26 Outubro 2020
A sinodalidade é a proposta do Papa Francisco de ser Igreja no século XXI. Com base nesta ideia, Ameríndia organizou um novo seminário virtual, como vem fazendo ao longo deste mês de outubro, para falar sobre "Sinodalidade: resposta eclesial entre conversões e sonhos". Nesta ocasião, os oradores foram o Cardeal Álvaro Ramazzini, Romina Gallegos e Mauricio López. O debate foi parte do tema geral que tem conduzido as discussões nas últimas semanas, "Teologia da Libertação em tempos excepcionais de crise e esperança".
A reportagem é de Luis Miguel Modino.
Foto: enviada por Luis Miguel Modino
O Cardeal Ramazzini partiu de um documento da Comissão Teológica Internacional sobre o tema da sinodalidade, afirmando que "a compreensão da Igreja na perspectiva de uma eclesiologia de comunhão ainda não foi alcançada, apesar de terem passado tantos anos desde o Concílio Vaticano II". Por esta razão, ele propõe "diminuir a concentração da responsabilidade da missão no ministério dos pastores", já que somos todos missionários, lembrando o chamado de Aparecida para estar em permanente estado de missão. É necessária uma "renovação pastoral para alcançar uma verdadeira sinodalidade que vá além do que é institucionalmente estabelecido", insiste o Cardeal.
Neste caminho de comunhão, Ramazzini citou o papel dos conselhos pastorais e a importância de "ativar um caminho circular e não tanto um caminho perpendicular de cima para baixo". Isto encontra obstáculos na tentação do poder, que "no caso do poder religioso se torna ainda maior e ainda mais perigoso". Diante disso, é necessário buscar a circularidade em todos os níveis de relacionamento entre os envolvidos na ação missionária e evangelizadora da Igreja, algo que o Papa Francisco expressou quando disse que estamos todos no mesmo barco.
De acordo com o Cardeal guatemalteco, um desafio é que os futuros sacerdotes entendam a importância da participação e co-responsabilidade dos leigos. O ministério nasce do batismo, de ser profetas, de ser sacerdotes, de ser servos. Mas também é verdade que às vezes há leigos "que se consideram um pequeno pároco em sua comunidade e que também se consideram um pequeno bispo ou em seu território", algo que o cardeal vê como "sempre uma luta pelo poder, por impor-se aos outros, por ser protagonista".
A sinodalidade foi abordada no Concílio Vaticano II, mas passar a ações concretas, isso custa muito mais. Atualmente, com o Papa Francisco, o Sínodo é um instrumento que está ganhando mais força. Neste sentido, o Cardeal vê o Sínodo para a Amazônia como "um exemplo de como esta circularidade pode ser alcançada entre bispos, leigos, pastores, pessoas da vida consagrada". O objetivo será sempre "caminhar juntos em direção à unidade plena na diversidade". Isto é ajudado por algo que o Papa Francisco nos ensinou, "diálogo construtivo com homens e mulheres de diferentes denominações, diferentes religiões, diferentes ideologias, diferentes posições", nunca esquecendo que "estamos todos no mesmo barco e, no final, somos todos seres humanos".
O processo do Sínodo para a Amazônia tem sido um exemplo prático de sinodalidade, algo de que Romina Gallegos falou a partir de sua experiência na secretaria da Rede Eclesial Pan-Amazônica. Na Amazônia, a Igreja tem sido frequentemente uma construtora de pontes com as comunidades locais, tentando ser uma presença no meio da realidade amazônica e em diálogo com as pessoas que lá vivem. Romina, que participou de muitas atividades de escuta organizadas pela REPAM ao longo do processo pré-sinodal, relatou a riqueza das experiências que viveu.
Houve 57 assembléias, 21 fóruns nacionais, 17 fóruns temáticos e 179 rodas de conversa, em toda a Pan-Amazônia, com a participação de quase 87 mil pessoas, e em alguns outros lugares fora dela, já que, como Romina Gallegos enfatizou, o Sínodo para a Amazônia foi além das fronteiras regionais, já que o tema da ecologia integral é um desafio universal. Estamos diante de uma sinodalidade amazônica que já está presente e se fortalecendo cada vez mais, algo que se expressou nos diferentes espaços de encontro, nos processos de diálogo e escuta, nos novos ritmos e linguagens, na diversidade de rostos, histórias e raízes, na dimensão profética e nas celebrações como expressão do espírito de seus povos.
