03 Janeiro 2024
A jurista Micaela Frulli analisa a denúncia da África do Sul em Haia por “genocídio”.
“É um recurso de grande valor, não só simbólico, porque é a primeira vez que o Estado de Israel é citado perante o Tribunal Internacional de Justiça por suposta violação da Convenção sobre o Genocídio de 1948".
A reportagem é de Riccardo Michelucci, publicada por Avvenire, 02-01-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Micaela Frulli, docente de direito internacional na Universidade de Florença, comenta assim a denúncia apresentada no final da semana passada pela África do Sul, onde se argumenta que “os atos e omissões de Israel são de natureza genocida, porque cometidos com a intenção específica de destruir os habitantes da Faixa como parte do mais amplo Grupo nacional, étnico e racial palestino".
Acusações que Tel Aviv rejeitou imediatamente com desdém, considerando-as “difamatórias”. De acordo com a Professora Frulli – especialista em justiça penal internacional que trabalhou por muito tempo com o primeiro presidente do Tribunal para a ex-Jugoslávia, Antonio Cassese – trata-se de um recurso significativo, também porque solicita à Corte a adoção urgente de medidas cautelares, ou seja, que impeçam novas violações dos direitos fundamentais da população palestina de Gaza.
“Só um tribunal poderá decidir se se trata ou não de genocídio. Com base na Convenção de 1948, os estados não teriam apenas a obrigação de processar penalmente os responsáveis de um eventual genocídio, mas também de preveni-lo", explica. “Certamente o bloqueio total da Faixa implementado por Israel, fechando todas as vias de acesso, cortando a eletricidade e todas as formas de abastecimento e impedindo a chegada de alimentos, água e itens de primeira necessidade e ajudas humanitárias representa um crime que está colocando em sério risco a sobrevivência da população civil palestina. Não é por acaso que as principais organizações internacionais, a começar pelas Nações Unidas, Unicef e OMS, falam de catástrofe humanitária".
“Além disso, o direito internacional humanitário proíbe ataques contra objetivos civis, hospitais, escolas e locais de culto, e o fato de membros do Hamas se esconderem em edifícios civis residenciais certamente não transforma tais lugares em alvos militares que possam ser atingidos indiscriminadamente". Frulli acredita que também as ações do Hamas constituem crimes de guerra a serem processados o mais rápido possível, atos que poderiam ser qualificados como crimes contra a humanidade considerando que foram lançadas como parte de um ataque em grande escala contra civis.
"No entanto a reação de Israel, além de ser amplamente desproporcionada, não pode sequer ser qualificada como legítima defesa, uma vez que os ataques de 7 de outubro partiram de uma zona sob ocupação militar israelense e só se pode falar de legítima defesa quando um Estado reage ao ataque de outro Estado ou de atores não estatais que se encontram no território de um outro Estado".
Por fim, quanto às possibilidades reais de os responsáveis pelos crimes serem processados, Frulli não parece muito confiante. “O Tribunal Penal Internacional tem competência tanto sobre os crimes do Hamas como sobre as violações cometidas por Israel em Gaza em resposta àqueles ataques. As investigações já foram abertas, mas o Tribunal não pode funcionar adequadamente sem a cooperação de cada Estado. No momento os investigadores nem sequer têm a possibilidade de entrar nos Territórios ocupados porque Israel não permite o acesso. E isso complica demais a coleta das provas e a possibilidade de realizar investigações adequadas”.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
“A causa contra Israel pode ser o passo para a defesa dos direitos da população” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU