26 Setembro 2017
É numérico: os membros da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) têm, hoje, o poder de derrubar uma presidente e de manter outro no poder. Metade dos votos pelo impeachment (50%) de Dilma Rousseff, no ano passado, e mais da metade dos votos para manter Temer (51%) saíram dessa bancada.
Fonte: De Olho nos Ruralistas.
A reportagem é de Alceu Luís Castilho, publicada por De Olho nos Ruralistas, 25-09-2017.
E mais: De Olho nos Ruralistas atualizou os dados sobre essas votações na Câmara e constatou uma sobreposição até agora inédita: entre 155 deputados dessa frente que votaram tanto no dia 17 de abril de 2016 como na sessão do dia 2 de agosto de 2017, 124 deles votaram contra Dilma Rousseff e a favor de Michel Temer. Ou seja, 80% dos votantes da FPA. A taxa de fidelidade a eles mesmos é alta.
Conheça aqui os deputados da FPA que ajudaram – com participação nas duas votações – a derrubar Dilma e a manter Temer: “Conheça os 124 deputados da FPA que derrubaram Dilma e mantiveram Temer“. Esse núcleo duro ruralista somou mais de 1/3 dos que votaram contra Dilma (34% do total de votos pelo impeachment) – fora os que participaram de somente uma votação – e quase a metade dos que estiveram na sessão que manteve Michel Temer no poder (47%).
O preço alto da fidelidade
Em outras palavras: entre os ruralistas que derrubaram Dilma, quase a metade da Câmara, há um grupo ainda mais coeso, que votou em dobradinha – e é responsável direto pela atua sobrevida de Temer. Isto aconteceu após sucessivas reuniões na sede da Frente Parlamentar da Agropecuária, numa mansão no Lago Sul, em Brasília – até mesmo nas vésperas do golpe. Resultado: atendimento, pelo presidente, das pautas do setor.
A porcentagem dos deputados da Frente Parlamentar da Agropecuária que votaram pela admissão do pedido de impeachment de Dilma atinge 82,7% do universo eleitoral da FPA. Isso significa que 172 deputados, entre 208 votantes dessa bancada em 2016, deram “sim” no plenário, no dia em que o Massacre de Eldorado dos Carajás, no Pará, completava 20 anos, em 17 de abril do ano passado.
Apenas 36 membros da FPA votaram contra o impeachment, no dia 2 de agosto de 2017; 6 deles são do PT (sim, há uma minoria petista dentro da frente ruralista); 23 deles, do Nordeste, região de forte eleitorado petista. Contra Temer, foram ainda menos votos oriundos dessa bancada do que aqueles que tentaram salvar Dilma: 31.
Ao contrário do que diz o senso comum, que imagina uma maioria absoluta de ruralistas em regiões como o Centro-Oeste, a maior parte dos ruralistas sai das regiões mais populosas – inclusive como representantes de outras Unidades da Federação. Deputados da FPA do Sudeste e do Sul somaram mais da metade dos votos da frente contra Dilma: 106, diante de 76 votos que saíram das demais regiões.
Votos da FPA contra Dilma:
-> Sudeste – 58
-> Sul – 38
-> Nordeste – 29
-> Centro-Oeste – 25
-> Norte – 22
Total: 182.
Esses políticos do Nordeste não se mostraram fiéis ao governo deposto. Mudaram de lado. Em agosto, 187 deputados da FPA votaram no dia do arquivamento da denúncia contra Temer. E 134 deles, positivamente. A soma dos deputados do Nordeste – região populosa, com muitos parlamentares – chegou a ultrapassar a dos deputados da região Sul, onde houve votos surpreendentes contra o presidente, como o dos deputados Luis Carlos Heinze (PP-RS) e Votos da FPA a favor de Temer:
-> Sudeste – 40
-> Nordeste – 25
-> Norte – 24
-> Sul – 24
-> Centro-Oeste – 21
Total: 134.
Goergen, membro ativo da bancada ruralista, tinha votado contra Dilma duas vezes: em plenário e na Comissão Especial que admitiu inicialmente o processo na Câmara. Ao lado dele estava o deputado matogrossense Nilson Leitão (PSDB). Que, em fevereiro, voltou a ser presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, sucedendo o deputado Marcos Montes (PSD-MG). Os dois mostraram-se fiéis a Temer: derrubaram Dilma e as investigações contra o presidente.
