Diplomacia que não cede. Religiões, baluarte do diálogo. Artigo de Andrea Riccardi

Pintura na sede do Dicastério para o Diálogo Inter-religioso, com Paulo VI, Gandhi e líderes religiosos | Foto: Vatican Media

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31 Outubro 2025

"Há uma transição a ser feita. Da era da guerra e da violência para a era do diálogo e da negociação. Todos podem contribuir para isso, onde quer que vivam, desde que não cedam ao pessimismo que considera a guerra inevitável. Como demonstrou o Papa Leão XIV, a paz é central na vida da Igreja. Ele o fez convidando cada comunidade ou paróquia a se transformar em uma 'casa de paz'", escreve Andrea Riccardi, fundador da Comunidade de Sant'Egídio e ex-ministro italiano, em artigo publicado por Avvenire, 29-10-2025. A tradução de Luisa Rabolini.

Eis o artigo.

A paz desapareceu do horizonte de muitos países. Mas também do horizonte internacional como referência fundamental. A guerra foi reabilitada.

Até mesmo — por alguns — considerada inata à experiência humana. Estamos em plena idade da força.

A linguagem internacional também é afetada, tendo se tornado propaganda ou, muitas vezes, teatro. Um teatro que não diverete. Assusta. Diariamente, uma dose de medo é injetada nos povos: medo da guerra, inclusive atômica, da violência, do outro. Do mundo, uma cultura de violência se infiltra todos os dias na vida cotidiana, afetando e alterando as relações entre as pessoas.

Os líderes de diferentes Igrejas e religiões mundiais reuniram-se no espírito de Assis, convocados pela Comunidade de Santo Egídio, para o encontro anual de oração e diálogo em Roma, precisamente nos dias que marcaram o sexagésimo aniversário da Nostra Aetate e o trigésimo nono aniversário de Assis.

Lançaram um apelo: "Abandonemos o tempo da força e entremos no tempo do diálogo e da negociação, pois somente ele pode trazer paz e segurança." O Apelo foi proclamado ontem à tarde, na presença de Leão XIV, diante do Coliseu e do Arco de Constantino, em um lugar impregnado de memórias (também de guerra e violência), ao final de três dias de fraternidade e diálogo. Não se trata apenas de um Apelo, mas de uma manifestação da vontade das religiões de construir caminhos de paz através da oração e do encontro, apesar de a política muitas vezes seguir na direção oposta. Esse é um aspecto significativo da resistência à guerra: a dos fiéis, para além de suas diferenças. Leão XIV apoiou esses buscadores da paz, unindo-se a eles: "Agradeço-lhes", disse ele, "por terem vindo aqui rezar pela paz, mostrando ao mundo o quanto a oração é decisiva". Ele acrescentou: "Temos fé de que a oração possa mudar a história dos povos". Disso nasce a firme convicção, mesmo em tempos tão difíceis, de que o mal não pode vencer. E a guerra é o mal, com seu interminável rastro de dor e consequências duradouras. A história dos povos, o futuro das crianças, não podem ser sequestrados por projetos violentos. "O mundo anseia por paz", disse o Papa.

Os povos desejam a paz, os feridos da guerra, os refugiados e tantos outros a imploram. A paz foi sequestrada por poucos, por políticas imperialistas ou terroristas, por ideologias nacionalistas, por interesses econômicos, pelo orgulho de não dialogar. Ela precisa ser libertada! A oração dos fiéis pode muito. Mas sua ação, uma vez despertada da indiferença ou do medo, também pode muito. De fato, mesmo em nossas Igrejas e entre nós, a impotência diante da grande política e das armas poderosas nos faz sentir impotentes.

O que nós, pessoas comuns, podemos fazer? Mas da impotência, se desliza facilmente para a indiferença, nos recolhemos em nossa própria bolha, esperando não ser atingidos pelos conflitos. Vemos isso até mesmo em nossas missas dominicais, onde — como às vezes percebo — reza-se pouco pela paz. Precisamos recomeçar com determinação: "Recomecemos por Assis, a partir daquela consciência de nossa tarefa comum, daquela responsabilidade pela paz", disse Leão. Durante o encontro de três dias em Roma, partindo de diferentes posições religiosas e políticas, despontou uma convergência na convicção de que "o mundo sufoca sem diálogo" (Papa Francisco).

E o diálogo deve ser reacendido em todos os níveis, o encontro e a diplomacia revitalizados, permeando a sociedade. É uma cultura de paz impulsionada pela convicção madura de que "outra história é possível" (Leão XIV). O Papa captou o que emergiu dos trabalhos e que se encontra no Apelo Final, expressando-o nas palavras de La Pira: "Precisamos de uma história diferente para o mundo: a história da era da negociação, a história de um novo mundo sem guerra".

Há uma transição a ser feita. Da era da guerra e da violência para a era do diálogo e da negociação. Todos podem contribuir para isso, onde quer que vivam, desde que não cedam ao pessimismo que considera a guerra inevitável. Como demonstrou o Papa Leão XIV, a paz é central na vida da Igreja. Ele o fez convidando cada comunidade ou paróquia a se transformar em uma "casa de paz".

Talvez devêssemos nos apegar menos às nossas próprias agendas e acolher os sinais dos tempos e a sede de paz de tantas pessoas, próximas e distantes. O Papa concluiu seu discurso, em sintonia com os líderes religiosos que, antes do Apelo, haviam rezado segundo suas diferentes tradições religiosas, dizendo: "Tornamo-nos voz daqueles que não são ouvidos e não têm voz. É preciso ousar a paz! E se o mundo se mostrar surdo a esse apelo, temos certeza de que Deus ouvirá nossa oração e o lamento de tantos que sofrem. Porque Deus quer um mundo sem guerra. Ele nos libertará desse mal!" As palavras do Papa ecoam os sentimentos dos líderes religiosos, mas não podem deixar de envolver os cristãos, que são, como dizia Clemente de Alexandria: eirenikòn genos, um povo de paz.

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