21 Novembro 2024
“Eu penso que esta é uma guerra de Israel contra o povo palestino e não apenas contra o Hamas”. Palavras de Anna Foa, historiadora que dedicou sua vida ao estudo do judaísmo e do Holocausto.
Que efeito as palavras do Papa sobre a possibilidade de genocídio tiveram sobre você? Elas me surpreenderam, porque se fala muito sobre genocídio, mas também pouco. Fala-se muito nas manifestações e nos tribunais, mas pouco no debate italiano e internacional. Não se fala a respeito no mundo judeu da diáspora. Parece um tabu antissemita. Não ressoa em Israel nem mesmo nos ambientes mais hostis ao governo, enquanto termos como “colonialismo” e “apartheid” são muito usados no meio acadêmico e em jornais como o Haaretz, embora sejam considerados antissemitas pelo governo de Netanyahu e por uma parte da população. A palavra “genocídio” é forte. E é bom que o Papa a tenha pronunciado, que ela saia dos tribunais e que seja possível discutir sobre isso. Em várias ocasiões, o Papa condenou o antissemitismo, definindo-o como “um pecado contra Deus”. Recentemente, recebeu em audiência ex-reféns e, nos meses passados, encontrou-se com seus familiares.
A entrevista é de Anna Maria Brogi, publicada por Avvenire, 19-11-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Por que suas palavras sobre a legitimidade de investigar um eventual genocídio em Gaza provocaram reações tão duras por parte de Israel?
Como descendentes de um dos genocídios mais terríveis da história sancionados pelo direito internacional, os judeus israelenses estremecem quando são acusados de genocídio. Estou convencida de que o massacre de 7 de outubro foi, em si, um ato genocida. Por outro lado, Netanyahu e seu governo denunciam qualquer crítica como atitude antissemita e descrevem Israel como isolado no mundo e cercado de antissemitas. Qualquer voz dissidente contra o governo é acusada de antissemitismo.
A quem caberia a responsabilidade de investigar se está ocorrendo um genocídio em Gaza? Israel não reconhece o Tribunal Penal Internacional em Haia e acusa a ONU de ser hostil a ele...
O Tribunal Penal Internacional deve investigar. O fato é que, primeiro a guerra na Ucrânia e depois a guerra no Oriente Médio, complicaram todo o processo de criação de tribunais internacionais que após a Segunda Guerra Mundial protegeu os civis nos conflitos. Desde 1945, a elaboração jurídica definiu os delitos de genocídio e de crimes contra a humanidade. Parece-me que agora, nas guerras atuais, tudo isso esteja desaparecendo. Estamos perdendo isso.
Qual é a sua opinião sobre o que está acontecendo em Gaza?
Acredito que as discussões puramente jurídicas devem ser deixadas para os tribunais internacionais. E espero que um dia possam se expressar. Os crimes cometidos em Gaza são intencionais? O que é necessário para comprovar a intencionalidade? As alegações do governo são suficientes? Vamos deixar isso para ser discutido pelos tribunais. Pessoalmente, acredito que estamos diante de crimes de guerra, no mínimo. Falar de genocídio, neste momento, tem um forte valor simbólico para indicar o máximo de destruição de um povo. Em uma situação, é preciso lembrar, em que Israel não permite a presença de observadores internacionais: ninguém pode entrar em Gaza. Quanto ao valor penal e jurídico do termo “genocídio”, deixemos isso para os órgãos internacionais indicados para investigar.
A sociedade israelense ainda está em choque após os horrores de 7 de outubro. Mas será que isso significa que não se pode falar sobre o sofrimento dos palestinos sem ofender a sensibilidade dos judeus?
Depois de 7 de outubro, os judeus israelenses se sentem incapazes de sentir plena empatia pelo sofrimento alheio. Calam-se. Embora haja uma forte oposição no país, determinada e clara, em relação ao governo, a começar pelos ambientes universitários. A necessidade de calar nasce do medo, de ver em risco a segurança de Israel como Estado, a sua própria existência. Da sensação de estar cercado. Nas famílias, os filhos que partiram para lutar criam laços muito fortes com o exército. Para aqueles que discordam da opinião dominante, é muito difícil fazer com que suas vozes sejam ouvidas. Deveríamos ajudar mais aqueles que o fazem.
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“Uma palavra tabu que não ressoa em Israel. É bom que o Papa a tenha pronunciado”. Entrevista com Anna Foa - Instituto Humanitas Unisinos - IHU