02 Setembro 2015
Os sinais de que o Papa Francisco vai chegar em breve à Cidade do Amor Fraternal – como é conhecida a cidade da Filadélfia – abundam. Em um bar irlandês local não muito longe do hotel City Center que está hospedando algumas centenas de jornalistas reunidos para o congresso da Religion Newswriters Association, bandeiras douradas e brancas vaticanas tremulam nos mastros e os que aí chegam são recebidos com uma faixa nas cores branca e verde, em que se lê: “McGillin’s Saúda o Papa Francisco”.
A reportagem é de Michael O’Loughlin, publciada pelo sítio Crux, 29-08-2015. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
As lojas do aeroporto da cidade estão repletas de produtos alusivos à visita do pontífice, e bonecos de papelão com a imagem do líder religioso estão por todos os lugares, em que os proprietários dos estabelecimentos convidam os transeuntes a tirarem uma selfie por um preço simbólico.
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E então, será que os moradores da Filadélfia vão mesmo saudar o pontífice?
Durante semanas, as reportagens em torno de um “papa-apocalipse” iminente – impulsionados por intensas medidas de segurança e preocupações com o controle de multidões – levaram alguns a questionar se receber o Papa Francisco no sábado e no domingo (26 e 27 de setembro) irá valer a pena.
Uma igreja batista perto do epicentro da visita do papa irá suspender os seus serviços religiosos.
“É claro que não teremos condições de celebrar em nossa igreja no domingo”, disse a pastora Leslie D. Callahan, da comunidade batista de St. Paul. “Então, teremos de rever quando realizaremos o culto daquela semana”.
Ela também demonstra preocupação com o que vai acontecer com os desabrigados da cidade que passam o tempo no Parque Benjamin Franklin, local da missa papal.
Essas preocupações, além de relatos de que seria muito difícil conseguir ver o papa na Filadélfia, foram recentemente exacerbadas por uma agência local de trânsito, que divulgou um mapa que se assemelhava a uma espécie de zona da explosão, mostrando aos peregrinos quantas horas – até 11 – eles poderão precisar caminhar caso queiram ver o pontífice.
Perguntei a Meg Kane, uma das coordenadoras do Encontro Mundial das Famílias, se toda esta preocupação se justificava. A sua resposta foi um não inequívoco.
As preocupações quanto aos participantes conseguirem chegar aos eventos, incluindo a missa papal que deve atrair cerca de 1 milhão de fiéis, estão sendo exageradas, disse ela.
Não só ainda existem 200 mil tíquetes especiais para o evento papal disponíveis para quem vem de trem, como também há planos para que se possa pegar ônibus que transportarão as pessoas ao evento, além de percursos pedestres de menos de 3 quilômetros. E mais, disse ela, alguns hotéis no centro da cidade ainda possuem vagas.
Com certeza, uma busca rápida em sites hoteleiros demonstra que ela está certa: há quartos disponíveis para reserva bem no coração da cidade durante todo o Encontro Mundial das Famílias, incluindo os dias da visita papal, apesar dos preços aparentemente inflacionados.
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Com menos de um mês para a vista, estes quartos de hotel vazios não significam que as multidões poderão ser menores do que as esperadas pelos organizadores?
Isso aconteceu com outras visitas papais aos Estados Unidos. Por exemplo, quando o Papa João Paulo II visitou Miami em 1987, as preocupações quanto a lidar com multidões potencialmente enormes assustaram as pessoas, e a contagem final resultou num número muito menor do que o esperado.
Portanto, Kane e sua equipe estão focadas em garantir que os potenciais visitantes saibam que a cidade da Filadélfia está “aberta para negócios”.
Foi lançada uma campanha nas mídias sociais chamada “#OpenInPHL”, incentivando os estabelecimentos a mostrar o seu orgulho papal, exibindo placas em suas janelas exclamando: “Bem-vindo, Papa Francisco” e “Eu vou estar lá”.
Postar selfies com a hashtag #OpenInPHL poderá pagar as despesas: um proprietário e uma família vão ganhar uma viagem gratuita a Roma.
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O arcebispo da Filadélfia, Dom Charles Chaput, disse aos jornalistas, no último dia 28, que o Encontro Mundial das Famílias está tomando proporções maiores do que se esperava. Inicialmente, os organizadores do evento planejaram-se para 250 expositores e 15 mil inscritos. Hoje, há a informação de que já se ultrapassou o número de 400 expositores e se espera atrair 17 mil visitantes. Em um ensaio, publicado na edição de domingo do Philadelphia Inquirer, Chaput trouxe uma mensagem aos católicos locais: “Não temais”.
