03 Junho 2025
"Se Donald Trump se importasse com o antissemitismo, primeiro faria uma limpeza em sua própria casa, cortando o vínculo, que, em vez disso, é muito estreito, com uma série de movimentos supremacistas racistas e nazistoides", escreve Davide Assael, judeu italiano, fundador e presidente da associação lech lechà, professor de filosofia e escritor, em artigo publicado por Domani, 02-06-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
A luta contra o antissemitismo com a qual o presidente justifica seu macarthismo é um evidente pretexto para atacar os centros do pensamento liberal. Se fosse um sincero contraste ao ódio antijudaico, Trump deveria, em primeiro lugar, fazer limpeza em sua própria casa.
Tenho uma amiga médica que vive em Nova York há vinte anos e trabalha na Columbia, que viu suas verbas de pesquisa serem cortadas da noite para o dia e serem efetivamente cancelados todos os projetos que envolviam colaborações com países estrangeiros, inclusive com importantes centros italianos.
Os motivos para essa loucura trumpista, que corre o risco de causar danos sem precedentes ao país que, mais do que qualquer outro, prosperou com sua extraordinária capacidade de atrair as melhores mentes do exterior em todos os campos, são bem conhecidas.
Ora, o que a pesquisa farmacológica tem a ver com a onda de ódio antijudaico que surgiu depois de 7 de outubro, que também se espalhou por nossas universidades, é um mistério para o qual eu simplesmente não consigo encontrar resposta.
Vamos esclarecer um ponto: se Donald Trump se importasse com o antissemitismo, primeiro faria uma limpeza em sua própria casa, cortando o vínculo, que, em vez disso, é muito estreito, com uma série de movimentos supremacistas racistas e nazistoides, que o público em geral pode entender na figura de Steve Bannon, o deus ex machina da direita alternativa estadunidense nos últimos anos. Aquele mesmo Steve Bannon que, em uma entrevista, não deixou de condenar os judeus estadunidenses por terem votado em massa em Kamala Harris, fiéis à linha habitual da diáspora além oceano, que sempre garantiu cerca de 70% de apoio ao candidato democrata. Porque esses sujeitos gostam de judeus se votarem neles, caso contrário, estão destinados à mesma sorte de todos os opositores.
Durante os acampamentos e as manifestações universitárias dos últimos meses, houve infiltração de indivíduos ligados a grupos subversivos com o objetivo de exportar o conflito?
Grande coisa, é sempre assim em qualquer causa, ainda mais em um terreno tão ideologizado como o conflito israelense-palestino.
Para isso, no entanto, as leis que já existem bastam e sobram. Às vezes, são até demais. Em suma, até uma criança entende que o antissemitismo é apenas um pretexto para atacar aquelas universidades que representam os bastiões do pensamento liberal, que hoje está passando por um novo processo de redefinição graças ao impulso do pensamento pós-colonial.
Uma imensa galáxia que certamente não é redutível às posições mais radicais que atraem, ao contrário, a atenção das propagandas organizadas, que, prosperando na polarização, precisam do monstro para apontar como alvo fácil. Omitindo, entre outras coisas, o apoio oferecido pelo judaísmo estadunidense a movimentos como o Black Lives Matter, que se origina daquela galáxia. Uma reproposição em viés contemporâneo da grande marcha pelos direitos, com os rolos de Torá na mão, de Abraham Joshua Heschel ao lado de Martin Luther King.
Para aquela parte do judaísmo mundial que investiu em Trump como uma espécie de messias que acertaria as contas com o apoio à causa palestina, que certamente assumiu formas deploráveis que teria sido de bom tom ver condenadas por aquela mesma parte liberal que está sendo atacada hoje, só posso lembrar o risco desse abraço mortal com um governo que se candidata a ser o pior da história daquele grande país que são os Estados Unidos da América, caracterizado, ainda hoje, por um dinamismo desconhecido em outros lugares.
Não apenas porque, como estamos vendo, Trump não tem nenhuma intenção de seguir o projeto de guerra sem fim conduzido por Benjamin Netanyahu, abrindo-se, em vez disso, para negociações com os maiores inimigos de Israel: do Hamas, aos Houtis, até o regime dos aiatolás.
Mas também porque esse binômio é a linfa vital para os antissionistas militantes, prontos para usar a aliança com a horrenda figura do presidente estadunidense para inserir a própria ideia de um Estado judeu no caldeirão do neonacionalismo global. Mas isso não é tudo. Gostaria de lembrar a esse pessoal que o ataque aos ideais liberais nunca trouxe coisas boas para os judeus, como já vimos nesses anos agitados de crise contínua, em que os partidos que utilizaram o tema do antissemitismo em chave islamofóbica depois realizaram ataques sem precedentes às práticas identitárias judaicas. Primeiras delas, a circuncisão e o abate ritual.
Gostaria de parafrasear Franz Fanon que, falando à sua comunidade, disse: “Quando ouço ‘judeu’, eu entendo negro”. Aqui está, é bom que todo judeu saiba que, quando se fala de muçulmano (ou palestino), estarão falando de você.