05 Abril 2025
A licença do Ibama que a Petrobras e parte do governo tanto querem para perfurar um poço de combustíveis fósseis no bloco FZA-M-59, na foz do Amazonas, é só uma “cortina de fumaça” para uma ambição muito maior. A autorização, se concedida, será uma “porteira aberta” para a exploração de petróleo e gás fóssil em toda a foz do Amazonas. Abrirá precedente também para a indústria petrolífera em outras bacias sedimentares da costa amazônica, como Pará-Maranhão e Barreirinhas.
A reportagem é publicada por ClimaInfo, 04-04-2025.
É o que mostra a 2ª reportagem da série “Até a última gota”, da InfoAmazonia[1], que já mostrou que a região amazônica, incluindo os países vizinhos, tornou-se a nova fronteira do petróleo em todo o mundo. No Brasil, a busca por combustíveis fósseis se concentra no mar. E o que acontecer com o bloco 59, no litoral do Amapá, será decisivo para o futuro da exploração de combustíveis fósseis na Amazônia brasileira.
“Se a Petrobras tiver autorização e achar algo lá, vamos segui-la”, disse no ano passado Décio Oddone, CEO da Brava Energia. A petroleira, resultado da fusão da Enauta com a 3R Petroleum, detém a concessão de um bloco na foz, assim como a PetroRio, atual PRIO. Os demais seis blocos concedidos pela Agência Nacional do Petróleo (ANP) na bacia são da Petrobras, entre eles o 59.
Além desses, há mais 16 áreas sob concessão na costa amazônica. São cinco na bacia do Pará-Maranhão, nas mãos de Petrobras e Brava, e 11 em Barreirinhas, concedidos pela ANP para essas duas petroleiras e para as gigantes Shell e BP. E a agência ainda poderá oferecer mais 47 blocos na foz no próximo leilão que fará, em 17 de junho. A lista final da licitação será divulgada neste mês.
Essas empresas estão ávidas pela resposta do Ibama sobre o 59 porque apostam na pressão política da Petrobras. Tecnicamente, vários pedidos de licença já foram negados pela altíssima sensibilidade ambiental da região e a falta de informações sobre os impactos da atividade petrolífera. “Se a Petrobras, uma empresa brasileira que tem o governo como principal acionista, não está conseguindo, ninguém vai conseguir [a autorização]”, afirmou João Correa, presidente da TGS no Brasil, empresa norueguesa que faz levantamentos sísmicos na margem equatorial.
Enquanto isso, as empresas se valem de brechas na regulação para ganhar tempo e manter suas concessões. Pelas regras da ANP, o descumprimento dos prazos contratuais obrigaria a devolução dos blocos ao governo. E 20 dos 25 blocos concedidos – a maioria desde 2013, quando a atual presidente da Petrobras, Magda Chambriard, era diretora-geral da ANP e ofertou essas áreas em leilão – não iniciaram a exploração como estabelecido em contrato.
Contudo, a agência permite a prorrogação de prazos em “casos fortuitos”, ou seja, fora do controle das concessionárias. Com esse argumento, as petroleiras justificaram os atrasos no licenciamento ambiental para manter os contratos ativos. E assim mantêm o risco de a costa amazônica virar uma nova fronteira exploratória de petróleo e gás fóssil no Brasil.
Mas, se parte do governo quer explorar petróleo “até a última gota”, inclusive na Amazônia, a chefe da assessoria especial do Ministério do Meio Ambiente (MMA) para a COP30, Alice Amorim, “lembrou” que a transição para um mundo sem combustíveis fósseis precisa começar. Ela participou de um evento promovido na 4ª feira (2/4) por petroleiras, quando foi apresentada uma proposta de critérios para definir que países cortariam primeiro sua produção com a implantação do transitioning away proposto na COP28, em Dubai.
A inclusão da expressão na declaração de Dubai foi um avanço em relação a conferências do clima anteriores, que não citaram o tema em seus documentos finais. Mas, desde então, não houve evolução em relação a como esse movimento será feito, explica Nicola Pamplona na Folha. Por isso há uma expectativa que o debate seja retomado em Belém, na COP30.
[1] Reportagem especial da InfoAmazonia: "Petroleiras criam ‘cortina de fumaça’ para viabilizar exploração na costa amazônica do Brasil". Disponível aqui.