04 Mai 2020
O vencedor do Prêmio Templeton de 2014 prevê uma catástrofe se o catolicismo não for reformado.
A reportagem é de Christa Pongratz-Lippitt, publicada por La Croix International, 01-05-2020. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Tomáš Halík, renomado intelectual tcheco e ex-dissidente comunista, alertou que o fechamento temporário das igrejas devido ao coronavírus deve ser visto como um alerta para o futuro do catolicismo.
Em um artigo de cinco páginas para o Christ & Welt, suplemento do jornal Die Zeit, uma das principais publicações semanais alemãs, ele disse que cada vez mais igrejas serão fechadas em um futuro não muito distante – não por causa de forças externas, como a atual pandemia, mas sim por falta de vontade de reformar.
“Já não fomos avisados, várias vezes, sobre aquilo que acontece em muitos países, onde um número cada vez maior de igrejas, mosteiros e seminários se esvaziaram ou foram fechados?”, disse o teólogo e filósofo de 71 anos.
“Por que atribuímos por tanto tempo essa evolução a influências externas (o “tsunami secular”) e não nos demos conta de que se encerrava outro capítulo da história do cristianismo, e que é hora de nos prepararmos para um novo?”, questionou ele.
Halík, que foi ordenado clandestinamente ao sacerdócio em 1984 durante a dura ditadura comunista da ex-Tchecoslováquia, disse que a Igreja deve ser aquilo que o Papa Francisco quer que ela seja: ou seja, um “hospital de campanha”.
“Uma metáfora que indica que a Igreja não deve ficar em um esplêndido isolamento do mundo, mas deve derrubar as suas fronteiras e ir, levar ajuda a todos os lugares onde as pessoas se encontrem necessitadas física, mental, social e espiritualmente”, disse ele.
Entre outras coisas, isso pode começar a compensar o fato de que, até recentemente, ela permitiu que seus representantes violassem pessoas – até mesmo as mais indefesas, acrescentou Halík.
Além de oferecer assistência médica, social e de caridade – como tem feito desde a sua fundação – a Igreja deve agora ir mais longe. Como todo bom hospital, disse ele, ela deve oferecer um diagnóstico.
O padre tcheco, que recebeu o Prêmio Templeton de ciência e religião em 2014 , disse que discernir os sinais dos tempos também inclui oferecer um tipo de “remédio preventivo” destinado a imunizar a sociedade contra os vírus letais do medo, do ódio, do populismo e do nacionalismo.
E, finalmente, também implica uma “reabilitação”; isto é, curar os traumas do passado através do perdão.
Halík sugeriu que as igrejas que estão vazias agora por causa do confinamento do coronavírus podem nos mostrar simbolicamente como será o futuro se a Igreja não tentar seriamente apresentar ao mundo uma forma totalmente diferente de cristianismo.
“Preocupamo-nos muito em converter o ‘mundo’ (o ‘resto’), e menos em convertermo-nos a nós mesmos”, afirmou.
“E isso não significa apenas ‘melhorarmo-nos’, mas passar radicalmente de um estático ‘ser cristãos’ a um dinâmico ‘tornar-se cristãos’”, continuou.
Halík propôs que usemos o tempo presente, quando as igrejas estão fechadas por causa da pandemia, para pensar muito mais profundamente na reforma da Igreja.
Ele disse que não pode ser um retorno a um mundo que não existe mais ou uma mera modificação das estruturas externas. Pelo contrário, deve ser uma reforma mais profunda que se concentre decisivamente no cerne da mensagem do Evangelho, indicada pelo Papa Francisco.
Halík, atualmente professor de sociologia na Universidade Charles de Praga, disse que os estudos sociológicos mostram que o número das pessoas que se sentem em casa em uma religião tradicional está em declínio. O mesmo acontece com o número dos ateus convictos.
Por outro lado, o número dos “buscadores” e daqueles que são apáticos a questões religiosas está crescendo.
Ele disse que os buscadores podem ser encontrados entre crentes e não crentes, que “sentem o desejo ardente de algo que satisfaça a sua sede de sentido”.
Chegou a hora dos buscadores, insistiu Halík. Mas isso significa que os cristãos devem parar de fazer proselitismo.
“Não entramos no mundo dos buscadores para ‘convertê-los’ o mais rapidamente possível e encerrá-los nos perímetros institucionais e mentais das nossas igrejas”, ressaltou.
Ele observou que Jesus também não buscou a ovelha perdida para tentar trazê-la de volta para as estruturas existentes da religião judaica, porque Jesus sabia que odres novos eram necessários para o vinho novo.
Halík disse que as comunidades cristãs, as paróquias, os movimentos e as ordens religiosas devem tentar alcançar o mesmo objetivo que levou à fundação das universidades europeias – “uma escola de sabedoria na qual a verdade é buscada através do livre debate e, também, da profunda contemplação”.
“Tais ilhas de espiritualidade e de diálogo poderiam ser a fonte de uma força capaz de curar um mundo doente”, disse ele.
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Igrejas fechadas são antecipação do futuro, alerta Tomáš Halík - Instituto Humanitas Unisinos - IHU