Dos 367 votos na Câmara que ajudaram a derrubar Dilma Rousseff em abril de 2016, 182 saíram de integrantes da Frente Parlamentar da Agropecuária. A porcentagem é de 49,59% do total de votos contra Dilma – de ruralistas ou não – no dia 17 de abril de 2016. Naquele momento a votação no Senado (repleto de ruralistas, mas com pouco poder na FPA), efetivada em maio, já se apresentava apenas como uma confirmação desse movimento. Dilma estaria fora. Michel Temer tornou-se presidente interino.
Alvo de denúncias muito mais graves que as pedaladas fiscais, réu no Supremo Tribunal Federal, Temer poderia ter sofrido o mesmo que a presidente deposta. Livrou-se. Com a ajuda de 134 dos 187 votantes que são signatários da Frente Parlamentar da Agropecuária. Ou seja, 50,9% dos 263 votos que impediram um processo parlamentar contra Michel Temer. Uma ausência importante foi a do deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), ex-ministro da Justiça em seu governo e líder jurídico da FPA.
O levantamento do observatório foi feito a partir de mais de uma base de dados mais completa sobre os integrantes da FPA, divulgada por Marcos Montes ao Globo Rural em 2016. O site foi o primeiro a fazer um levantamento sobre os ruralistas que votaram contra Dilma. Em agosto, o De Olho nos Ruralistas divulgou a primeira notícia – horas antes do UOL – sobre os deputados dessa frente que livraram Temer do ritual de cassação. Os números estavam incompletos. É que o site da FPA estava – e ainda está – desatualizado.
Naquele mês, informamos: “Metade dos votos para Temer saiu da Frente Parlamentar da Agropecuária“. E o arredondamento percentual está correto. Só que não foram 129 deputados da frente que barraram o processo, como consta daquele texto, e sim 134. (Fora os fazendeiros e donos de empresas agropecuárias que não compõem a FPA, como os paulistas Beto Mansur, Paulo Maluf e, entre muitos outros ruralistas, o paraibano Aguinaldo Ribeiro, ministro das Cidades no governo Dilma e, desde fevereiro, líder do governo Temer na Câmara.)
As duas listas de membros da Frente Parlamentar da Agropecuária – a do ex-presidente Montes e a que consta no site oficial da FPA – contêm nomes de deputados que não estão em exercício. Por isso optamos por trabalhar, metodologicamente, com o número de deputados que efetivamente votaram. O que exclui, também, os ausentes e os que deixaram temporariamente de votar naqueles dias específicos, para cederem o posto a ministros e outros políticos licenciados de seu cargo exclusivamente para as votações em plenário.
Conheça aqui os deputados da FPA que ajudaram a derrubar Dilma e votaram pela continuidade da denúncia contra Temer: “Entre os deputados da FPA, 31 derrubaram Dilma e votaram contra Temer em 2017“.
Aqui, os membros da FPA na Câmara que absolveram Dilma e votaram contra ou a favor do atual presidente: “Deputados ruralistas que votaram a favor de Dilma dividiram-se em relação a Temer“.
Os números foram compilados pelo De Olho nos Ruralistas para apresentação no IV Tribunal Tiradentes, em São Paulo, neste dia 25 de setembro. A cerimônia julga simbolicamente o Congresso. Ela foi inspirada no Tribunal Russell, nos Estados Unidos, que julgou os crimes de guerra no Vietnã e motivou, em 1983 e 1984, as duas primeiras edições do Tribunal Tiradentes, ainda em plena ditadura.
O testemunho feito no tribunal incluiu também números sobre conflitos no campo, em sua interface com as políticas do governo Temer e do Congresso, e dados que indicam conflitos de interesse – ou mistura de interesses públicos e privados – relativos aos parlamentares que derrubaram Dilma e mantiveram Temer.
Em outras palavras, esses dados mostram alguns dos motivos (do perdão de dívidas à votação de projetos importantes para os ruralistas) para que a FPA invoque um poder que não deveria ter: o de manter ou derrubar presidentes. Isto enquanto os conflitos e número de assassinatos políticos no campo se multiplicam.
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Frente Parlamentar da Agropecuária compôs 50% dos votos do impeachment e 51% dos votos para manter Temer - Instituto Humanitas Unisinos - IHU