28 Mai 2024
"A vida é isto: amor, conhecimento e uma compaixão infinita pela dor que atravessa a humanidade". Roberto Benigni está no centro do adro de São Pedro, diante do Papa e de dezenas de milhares de crianças que vieram de 101 países do mundo para o primeiro Dia Mundial das Crianças.
A reportagem é de Gian Guido Vecchi, publicada por Corriere della Sera, 27-05-2024. A tradução de Luisa Rabolini.
Francisco acaba de celebrar a missa e os convidou a rezar com ele uma Ave-Maria:
“Rezem sempre e acima de tudo pela paz, para que não haja guerras”.
E agora o ator e diretor toscano está encarregado do final: mais de cinquenta anos de carreira, dois prêmios Oscar, mas talvez seja o monólogo mais desafiador que jamais escreveu. Ele o preparou buscando palavras simples, que as crianças entendam, para dizer coisas essenciais. O desafio mais difícil, mesmo para um especialista, mas que deu certo: “Levantem voo, assumam o controle de suas vidas e transforme-a numa obra-prima! Vocês podem fazer isso! Construam um mundo melhor! Nós não conseguimos".
No início zomba um pouco dos adultos: “Uma afetuosa saudação aos cardeais, ao prefeito de Roma, Gualtieri, à primeira-ministra Giorgia Meloni...Ok, já cumprimentei todos os importantes, tem mais alguém? Ah, Santidade!”. Depois explica: “Dois guardas suíços me disseram: você pode fazer qualquer coisa, apenas não pode tocar o Papa. Desde que me disseram isso, eu só quero fazer isso. Vocês sabem, como Adão e Eva com a maçã? Um beijo! Para que servem os beijos se você não os pode dar?". E Benigni se aproxima, “então lhe dou as boas-vindas em nome de todos eles, um beijo que vale por cem mil", e abraça e beija Francisco no rosto, "Estou cheio de alegria como uma melancia!".
Ele se sente à vontade no Vaticano, conta: “Quando eu era criança e me perguntavam o que eu queria ser quando crescesse, respondia sério: Papa. E todos riram e rolavam de rir. Então decidi ser comediante. Se tivessem se ajoelhado, eu teria sido Papa... Talvez nas próximas eleições, Santidade, eu também me candidate!”, acrescenta. E vira-se para Bergoglio: “Não depois do senhor! Não, junto com o senhor. Vamos fazer a frente ampla, vamos colocar na cédula: Jorge Mario Bergoglio, conhecido como Francisco." O que todas essas crianças farão quando crescerem? “Talvez entre vocês haja um novo Michelangelo, um novo Galileu, uma cientista como Rita Levi Montalcini. Ou talvez um Papa, quem quer ser Papa?”. As mãos se levantam e ele grita: "Sua Santidade, é preciso amplar o Vaticano, talvez entre eles haja o primeiro Papa africano, ou Asiático, ou de um bairro periférico de Roma, o Papa de Testaccio, ou mesmo uma menina, a primeira Papa mulher da história!
A fala se aprofunda: “Quero revelar-lhes um segredo: para sonhar não se precisa fechar os olhos, é preciso abri-los para ler, escrever, inventar. Vocês têm que fazer ler de tudo às crianças, começando pelos contos de fadas. As crianças já sabem que existem dragões. Os contos de fadas lhes ensinam que podem ser derrotados." E, além disso, “os inventores dos contos de fadas são os maiores que existem ", considera: "pode ser que o celular ou a televisão tenham sido inventados por outros, mas Cinderela, Peter Pan, Harry Potter? Se seus autores não os tivessem inventado, ninguém o teria feito, por toda a eternidade! Vocês conseguem imaginar um mundo sem o Pato Donald?".
Inventar, encontrar histórias, fazer coisas difíceis. O importante é não se contentar: “Qualquer coisa façam, amem-na, façam-na o melhor possível, como Michelangelo fez esta cúpula." Aqui está: “Tentem fazer coisas bonitas. Não tente tornar os outros melhores; os outros, é preciso torná-los felizes. Joguem-se no despenhadeiro da vida e abram as suas asas. Aprendam quantas palavras puderem. Se vocês não tiverem palavras para dizer o que está dentro de vocês, se sentirão mal."
A última reflexão é sobre o Sermão da Montanha, as palavras de Jesus: “Um encanto de beleza. Quando ele diz que serão bem-aventurados os misericordiosos. Cuidar da dor dos outros, ser sensíveis, perdoar. A única boa ideia que foi expressa na história da humanidade: sejam profundamente bons”.
Muitas vezes “o mundo é governado por pessoas que não sabem o que é a misericórdia e o amor, e cometem o mais grave e estúpido dos pecados: a guerra. Quando as crianças brincam de guerra, assim que alguém se machuca, param. Fim de jogo. Por que não param na primeira criança que se machuca? É preciso encontrar as palavras certas, as palavras verdadeiras. Ninguém ainda encontrou a palavra mágica para acabar com a guerra, como “Abre-te Sésamo”. No entanto, existe. Tenho certeza de que há alguém entre vocês que a encontrará. Nós só temos que ajudar vocês: amando você, escrevendo histórias."
Assista o discurso de Benigni, em italiano, em 1h15min43s
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Benigni, show com o Papa “Posso lhe dar um beijo? E para as crianças na praça: “Vocês param a guerra” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU