06 Julho 2021
Agora começa a caça ao dinheiro no Vaticano. Os investigadores do Papa - o promotores da justiça e da Gendarmaria – foram atrás em todo o mundo das contas dos protagonistas do assalto ao Óbolo de São Pedro, conseguindo apreender um total de 64 milhões de euros. Dinheiro congelado neste momento em bancos e empresas na Suíça, Luxemburgo, Grã-Bretanha, mas também no IOR, tendo em vista o seu confisco em caso de condenação dos acusados. Não serão suficientes para cobrir os prejuízos sofridos com os investimentos feitos sob a gestão do cardeal Angelo Giovanni Becciu, Substituto da Secretaria, de monsenhor Alberto Perlasca, chefe da seção administrativa e do leigo Fabrizio Tirabassi, homem das finanças. Mas certamente serão úteis para um Vaticano em crise de liquidez e de doações: em 2020, o Óbolo arrecadou apenas 44 milhões, metade do que os fiéis enviavam apenas poucos anos atrás.
A reportagem é de Mario Gerevini e Fabrizio Massaro, publicada por Corriere della Sera, 05-07-2021. A tradução é de Luisa Rabolini.
Dos capitais apreendidos, 48 milhões são de Raffaele Mincione, o homem a quem oito anos atrás foram confiados 200 milhões de dólares a serem investidos e metade dos quais ele destinou para o famoso prédio de Londres (que já era dele) e o resto em transações mais especulativas, inclusive na bolsa. Outros 9,6 milhões foram apreendidos de Gianluigi Torzi, que em novembro foi contratado pela Secretaria para romper o relacionamento com Mincione, com quem, aliás, mantinha relações comerciais. Além disso, 3,6 milhões do gerente Enrico Crasso, banqueiro de confiança desde os anos 1990. A lista inclui ainda cerca de 2 milhões de Fabrizio Tirabassi, e - no IOR - 308 mil euros de Monsenhor Mauro Carlino e 242 mil euros de Perlasca, que, no entanto, não foi indiciado.
As apreensões mostram quem - segundo os promotores de justiça Gian Piero Milano, Alessandro Diddi e Gianluca Perone - teria tirado maior vantagem da enorme (mas pouco supervisionada) disponibilidade da Secretaria. Nas 487 páginas do pedido de intimação, nos perdemos em uma miríade de caminhos tortuosos e dezenas de mãos que receberam parte do dinheiro destinado à caridade do Papa. A gestão Becciu - escrevem os magistrados - permitiu a criação de um sistema "podre" na Secretaria. Diretamente ao então arcebispo, por exemplo, é atribuído o aval para a um investimento imobiliário especulativo, também em Londres, com a empresa Sloane & Cadogan, apesar da proibição imposta pela Secretaria de Economia: um negócio que custou dezenas de milhões e uma comissão de 700 mil libras a um ex banqueiro do Credit Suisse, Alessandro Noceti, considerada "sem motivo".
Teria sido justamente Noceti (não investigado) quem fez com que o financista Mincione fosse apresentado na Secretaria. Assim nasceu o investimento do prédio na 60 Sloane Avenue de Londres em 2013-2014. Exceto que o financista vendeu cerca de metade para o Vaticano por um valor "totalmente injustificado" de 230 milhões de libras (100%) contra uma avaliação quase da mesma época de 129 milhões. Mas quem deveria ter verificado se os valores apresentados estavam corretos? Crasso, que, através da Noceti, pediu que a Sloane & Cadogan preparassem "uma estimativa/opinião (obviamente muito positiva).
Também a entrada em cena de Torzi, em 2018, embora contada como "o resultado de uma série de coincidências aleatórias", aos magistrados "parece mais uma manobra bem organizada para criar uma alavanca através da qual liberar verbas dos cofres da Secretaria de Estado”. Tudo decorre da aposta fatal no Banco Carige, que depois ficou sob intervenção no início de 2019. Em aliança com Gabriele Volpi, então segundo sócio do instituto, Mincione escalou o Carige usando o fundo Athena - onde o Vaticano fazia investimento - mas também 26,4 milhões que tinha lhe emprestado Torzi. Por sua vez, o corretor obtivera aquele dinheiro de Volpi, a quem vendeu ações de uma minúscula empresa imobiliária cotada, na Imvest, a um preço de 8 milhões acima do valor de mercado. Com o Carige em agonia, Mincione tinha que devolver o dinheiro: esse seria o motivo da chegada de Torzi.
Para criar liquidez, o prédio da Sloane Avenue teria sido avaliado de maneira muito generosa. No dia 23 de novembro de 2018, após a assinatura dos contratos com a Secretaria, Mincione e Torzi jantaram em Roma no restaurante "I due ladroni". Mais tarde, o corretor mandou um whatsapp para seu companheiro: "Ah, quanto aos números, fizemos um abracadabra que depois de três dias acaba fechando". Com três carinhas sorridentes.
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Vaticano em busca do dinheiro tirado da Secretaria de Estado: 64 milhões apreendidos. Os corretores: “Fizemos um abracadabra ...” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU