02 Abril 2020
"Em mais um triste caso de assassinato de lideranças indígenas no Maranhão, Zezico Rodrigues, do povo Guajajara, foi morto a tiros nesta terça-feira (31) na Terra Indígena Arariboia", escrevem, em nota, as instituições Centro de Trabalho Indigenista (CTI), Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Greenpeace e Instituto Socioambiental (ISA).
É com profunda tristeza e indignação que noticiamos a morte de mais uma liderança indígena que lutava contra invasões e roubo de madeira em seu território. Zezico Rodrigues, do povo Guajajara, foi encontrado morto a tiros nesta terça-feira (31), na Terra Indígena (TI) Arariboia, município de Arame (MA).
Zezico Guajajara era professor e diretor da escola indígena da aldeia Zutiwa, na TI Arariboia. (Foto: Arquivo Pessoal)
Professor e diretor do Centro de Educação Escolar Indígena Azuru, na aldeia Zutiwa, Zezico tinha forte atuação em defesa do território tradicional do povo Guajajara. Como liderança, posicionava-se contra a derrubada da floresta e vinha denunciando a crescente presença de invasores e o roubo de madeira na TI Arariboia. No último dia 29, Zezico havia sido nomeado coordenador regional da Comissão de Caciques e Lideranças da Terra Indígena Arariboia (Cocalitia).
Com o assassinato de Zezico Rodrigues, o número de homicídios registrados contra indígenas do povo Guajajara desde o ano 2000 chega a 49 – sendo 48 deles no Maranhão e um no Pará, conforme dados do Conselho Indigenista Missionário (Cimi). Apenas nos dois últimos meses de 2019, quatro indígenas Guajajara foram assassinados. Entre eles, Paulo Paulino Guajajara, que era integrante do grupo de Guardiões da Floresta, formado pelos próprios indígenas para monitorar e defender seus territórios tradicionais frente à presença de invasores.
Após estes assassinatos, o ministro da Justiça e Segurança Pública Sergio Moro autorizou o emprego da Força Nacional de Segurança Pública na Terra Indígena Cana Brava Guajajara, no Maranhão, por 90 dias. No entanto, não foram implementadas medidas para garantir a contínua proteção dos territórios e de seus povos, e a violência persiste na região.
Na sequência destes casos, em janeiro deste ano, Jair Bolsonaro declarou: “Mais de 15% do território nacional é demarcado como terra indígena e quilombolas. Menos de um milhão de pessoas vivem nestes lugares isolados do Brasil de verdade, exploradas e manipuladas por ONGs. Vamos juntos integrar estes cidadãos e valorizar a todos os brasileiros”.
Este convite do presidente da República à invasão e integração forçada é responsável pela violência crescente em diversas terras indígenas pelo país. Seus fanáticos seguidores se sentem à vontade para invadir os territórios, criar dissociações, ameaçar e atacar lideranças indígenas. O que ocorre também nas cidades do entorno das terras, caso do recente assassinato de Demilson Ovelar Mendes Avá-Guarani, no oeste do Paraná.
O impressionante número de homicídios contra o povo Guajajara, muitos dos quais sem punição ou mesmo investigações conclusivas, soma-se a um contexto de constantes invasões às terras indígenas, especialmente por madeireiros, garimpeiros e grileiros.
A situação vivenciada pelo povo Guajajara é trágica e exemplar em relação ao contexto de vulnerabilidade a que muitas comunidades indígenas estão expostas em todo o Brasil – mesmo as que vivem em terras já demarcadas e, em tese, contam com a proteção do Estado.
Zezico também era um defensor dos direitos do grupo Awá-Guajá que vive em situação de isolamento voluntário na TI Arariboia. O assédio cotidiano de invasores numa terra com presença de indígenas isolados, grave por si só, torna-se ainda mais preocupante em meio à pandemia global do coronavírus.
O contexto de risco à saúde dos povos indígenas acentua um cenário que já é crítico e torna ainda mais urgente que o governo federal tome providências para garantir a segurança dos povos indígenas, suas vidas e seus territórios.
Atualmente, contudo, a estratégia do governo Bolsonaro tem sido pautada pelo desmonte da política indigenista, que se evidencia na não demarcação de terras indígenas e no abandono, pela Funai, de ações judiciais que discutem a permanência dos povos em terras sob litígio. Na última semana, de maneira irresponsável e em meio à pandemia de coronavírus, o presidente da Funai anulou a demarcação da Terra Indígena Guasu Guavira, no Oeste do Paraná.
Soma-se ao cenário de desmonte a redução de ações de fiscalização e um discurso que incentiva a invasão de terras demarcadas e consolidadas, citando como casos exemplares as terras indígenas Arariboia, Karipuna, em Rondônia, e Raposa Serra do Sol, em Roraima.
Em solidariedade aos familiares de Zezico e ao povo Guajajara, exigimos que:
1 – o Poder Público realize ações de fiscalização e proteção na Terra Indígena Arariboia, assim como nas outras terras indígenas do Maranhão, e que retire imediatamente os invasores, especialmente em meio à pandemia da Covid-19.
2 – o Estado responsabilize os invasores e os responsáveis pelos assassinatos de lideranças Guajajara e de outros povos indígenas.
3 – o Estado garanta medidas emergenciais de proteção aos povos isolados e à saúde dos povos indígenas.
4 – que os Três Poderes, especialmente o Poder Executivo, cumpram com sua obrigação constitucional de demarcar, fiscalizar e proteger todas as terras indígenas do Brasil.
E conclamamos o Ministério Público Federal (MPF), a Defensoria Pública da União (DPU) e a Organização dos Advogados do Brasil (OAB) acionem a Justiça para garantir os direitos indígenas, sobretudo à proteção e demarcação territorial.
Zezico presente!
Centro de Trabalho Indigenista - CTI
Conselho Indigenista MIssionário - Cimi
Greenpeace
Instituto Socioambiental - ISA
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Mais um Guajajara tomba! Até quando? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU