Por uma teologia militante. Artigo de Giuseppe Lorizio

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15 Abril 2022

 

"A renovação ou refundação do conhecimento teológico, na minha modesta opinião, passa pela capacidade das pessoas (não se trata, na verdade, em primeiro lugar das estruturas) de oferecer um "partidarismo militante" em temas quentes, a fim de mostrar a relevância do evento crístico no âmbito social, cultural, político e eclesial.", escreve Giuseppe Lorizio, professor de Teologia Fundamental da Pontifícia Universidade Lateranense, em Roma, em artigo publicado por Settimana News, 12-04-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.

 

Eis o artigo.

 

A deterioração da teologia "acadêmica" está sob os olhos de todos, e isso é confirmado pela proposta da Associação Teológica Italiana sobre a renovação dos estudos teológicos (aqui), com a precisa reflexão oferecida pelo colega Giovanni Salmeri (aqui), que acredito compartilhar plenamente.

 

Mas o problema sempre desponta também, por exemplo, pelas iniciativas da Academia para a vida a esse respeito, que se expressa nos termos da necessidade de uma "refundação" da teologia (aqui), a ser refundada inclusive epistemologicamente.

 

L'Osservatore romano publicou algumas contribuições sobre esse assunto. Diferentes das propostas postas em campo de fato, olham para o passado mais ou menos recente e não para o futuro, enquanto as iniciativas e reflexões que me parecem mais frutíferas vêm dos leigos (mulheres e homens): a inação dos presbíteros e dos bispos me surpreende um pouco, pois parece que são eles que têm famílias para alimentar e não os colegas que realmente as têm.

 

A prática da teologia

 

Permito-me submeter à atenção de todos algumas reflexões, provenientes de um empenho de quarenta anos em pesquisa e ensino, ao qual dediquei todas as minhas energias e capacidades, na crença de que "Há maior felicidade em dar do que em receber"(Atos 20,35).

 

Às vésperas da minha tão esperada aposentadoria, posso dizer que o que dei é muito menos do que recebi em alguns contextos como o da Faculdade Teológica de Nápoles, na seção San Luigi, na Associação Teológica Italiana (estou inscrito desde a época de Luigi Sartori) e a Faculdade Teológica da Pontifícia Universidade Lateranense. Penso, no entanto, que uma renovação/refundação do conhecimento teológico na Itália envolve o afastamento, não tanto físico, mas mental, das estruturas acadêmicas.

 

Não se trata de abandonar a Universidade, talvez de retornar a ela onde ausentes, mas de abrir de par em par as suas portas. E isso na relação com as comunidades vivas das paróquias, das associações e dos movimentos, assim como nas dioceses, mas também através das mídias, que somos chamados a ocupar não só como teólogos, mas sobretudo como intelectuais neste país.

 

Como bem observa Sabino Cassese, em seu livro sobre os intelectuais, de fato, não é um verdadeiro jurista quem se aplica apenas à jurisprudência. É uma página que deveria nos questionar como teólogos especialistas e não “entendidos em tudo”: “O intelectual não leva apenas seu conhecimento disciplinar a um público mais amplo. Ele é especialista, mas não escreve e não fala apenas de sua especialidade. As competências estão concatenadas, elas não permanecem em uma cerca (aliás, o Prêmio Nobel de Economia Friedrich von Hayek escreveu que "ninguém pode ser um grande economista se for apenas um economista" - será verdade, eu digo, também para aqueles que deveriam tratar da economia da salvação?), podem ser interconectadas, e até mesmo questionadas pelos incompetentes, em relação aos quais os competentes têm a obrigação de explicar, porque existe um ponto, no mundo mais amplo que o da ciência, onde a competência e a democracia se encontram e, portanto, a competência deve poder ser posta em discussão, e o competente deve aceitar o desafio e não se fechar em sua concha, reivindicando apenas seus títulos.

 

Aliás, a explicação deve também se expandir e se tornar educação. E é por esta razão que o intelectual está engajado principalmente em uma atividade de reflexão em público e educação do público em geral. Aqui reside a sua atitude multiforme, que o tira do seu campo estritamente especializado”.

 

Capaz dos desafios atuais

 

Por isso acredito que hoje o país e o contexto eclesial precisam de uma teologia "partidária e militante", isto é, comprometida e capaz de se deixar questionar pelos desafios do presente. A afasia dos teólogos italianos é muitas vezes mais que eloquente. Como ATI passamos por momentos frutíferos, em que personalidades como Luigi Sartori, Severino Dianich, Pino Ruggieri, Carlo Molari e muitos outros, sem falar de Ernesto Balducci que hoje todos exaltam, depois de tê-lo massacrado, estavam realmente no front e sofreram consequências, pagando pessoalmente ostracismos insossos.

 

A partir de um certo momento, foi escolhida a retirada e as consequências estão à vista de todos. Sem cultivar uma estéril nostalgia do passado, permito-me apontar três frentes nas quais me expus pessoalmente, oferecendo, dentro dos limites de minhas capacidades, algumas reflexões destinadas ao povo de Deus.

 

A primeira foi a frente do Covid e, portanto, de uma renovada abordagem da teodiceia, na ausência quase generalizada de indicações por parte dos vértices, preocupados mais em oferecer indicações sobre as modalidades das celebrações (máscaras ou distanciamentos). Nesse contexto, não me cansei de enfatizar a necessidade de uma recuperação da "sacramentalidade da Palavra" diante da impossibilidade de celebrações presenciais. E isso para que na "reabertura" não se verificasse um puro e simples retorno ao passado, mas uma renovada e criativa retomada espiritual da vivência eclesial.

