"Moscou não quer uma paz duradoura. O risco de uma guerra nuclear é real" . Entrevista com Mariano Crociata

Foto:United States Department of Energy | Unsplash

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07 Outubro 2025

"Agora as ameaças de ataque nuclear acabam por apagar a distinção entre guerras convencionais e nucleares, tornando real o risco de um conflito atômico", afirma D. Mariano Crociata, presidente dos bispos europeus (COMECE).

A entrevista é de Giacomo Galeazzi, publicada por La Stampa, 06-10-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.

Eis a entrevista.

O senhor vê na Ucrânia uma vontade de negociar a paz ou a OTAN está cedendo à lógica da força da Rússia?

Deve ser reconhecida a vontade da Ucrânia e de todo o Ocidente de negociar a paz o mais rápido possível e de alcançar uma paz justa e duradoura, construindo uma nova arquitetura que garanta a segurança para a região. A atitude de Moscou não parece sinceramente interessada em negociar neste momento. Durante minha recente visita à Ucrânia, pude constatar tanto a imensa tragédia da guerra quanto a coragem dos ucranianos que defendem sua pátria contra uma agressão russa injusta e brutal. Eles precisam do apoio contínuo da comunidade internacional. A Igreja é uma construtora de pontes e uma presença mediadora em todas as frentes mais inflamadas do cenário político.

Por que a UE apoia Kiev?

A luta da Ucrânia pela paz e pela defesa de sua integridade territorial não é apenas uma batalha por seu futuro, pois seu resultado pesará fortemente sobre o destino de todo o continente europeu e de um mundo livre e democrático. Esta guerra deve terminar com uma paz justa e duradoura na Ucrânia, não com uma capitulação. E a Ucrânia, vítima da agressão russa, deve ser parte integrante de toda iniciativa de negociação. Uma paz imposta jamais produzirá uma paz autêntica e duradoura. Tudo isso está condicionado ao respeito pelo direito internacional e a garantias de segurança eficazes que impeçam um novo surto do conflito.

O que a UE pode fazer nos conflitos na Ucrânia e em Gaza?

Se a Europa estivesse realmente unida, poderia fazer muito. O Papa já o disse inúmeras vezes. Se a Europa agisse como uma força unida, confiante e integradora, poderia valorizar plenamente o seu potencial também para a resolução de conflitos, acendendo luzes de esperança num mundo que hoje parece cada vez mais escuro. Só uma Europa configurada dessa forma seria um ator de paz credível também nos cenários de Gaza e da Ucrânia.

Existe um perigo atômico?

Hoje, as armas nucleares tornam-se ainda mais perigosas devido aos dispendiosos programas de modernização nuclear, de novas tecnologias como a IA, de armas hipersônicas e progressos no campo cibernético. A isso soma-se a erosão dos regimes de controle dos armamentos, as violações flagrantes do direito internacional e a perda de responsabilidade moral nas relações internacionais multipolares. Uma explosão nuclear, intencional ou acidental, teria obviamente efeitos catastróficos imediatos, tanto no plano humanitário como ambiental.

Por que a UE não tem voz ativa?

A Europa não é uma nação, mas uma unidade de nações soberanas. Sua política externa está ligada à unanimidade de todos os 27 Estados-membros, quando alcançada. Essa situação dificulta a resolução de conflitos e a promoção da paz. Em nível global, isso é agravado pela erosão progressiva do multilateralismo e pelo enfraquecimento das instituições internacionais. O quadro geopolítico estabelecido no segundo pós-guerra foi profundamente desfigurado.

Isso também se aplica a Gaza?

Um enorme sofrimento humano perdura na Terra Santa há anos. Uma situação além de toda tragédia, absolutamente inaceitável. Cada criança morta é um grito que atinge nossa consciência e uma derrota para a humanidade. Como bispos europeus, apoiamos o empenho de Leão XIV em favor de um cessar-fogo imediato, da libertação de reféns, do pleno acesso às ajudas humanitárias e de negociações que levem à criação de dois Estados para dois povos. Não há futuro baseado na violência, no exílio forçado ou na vingança. Ninguém deveria ameaçar o direito de outro de existir. Como disse o Patriarca Pierbattista Pizzaballa, o plano Trump pode ser o primeiro passo para a construção da paz. A Igreja pode propor soluções técnicas, abrandar os corações, abrir caminhos de diálogo e reconciliação, lembrar aos líderes mundiais que a paz não é uma possibilidade, mas uma necessidade imperativa.

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