federal destacou o aporte financeiro de apenas cinco países ao Fundo Florestas Tropicais para Sempre — Brasil, Noruega, Indonésia, França e Portugal. O fundo já soma pouco mais de US$ 5 bilhões, e a meta é alcançar US$ 10 bilhões na fase inicial para que o mecanismo possa começar a operar.
A reportagem é de Fábio Bispo, publicada por InfoAmazonia, 06-11-2025.
O governo brasileiro anunciou que ao menos 53 países já manifestaram apoio à criação do Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, sigla em inglês), lançado nesta quinta-feira (6), em Belém, no primeiro dia da cúpula de chefes de Estado que antecede oficialmente a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30).
Apesar do número expressivo de adesões, o governo destacou o aporte financeiro de apenas cinco países até o momento: Brasil (US$ 1 bilhão), Noruega (US$ 3 bilhões), Indonésia (US$ 1 bilhão), França (US$ 500 milhões) e Portugal, que anunciou um aporte de US$ 1 milhão. A meta do governo é atingir ao menos US$ 10 bilhões na fase inicial para que o mecanismo possa começar a operar e chegar aos US$ 125 bilhões quando totalmente capitalizado. Até o momento, o TFFF já atingiu pouco mais de US$ 5 bilhões.
“Já temos 50% do que esperávamos conseguir em compromissos até o ano que vem. A China e outros países já sinalizaram apoio”, afirmou o ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
Haddad informou ainda que novos anúncios devem ocorrer durante a COP30, com boas expectativas para a manifestação da Alemanha, que aguarda reunião bilateral com o presidente Lula (PT), e uma iniciativa do Reino Unido, que, por meio do príncipe William, pretende lançar uma campanha de mobilização entre setores público e privado.
Maior doador até o momento, o governo da Noruega condicionou seu investimento a uma arrecadação mínima de outros investidores.
“Precisamos ver ao menos US$ 10 bilhões comprometidos até 2036. A Noruega não representará mais de 20% do total, porque este deve ser um esforço compartilhado. Trata-se de um investimento, não apenas de uma doação. O modelo precisa ser financeiramente sólido e capaz de gerar retorno”, afirmou o ministro do meio ambiente da Noruega, Andreas Bjelland Eriksen.
Um novo modelo de financiamento
Apresentado como uma inovação brasileira em mecanismos climáticos, o TFFF propõe pagar cerca de US$ 4 por hectare preservado em países tropicais, com redução dos repasses em casos de desmatamento, queimadas ou degradação ambiental. Cada país poderá decidir como aplicar os recursos, desde que respeite as salvaguardas do fundo e destine ao menos 20% diretamente a povos indígenas e comunidades tradicionais.
Os dados de monitoramento deverão ser públicos e auditáveis, garantindo transparência e credibilidade ao sistema.
Segundo o Itamaraty, o fundo já conta com apoio político de potenciais investidores como Alemanha, China, Japão e Reino Unido, além de nações florestais que juntas concentram 90% das florestas tropicais do planeta, como a República Democrática do Congo, Peru e Colômbia.
Para a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, o fundo “representa uma virada na lógica do financiamento climático, com retorno garantido aos investidores e benefícios diretos às populações florestais”. Já Sonia Guajajara, ministra dos Povos Indígenas, destacou que o mecanismo “garante autonomia e continuidade às comunidades, independentemente de mudanças de governo”.
O TFFF prevê uma alavancagem de recursos privados a partir do aporte público inicial. O objetivo é captar US$ 25 bilhões nos primeiros anos, o que poderia mobilizar mais de US$ 100 bilhões adicionais do setor privado — o chamado capital sênior do fundo.
“Se cada país do G20 aportar o equivalente ao que o Brasil está comprometendo, fechamos a conta”, disse Haddad. “Quantas COPs se passaram sem um anúncio prático como este? É uma tecnologia ambiental feita no Brasil.”
O papel do Brasil e o discurso de Lula
No discurso de lançamento do fundo, o presidente Lula enfatizou que o TFFF não se baseia em doações, mas em pagamentos por serviços ambientais, reforçando o protagonismo do Sul global:
“Estamos falando de mais de um bilhão de hectares de florestas tropicais distribuídos em 73 países em desenvolvimento. O Brasil será o primeiro a investir US$ 1 bilhão nesse fundo. Esperamos também contar com o engajamento do Banco dos BRICS, [bloco econômico que reúne Brasil, Rússia, Índia, China], do Banco Africano e de outros bancos regionais”.
Durante a plenária, Lula defendeu a eliminação gradual do uso de combustíveis fósseis e a criação de metas globais para conter o desmatamento, apesar das críticas internas à recente liberação de exploração de petróleo na margem equatorial.
“Apesar das nossas dificuldades e contradições, precisamos de um mapa do caminho para reverter o desmatamento, superar a dependência dos combustíveis fósseis e mobilizar os recursos necessários”, afirmou o presidente.
Apesar do otimismo internacional, a aposta brasileira no multilateralismo verde convive com contradições internas, como o avanço de projetos de petróleo e leis que fragilizam a proteção ambiental, a exemplo do PL do Licenciamento Ambiental e da lei do marco temporal.
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