10 Janeiro 2025
O arcebispo de Cantuária, Justin Welby, líder da Igreja da Inglaterra e primaz da Comunhão Anglicana, terminou no início desta semana as suas funções, exercidas ao longo de 11 anos, na sequência da resignação anunciada em 12 de outubro último. A liderança da Igreja da Inglaterra passou, entretanto, a ser exercida, a título provisório, pelo arcebispo de York, Stephen Cottrell e o futuro da mesma é ainda uma incógnita.
A reportagem é de Manuel Pinto, publicada por 7Margens, 08-01-2025.
Numa “carta de Epifania”, dirigida no último dia 6 a todos os fieis, as questões do encobrimento de abusos de poder e sexuais, que levaram à queda de Welby, parecem ser dominantes. Nela, o arcebispo Cottrell aproveita para esboçar linhas para um programa de ação, em termos imediatos e a médio prazo.
O hierarca, que não agradece nem faz qualquer referência à ação pastoral do arcebispo cessante, começa por destacar o conteúdo do chamado Makin Review, relatório publicado em 18 de outubro último, que descreve a ação devastadora de um membro destacado da Igreja da Inglaterra junto de muitas dezenas de adolescentes e jovens, que se desenrolou anos a fio, sem que os superiores hierárquicos, cientes dos factos, interviessem e os comunicassem às autoridades civis.
Para Cottrell, a leitura desses “relatos de abuso, encobrimentos e fracasso institucional” configuram um ambiente de “escuridão”, que “a muitos prejudicou” e a quem apresenta um pedido de desculpa.
Tais “relatos dolorosos”, acrescenta, “servem como um lembrete severo de que vítimas e sobreviventes estão a pedir – e merecem – mais do que palavras de lamento”. Apesar do que considera progressos feitos no plano da prevenção de tais abusos, através da formação de milhares de agentes de proteção ao nível das paróquias e de contratação de pessoas profissionalmente qualificadas, a trabalhar regional e nacionalmente, o arcebispo reconhece que muito há ainda a fazer, para que a Igreja seja, de fato, “mais segura e responsável e para que processos sejam confiáveis”.
Entre as várias medidas, Cottrell refere que, no Sínodo Geral da Igreja da Inglaterra a realizar em fevereiro próximo, serão apresentadas “novas propostas sobre salvaguarda independente”, que passam por “modelos de supervisão independente, escrutínio, auditoria e reclamações, bem como para salvaguarda operacional diária”. Este escrutínio independente é um ponto que vem sendo reclamado, mas que, até agora, não tem encontrado anuência da parte da maioria dos bispos.
Outras medidas referem-se a serviços de suporte e acolhimento de preocupações de membros da Igreja; às condições de vida (estatuto), conduta e regime disciplinar do clero; e a um plano de indemnização das vítimas.
Cottrell entende que será necessário pensar o que se pretende do arcebispo de Cantuária, atendendo a que ele é, na verdade, titular de quatro cargos: líder espiritual da Comunhão Anglicana mundial; chefe espiritual da Igreja da Inglaterra; primaz da Província de Cantuária; e bispo diocesano de Cantuária.
Não parece haver, para já, movimentações quanto a nomes para esse sucessor, se bem que o arcebispo de York é apontado por alguns como um potencial candidato. Tudo vai depender do que se passar nestes meses mais imediatos, a começar pelo já referido Sínodo Geral.
Segundo uma análise do jornalista free lance especializado em assuntos religiosos, que já foi editor no semanário católico inglês The Tablet, Abigail Frymann Rouch, publicada no site da revista Commonwealth, é verdade que o relatório Makin Review sobre os abusos abalou fortemente a Igreja da Inglaterra, prejudicando a sua credibilidade, mas “o pior ainda pode acontecer”.
E explica porquê: “Algumas pessoas apelaram a uma limpeza do clero que sabia dos abusos mas não reagiu adequadamente”. Até à data, foi pedido a um bispo em funções e a um bispo reformado, que se “afastassem” do ministério, enquanto quatro padres, incluindo o antigo capelão da Rainha Isabel II, viram as suas licenças suspensas. Dois outros bispos – o arcebispo de York Stephen Cottrell, e Stephen Conway, o bispo de Lincoln – surgem mencionados no relatório, mas disseram que não se vão demitir. O relatório sugere que outros seis bispos e cerca de 25 outros membros do clero também sabiam dos abusos e não os impediram. Assim, “se nada mais acontecer, a opinião pública continuará a estar firmemente do lado das vítimas”, conclui Abigail Frymann Rouch.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Encobrimento de abusos complica escolha do sucessor do arcebispo Welby - Instituto Humanitas Unisinos - IHU