 

O segundo, que está ardendo em nossos corações e mentes, é o da guerra. Destaco aqui a posição de numerosos teólogos ortodoxos em relação ao Patriarca Kirill, que ressaltei e comentei neste jornal (cf. aqui), e de colegas protestantes, como Fulvio Ferrario (em Confronti sobre a ética da responsabilidade), bem como os artigos de Enzo Bianchi, Bruno Forte, Severino Dianich e Vito Mancuso, que não tem escrúpulos em enviar armas para a Ucrânia, tese não muito diferente da posição da moral tradicional sobre a chamada "guerra justa", da qual Mauro Cozzoli se fez porta-voz no Avvenire em 2 de março passado.

 

Certamente importante é a posição de dezenove teólogos católicos a favor da Ucrânia (cf. aqui), alguns dos quais pertencem à Comissão Teológica Internacional, mas que consideram poder se expressar em nível pessoal. De fato, faltou um debate público entre teólogos dos dois campos, voltado para um confronto crítico para poder oferecer instrumentos de avaliação, se não chegar a uma solução compartilhada, na sempre desejável concordância das sentenças. Tudo foi deixado à iniciativa dos particulares com a inércia das instituições (inclusive acadêmicas) e associações, que deviam e deveriam promover este confronto com as iniciativas para tal fim.

 

Aprendendo com o passado

 

De minha parte, tomei a liberdade de evocar as diferentes posições de Karl Barth e Dietrich Bonhoeffer em um pequeno artigo publicado na Famiglia cristiana.

 

O mártir de Flössenburg, inclusive citado no parlamento, assim expressou-se a este respeito: “Quando um louco joga o seu carro sobre a calçada, não posso, como pastor, contentar-me em enterrar os mortos e confortar as famílias. Eu tenho que pular e segurar o motorista atrás do volante, é meu dever”.

 

A expressão pertencente à tradição oral parecia sugerir o recurso ao engajamento violento em casos extremos. Do lado oposto, a posição assumida por outro grande teólogo reformado Karl Barth: “Eu me empenho aqui em Bonn com meus alunos a fazer teologia e só teologia […]. Da mesma forma que os beneditinos da vizinha abadia de Maria Laach continuam normalmente, mesmo no Terceiro Reich, a recitação das horas canônicas, sem ter dúvidas, sem se interromper ou se distrair. Considero que esta também seja uma tomada de posição”.

 

Talvez os teólogos italianos e especialmente suas instituições representativas tenham se descobertos, talvez sem se aperceber, barthianos, mas Bonhoeffer advertia que "só quem grita pelos judeus pode cantar também o gregoriano" (outra tradição oral segundo Bethge).

 

Uma última intervenção recente, graças à cortesia de Marco Tarquinio, permitiu-me relacionar os acontecimentos atuais com aquelas da Sexta-feira Santa, através do tema do "sacrifício" (cf. aqui). É interessante a coincidência pelo menos textual entre a proposta de quem, escreve e o que está expresso no fundo do jornal Domani de 9 de abril passado, assinado por Roberto Esposito e Nadia Urbinati, intelectuais genuinamente “leigos” de destaque (cf. aqui).

 

Pietas

 

A terceira frente, sobre a qual me expressei em uma intervenção que o novo diretor da Famiglia cristiana se recusou a publicar, por considerá-la muito dura, diz respeito à necessidade de entrar em campo na tentativa de ler, interpretar e orientar a chamada "piedade popular". Graças à SettimanaNews, o texto circulou e agradeço por isso. Tudo permanece em silêncio, no entanto, também porque penso que prevalece a acomodação porque uma celebração processional como a da "Nossa Senhora das galinhas" seja considerada de fato irrenunciável naquele contexto (remeto à minha intervenção para que se procurem compreender os termos da questão, aqui).

 

Mais uma vez o silêncio dos bispos e da teologia não me parece irrelevante, mas particularmente significativo, enquanto a posição de Monsenhor Giuseppe Giudice, que gerou o manifesto fúnebre, aliás, em acordo com o presbitério e os órgãos pastorais da diocese, recebeu o apoio e a solidariedade de personalidades e instituições "leigas". Fazer teologia no horizonte de sua refundação significa também dar nomes e sobrenomes.

 

Para onde vai a teologia italiana?

 

Os exemplos dados acima podem ajudar a entender o que estou propondo no contexto acadêmico e eclesial na forma de um modelo de teologia querigmático-kairológico (ver o verbete "Tempo" no Nuovo Dizionario Teologico Interdisciplinare, publicado pelas Dehoniane de Bolonha em 2020), de tal forma a enxertar, com tentativas repetidas e que poderão até resultar infrutíferas, o Evangelho do Reino no nosso tempo tão dramático, mas também tão fecundo.

 

Com essas reflexões de mente aberta, eu absolutamente não pretendo defender que eu seria o bom teólogo, à diferença dos outros ou que eu seria o Bonhoeffer de plantão, os outros os Barths (quem dera!), inclusive porque, como bem sabe quem me conhece de perto, não tenho nenhuma vocação para o martírio. Pelo contrário, pretende ser um convite para a reflexão sobre onde estamos e quem somos como teólogos na Igreja que está na Itália.

 

O sínodo nos obriga a fazer isso. A renovação ou refundação do conhecimento teológico, na minha modesta opinião, passa pela capacidade das pessoas (não se trata, na verdade, em primeiro lugar das estruturas) de oferecer um "partidarismo militante" em temas quentes, a fim de mostrar a relevância do evento crístico no âmbito social, cultural, político e eclesial. O resto é chatice!

 

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