Mas uma área em que o Encontro Mundial das Famílias continua um pouco abaixo das projeções é a da arrecadação de fundos. A meta de captação de recursos na casa dos 45 milhões de dólares não foi ainda alcançada, disse Chaput.
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Assim que o Papa Francisco chegar à cidade, qual vai ser a sua mensagem?
Vários sacerdotes, professores e prelados passaram a maior parte desta sexta-feira explicando aos jornalistas que é uma tarefa impossível prever o que o Papa Francisco, líder extremamente espontâneo, dirá e fará nos dias em que estiver na cidade. Mas isso não os impediu de tentar.
Maryann Cusimano Love, professora da Universidade Católica da América, disse achar que Francisco vai tocar naquilo que ela chama de os quatro pês: a Pobreza, o Planeta, as Pessoas e a Paz. O que ele não vai fazer, segundo ela, é se aprofundar na política.
Mas Dom Joseph Kurtz, da Arquidiocese de Louisville e presidente da Conferência dos Bispos Católicos dos EUA, disse esperar que Francisco não apenas toque na questão espinhosa da imigração em geral, mas também convide os legisladores do país a aprovarem uma reforma migratória integral.
Alguns painelistas disseram esperar que Francisco fale sobre a liberdade religiosa, tema que emergiu como uma prioridade para os bispos dos Estados Unidos nos últimos anos. Nos Estados Unidos, essa luta gira principalmente em torno do casamento homoafetivo e do artigo sobre a garantia de métodos anticoncepcionais presentes no Affordable Care Act, lei que regulamenta o sistema de saúde americano.
Mas com a perseguição aos cristãos em lugares como o Iraque e a Síria atingindo níveis genocidas, é de se perguntar quais situações em particular Francisco terá em mente caso venha a tocar nesse assunto.
Diversos painelistas se centraram no ponto de que Francisco não vem se desviando dos ensinamentos da Igreja em geral, como alguns críticos apontam.
Outros procuraram dissipar a noção de que os bispos americanos estão em desacordo com o papa no que diz respeito às prioridades.
Ainda neste ano, por exemplo, os bispos votaram suas prioridades para os próximos três anos, o que incluiu a família, a liberdade religiosa e vida, mas não a pobreza ou a imigração; Francisco fez da pobreza e do meio ambiente as suas principais problemáticas. Alguns bispos notaram esta discrepância e, publicamente, desafiaram os seus pares.
Porém, Chaput disse que a sua diocese gasta mais de 4 milhões de dólares por ano em projetos de justiça social, em comparação com apenas os apenas 200 mil anuais empregados nas iniciativas antiabortivas.
Kurtz disse que as prioridades da Conferência Episcopal são áreas que precisam ser melhoradas, e não onde eles já estão fazendo um bom trabalho.
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Francisco verá apenas uma pequena amostra dos Estados Unidos nesta sua visita, jamais deixando o chamado Corredor Acela, o trajeto entre Nova York e Washington, DC. Isso chamou a atenção de alguns demógrafos que relatam que o crescimento católico nos EUA se encontra distante destes centros de poder político e financeiro.
Dom José Gomez, da Arquidiocese de Los Angeles, por exemplo, observou que os 7 mil batismos de crianças realizados em sua jurisdição são maiores do que os de Nova York, Chicago, Filadélfia e Washington juntos.
Ainda assim, a Igreja latino-americano nos Estados Unidos estará fortemente envolvida na visita do papa, incluindo a canonização de Junipero Serra.
Gomez rejeitou as críticas que dizem que o papa está cometendo um erro ao elevar Serra porque este franciscano do século XVIII foi cúmplice no massacre de nativos americanos nas mãos de exploradores espanhóis.
“O fato de que houve alguns abusos cometidos naquela época não desfaz o fato de que Serra esteve totalmente comprometido com o serviço a estas pessoas sob os seus cuidados”, disse ele. “Ele foi a primeira pessoa que realmente defendeu os nativos americanos dos abusos cometidos pelos militares espanhóis na Califórnia, foi, provavelmente, o primeiro a falar sobre os direitos humanos dos indígenas”.
E haverá outras formas de presença da Igreja latino-americano colorindo esta viagem também.
Francisco fala fluentemente espanhol e italiano, mas se sente desconfortável em inglês. Isso não será uma grande preocupação, já que missa que ele vai celebrar em Washington e o seu discurso nas Nações Unidas serão em espanhol.
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Por falar neste assunto, o papa talvez terá de se expressar em um outro idioma ainda.
Chaput informou que partes da missa do Encontro Mundial das Famílias – o maior evento público durante a turnê do papa – serão celebradas na língua universal da Igreja: o latim.
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O Papa na Filadélfia: multidões, tuítes, dinheiro e... latim? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU