20 Mai 2025
"Leão XIV exorta os governantes a investirem na família fundada na união estável entre homem e mulher como fundamento de uma sociedade harmoniosa porque uma das três palavras-chave indicadas em seu discurso ao corpo diplomático é a verdade. A família também é entendida como a família das nações.
A entrevista é de Giacomo Galeazzi, publicada por La Stampa, 17-05-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Prevost apresenta suas credenciais como Papa ao mundo e, assim, reafirma o ensinamento ético da Igreja sobre a célula fundamental da sociedade", afirma Marco Impagliazzo, Professor de História Contemporânea da Universidade de Roma Tre. Presidente da Comunidade de Santo Egídio, membro do Dicastério do Vaticano para os Leigos, a Família e a Vida.
Que mensagens envia para a comunidade internacional?
Não foi um discurso programático sobre a política da Santa Sé, mas sim um contato inicial para se apresentar como pastor e não como diplomata. E, portanto, a temática foi dizer às nações: ‘Somos uma única família’. Uma abordagem que lembra a encíclica de Francisco Fratelli tutti. Para a Santa Sé, a ONU continua sendo, como disse o próprio Papa Bergoglio, a resposta imprescindível às grandes crises do mundo contemporâneo.
Qual é o objetivo de Leão XIV?
Fiquei muito impressionado com a referência ao papel do diálogo inter-religioso para pacificar o mundo. Envolver as religiões para acabar com as guerras está na esteira do Concílio Vaticano II e do encontro promovido por Karol Wojtyla em Assis em 1986. O espírito de Assis, que a Comunidade de Santo Egídio vem alimentando há quarenta anos, está presente no discurso do Papa. As religiões, portanto, como veículo privilegiado para a paz.
Com quais perspectivas?
Mesmo existindo guerra, é necessário pensar hoje na paz de amanhã. Leão demonstrou grande sensibilidade em relação ao diálogo entre as religiões, enviando imediatamente mensagens ao rabino-chefe de Roma e à Liga Anti-Difamação. A relação entre justiça e paz é o legado da lição conciliar. Uma abordagem que tem raízes antigas. ‘Justiça e paz se beijarão’, reza um salmo. A família e a religião são os pontos de encontro para começar pelo que une e não pelo que divide. Também nos acostumamos a deixar os conflitos e as oposições crescerem, a não silenciar as pequenas guerras do coração ou da mente. Ao contrário de um determinado pentecostalismo violento em relação a outras denominações, Leão retorna às fontes, como Santo Agostinho, superando a agressividade e exortando todos a serem pacificadores. De acordo com a tradição patrística que o Papa expressa em seu magistério, há algo além de nós, de nosso presente e dos acontecimentos atuais. Leão adverte contra uma cultura simplificadora que alerta contra os conflitos e repropõe as bem-aventuranças evangélicas a todos os católicos. ‘Bem-aventurados os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus'.
Como o encontro com o vice-presidente dos EUA, J.D. Vance, se encaixa na estrutura delineada pelo Papa?
Na visão de Leão XIV, todo homem é uma ponte e abre pontes. O Pontífice espera que o católico Vance também as atravesse. Não há exclusões e, de forma significativa, o Papa indica aos embaixadores a a diplomacia papal como interlocutora. Uma forma de colocar a Secretaria de Estado do Vaticano de volta ao centro.
Qual a importância da referência à imigração na arquitetura do pontificado?
Significativamente, Leão relembra sua história pessoal como filho de migrantes. Uma identificação com aqueles que hoje deixam suas terras e têm o direito de ver sua dignidade humana respeitada. A globalização impõe com força um desafio: o de viver juntos. A migração mudou profundamente a fisionomia das cidades. Enormes diversidades, de cultura, estilo de vida e religião, estão concentradas em espaços estreitos. Leão se apresenta como um homem de paz. Nós desperdiçamos o bem precioso da paz e hoje estamos justamente chocados e preocupados com o que está acontecendo.
Leão coloca a si mesmo e a Santa Sé a disposição para criar espaços de diálogo?
Sim. A antropóloga francesa Germaine Tillion dizia que é necessária uma ‘política de conversação com o outro’. O caminho da conversação e do diálogo com o outro leva, mais cedo ou mais tarde, certamente à paz. No século passado, os regimes totalitários utilizaram a educação e a propaganda para criar, entre as gerações mais jovens, novos homens e mulheres capazes de lutar para fazer valer sua ideologia. Isso ainda acontece hoje: em muitos conflitos, crianças e adolescentes são ‘educados ou treinados para a guerra’.
Francisco já alertava sobre a emergência educacional. Isso também se aplica à paz?
Sim. Frequentemente crianças e jovens, em muitas partes do mundo, acabam sendo envolvidos em conflitos, até mesmo como atores, recrutados pelas guerrilhas, usados pelas formações terroristas. A educação para a paz, no entanto, não é necessária apenas em países afetados pela guerra, onde os jovens lutam, mas também naquelas situações de conflito latente ou de violência urbana tão frequentes em nossas sociedades.
Qual é a origem do impulso de Leão para superar as divisões entre os fiéis?
O impulso ecumênico tem origem na convicção de que, em virtude do Evangelho, pode existir um ecumenismo de fato que vem antes do doutrinário. Soma-se a isso a busca concreta e contínua do diálogo, o ethos, o estilo de vida, a simplicidade, o afeto para com cada pessoa humana, especialmente para com os sofredores e os pobres, o que conforma de maneira evidente o papado ao espírito evangélico.