Neste caminho sinodal, Romina pôde reunir nas vozes dos povos diferentes elementos que mostram a capacidade de perdão e reconciliação, o ser e fazer da Igreja, o reconhecimento de um Cristo encarnado nos povos e na natureza, o respeito pelas expressões da espiritualidade amazônica, a evangelização como ponto de encontro entre a Igreja e os povos, mas também da Igreja com os povos. Na Amazônia, a Igreja que está na base quer ser uma Igreja humilde, para poder ouvir seu povo, para se rebaixar, para não sentir nenhuma superioridade cultural, social, econômica, política e espiritual, uma Igreja simples e espontânea, irmã e aprendiz, profética.
Mas também é necessário ter uma Igreja que escute e apoie os jovens, que busque os talentos das mulheres e dos diferentes povos e comunidades tradicionais presentes na Amazônia, com maior participação laical, que valorize o que é fundamental para os povos indígenas: cultura, língua e território, apoiando a formação de líderes e o compromisso e empoderamento das comunidades. Precisamos tomar medidas, por exemplo, em relação às mulheres, para que o gênio feminino seja valorizado dentro e fora da Igreja, para que a riqueza de pelo menos metade da humanidade não seja perdida.
Devemos nos perguntar "o que esta pandemia desnuda e revela também no desafio da sinodalidade", aponta Mauricio Lopez. Partindo das cartas de São Paulo aos Filipenses, ele se perguntava se "é possível afirmar um caminho para uma maior sinodalidade que nos permita sair dessas diferenças aparentemente irreconciliáveis?", procurando a partir daí "caminhar juntos e juntas na bela e multiforme diversidade do nosso ser Igreja em Cristo". A pandemia revelou que aqueles que foram afetados continuam sendo os mais impactados, algo que Lopez iluminou a partir de "A Peste" de Albert Camus.
Para alguém que, como secretário executivo da REPAM, viveu todo o processo do Sínodo para a Amazônia, a sinodalidades, "é um grito profético no deserto", que deveria levar "a uma nova maneira de ser e de estar como Igreja no mundo". O chamado à sinodalidade exige discernimento, afirma Maurício, insistindo que "este caminho exige a afirmação dos sujeitos em sua diversidade de rostos pluriformes". Ao mesmo tempo, é um chamado a "assumir nossa herança comum como crentes e o chamado a ansiar pela quase impensável fraternidade universal".
A sinodalidade é um caminho a ser construído, também com aqueles que pensam diferente, superando as doenças que atuam contra a sinodalidade: a esclerose sinodal, típica dos fariseus, os separados, a misofobia sinodal, o medo da contaminação e o gnosticismo alienante, que produz um sentimento de superioridade. Este gnosticismo, ao qual o Papa Francisco se refere na exortação pós-sinodal, supõe uma fé encerrada no subjetivismo, própria daqueles que "absolutizam suas próprias teorias e as impõem aos outros a fim de submetê-las ao seu raciocínio".
Em vista disso, ele propôs alguns caminhos de purificação que podem nos ajudar em direção a essa sinodalidade. A primeira seria uma transformação do coração, a segunda, a leitura dos sinais dos tempos. A sinodalidade deve nos levar não apenas a caminhar juntos, mas com quem e onde. Para isso, Maurício, a partir da experiência do Sínodo para a Amazônia, vê a necessidade de purificar a intenção através do discernimento entre o sensu fidei, a revelação de Deus no povo simples, e as verdades infalíveis, como postulados ideológicos pré-estabelecidos fora da territorialidade e das faces concretas. A este respeito, vale a pena lembrar as palavras do Papa Francisco, que insistiu que a Assembleia sinodal é mais do que um parlamento. Quando as posições ideológicas dominam, caminhar juntos torna-se impossível.
Referindo-se também ao Papa Francisco, Mauricio Lopez falou sobre a lógica do transbordamento, somente superando "as perspectivas que nos impedem de nos encontrarmos, podemos encontrar perspectivas de sinodalidade". Isto é algo que Teilhard de Chardin expressa quando fala de neogênese, de uma consciência universal em comum. Da passagem do cego Bartimeu, diante da crise atual, ele apontou que "falhamos categoricamente em muitos níveis porque fomos incapazes de caminhar juntos e juntas, porque fomos incapazes de ver claramente". Finalmente, um elemento que não pode faltar no caminho da sinodalidade é a escutaa, "escutar a Deus até ouvirmos o grito do povo e escutar o povo até respirarmos neles a vontade para a qual Deus nos chama", como nos lembra a Episcopalis Communio.
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“A sinodalidade significa diminuir a concentração da responsabilidade da missão nos pastores”, afirma Cardeal Ramazzini - Instituto Humanitas Unisinos - IHU