18 Outubro 2025
“A sobrevida do capitalismo são genocídios, mais guerras e a estratégia da confusão”, escreve Raúl Zibechi, jornalista e analista político uruguaio, em artigo publicado por La Jornada, 17-10-2025. A tradução é do Cepat.
Eis o artigo.
O capitalismo realmente existente está multiplicando as guerras, porque é a única forma em que pode sobreviver. Guerras entre estados, guerras internas disfarçadas de combate ao narcotráfico ou defesa da democracia, guerras não declaradas para se apropriar dos bens comuns, guerras imperiais cada vez mais impiedosas. É provável que a próxima seja contra a Venezuela, já que a frágil trégua em Gaza, que chamam de “fim da guerra”, permite que escolham outros cenários para seguir com a escalada militarista.
Segundo o analista Rafael Poch, a expansão da guerra na Ucrânia é iminente e pode envolver toda a Europa, ameaçando levar a uma guerra entre as três grandes potências militares. Ele afirma que as elites europeias não compreendem a história, “não entendem do que se está falando e carecem tanto dos conhecimentos básicos quanto da vitalidade intelectual para tentar compreender”. Não entender e nem aceitar a realidade é o caminho para o desastre.
O bilionário Ray Dalio vem alertando há meses sobre os problemas da enorme dívida dos Estados Unidos, que cresce de forma exponencial, o que ele chama de “bomba do déficit e da dívida”, que representa uma ameaça à ordem monetária. Agora, acrescenta que “estão sendo gestadas várias guerras civis em diferentes partes do mundo”, incluindo destacadamente o coração do Império. O megaespeculador afirma que se começa a sentir “um clima muito semelhante ao dos anos prévios à Segunda Guerra Mundial”. Só que será com armas nucleares.
Os economistas do sistema aceitam que a China já é a maior economia do mundo, representando 20% do PIB mundial, medido em paridade de poder de compra, enquanto o dos Estados Unidos caiu para 14%. Foi em 2014 que a China ultrapassou o Império, mas a diferença segue aumentando e pode crescer ainda mais com as novas políticas de Trump, que estão se voltando contra ele.
A rejeição à imigração é um golpe para a inovação tecnológica, já que são responsáveis por uma parte importante das novas empresas do setor. “Entre os empreendedores, 29% são imigrantes (embora representem apenas 15% da população); 44% dos fundadores das empresas que hoje são unicórnios são imigrantes; e 26% dos imigrantes trabalham nas áreas de ciência, tecnologia, engenharia e matemática”, de acordo com a National Science Foundation.
O que se faz quando tudo está perdido, quando você não tem mais chances de enfrentar o rival com alguma possibilidade de vencê-lo? No futebol, dizemos [em espanhol] embarrar la cancha, com a esperança de adiar o apito final do árbitro que selaria a derrota. As classes dominantes estão fazendo isto. Neste caso, a sobrevida do capitalismo são genocídios, mais guerras e a estratégia da confusão que tem por objetivo turvar as águas, confundir os povos para que continuem sendo... as classes dominantes, independentemente do nome do novo sistema.
Uma parte dessa estratégia da confusão é a suposta assinatura da paz em Gaza. Todos sabemos que a guerra começou com a Nakba, em 1948, com a expulsão forçada de quase um milhão de palestinos, a destruição de centenas de aldeias e da própria sociedade palestina. Nunca houve paz. O que começou dois anos atrás foi o genocídio, uma etapa superior da guerra contra aquele povo. O suposto fim da guerra foi decidido para seguir a espoliação da Palestina sem tantos focos midiáticos, e deixar as mãos livres para iniciar uma nova guerra.
A enorme mobilização global em apoio ao povo palestino, que teve de ser refletida até mesmo pelos grandes meios de comunicação do sistema, levou os perpetradores a fazer o que sempre fazem: mascarar a dominação com novos modos, mudando apenas a embalagem para que tudo permaneça igual. Este é o cerne do chamado progressismo, só que desta vez a manobra foi planejada pela ultradireita de Trump.
Mais uma vez, a questão é o que nós, que dizemos ser anticapitalistas e anti-imperialistas, faremos. Podemos sucumbir à manobra, afrouxando a resistência e a solidariedade, o que seria uma grande derrota.
Podemos entrar de frente na guerra do sistema com a nossa própria guerra, o que nos levaria a lhes facilitar um novo genocídio. Podemos adotar, em cada lugar ao seu modo, a proposta zapatista de resistir e criar o novo, como o Comum, o que supõe um enorme desafio porque envolve percorrer caminhos completamente novos, que não foram transitados por nenhuma revolução no mundo até agora.
Pouco a pouco, vamos compreendendo que o Comum é uma nova estratégia ou forma de luta e resistência. Se entendi alguma coisa, acredito que é um modo de fortalecer a resistência e, ao mesmo tempo, um caminho para a construção do mundo novo. Uma espécie de dobradiça que deveremos explorar, transplantar para cada realidade, testar, cometer erros, e assim por diante.
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