27 Março 2024
Após as medidas de 2011 que o impediram de exercer qualquer ministério público e uma vida de solidão e oração, D. Roger Vangheluwe, agora com 87 anos e anteriormente bispo de Bruges (Bélgica), foi laicizado. A pena mais grave para um eclesiástico é motivada após a chegada a Roma de material acusatório adicional com a denúncia de uma nova vítima. Esta se soma às anteriores, incluindo dois sobrinhos ainda crianças, que motivaram as censuras anteriores.
A reportagem é de Lorenzo Prezzi, publicado por Settimana News, 23-03-2024.
Não insignificante também foi o impulso midiático, após a série de televisão Godvergeten (Esquecidos por Deus), a repetida solicitação dos bispos e a irritação governamental e política, visando limitar o apoio econômico ao clero e as despesas com a manutenção das igrejas.
Em 22 de janeiro, o núncio se reuniu com o governo (o primeiro-ministro, Alexander De Croo, e o ministro da justiça, Paul van Tigchelt) para preparar a viagem do Papa Francisco ao país por ocasião dos 600 anos da universidade de Leuven e a questão de Vangheluwe voltou à mesa.
As reações à decisão do Vaticano foram positivas, mas muitos a consideram obrigatória e tardia. O porta-voz da Igreja francófona disse: "Claramente é a decisão que os bispos esperavam. Por que não foi tomada em 2010? Talvez porque na época não se tinha consciência da gravidade dos fatos e de suas pesadas consequências para as vítimas. No entanto, estou feliz que a decisão finalmente tenha chegado. Caso contrário, seria difícil organizar a visita do papa ... Além disso, me tranquiliza o fato de que R. Vangheluwe tenha afirmado ele mesmo não querer mais nenhum contato com o mundo exterior".
O ex-prelado é hóspede da abadia de Solesmes, na França. Inutilmente, os bispos, em particular D. Johan Bonny, tentaram convencê-lo a solicitar espontaneamente a sua redução ao estado laical. "Ele ainda é padre e bispo", dizia Bonny com alguma irritação, "nas Flandres ninguém entende por quê. É um escândalo". Sem o seu pedido, apenas a Santa Sé poderia tomar a decisão.
Sobre os abusos por parte do pessoal eclesiástico nas décadas anteriores, deve-se lembrar que em 2019 foi publicado um Relatório, solicitado pelos bispos, que falava de 1.054 casos. Em 73% dos casos, as violências foram cometidas contra menores de 10 a 18 anos.
Após o escândalo e a comoção emocional da série de televisão Godvergeten, os partidos decidiram iniciar uma segunda comissão parlamentar sobre violências contra menores (na Igreja e além). Entre as diversas audiências realizadas pela comissão, em 23 de fevereiro ela se reuniu com os representantes eclesiásticos: o arcebispo Luc Terlinden, os bispos Guy Harpigny e Johan Bonny, o secretário-geral da conferência episcopal, Bruno Spriet, e o porta-voz francófono, Tommy Scholtes. Nessa ocasião, foi traçado o caminho percorrido pela Igreja, em estreita relação com as administrações públicas, em relação aos abusos.
Em 1996, explodiu no país o "caso Dutrux", um pedófilo responsável por diversos homicídios de crianças. No ano seguinte, em 1997, a Igreja abriu dois pontos de contato para relatar eventuais abusos. Em 2000, foi criada uma comissão eclesiástica para denúncias de abusos na relação pastoral. Após o caso clamoroso do bispo Vangheluwe - no qual também estava envolvido o Cardeal Godfried Danneels - o parlamento iniciou uma comissão de inquérito, cujo relatório final a Igreja seguiu.
"Nenhum outro país no mundo viu as autoridades eclesiásticas se adaptarem ao legislador colaborando plenamente", destacaram os bispos diante dos parlamentares. Foi criado um centro de arbitragem onde as vítimas de crimes prescritos poderiam obter uma compensação financeira. Foram avaliados 628 casos e, nos anos seguintes, mais 700. Em 2012, foi elaborado um código de conduta para todos os agentes pastorais e os bispos sempre se mostraram disponíveis para custear despesas terapêuticas das vítimas.
Tanto que algumas vítimas, em ambientes não eclesiásticos, procuraram as instituições eclesiásticas e o ponto de contato nacional para serem ouvidas e acolhidas. Uma análise minuciosa é realizada com os candidatos ao sacerdócio e dias de estudo sobre abusos são obrigatórios para todos os agentes pastorais.
Desde 2005, todo suposto crime é comunicado ao procurador e o envolvido é suspenso das funções pastorais que exerce. O material é enviado a Roma para uma investigação canônica que é interrompida quando também é iniciada uma investigação civil. Desde 2016, um conselho de supervisão acompanha os bispos e os ordinários para lidar com os casos prescritos e os predadores que completaram a pena imposta a eles.
Como conclusão à audiência parlamentar, os bispos se comprometeram: a cooperar ainda mais ativamente com as instituições e profissionais do campo; a realizar as reformas internas necessárias; a fornecer formação adequada aos voluntários na vida eclesiástica; a apoiar as vítimas e facilitar as denúncias; a reconhecer as vítimas de abusos prescritos e evitar, na medida do possível, que ocorram novos casos.
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Bélgica: limpezas na Igreja - Instituto Humanitas Unisinos - IHU