Os problemas mais presentes hoje em Burkina Faso dizem respeito ao terrorismo e às migrações internas do país, mais do que a própria mudança climática. Mas, com toda razão, podemo-nos perguntar qual seria a causa e qual seria o efeito entre uns e outros.
O artigo é de Paolo Motta, padre missionário da Comunidade de Villaregia, que há mais de 4 anos trabalha na missão de Ouagadougou, capital de Burkina Faso, publicado por Settimana News, 11-07-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Para quem acompanha esses problemas há anos, não é difícil identificar na base dos problemas do terrorismo, da migração, das mudanças climáticas e da crise ambiental em geral, a mesma mentalidade, chamada de "extrativista" - com desenvolvimento linear ou exponencial -, em contraposição àquela que hoje se chama de economia "circular" ou sustentável.
Mapa de Burkina Faso (Foto: InfoEscola)
A globalização revelou complexidades e conexões impensadas. A pandemia nos mostrou como, em poucas semanas, todo o planeta pode ser atingido por um vírus. Os processos de globalização também estão na origem da perda da biodiversidade, pois ela tende mais a uniformizar do que a proteger as diferenças.
Há anos que despejamos no meio ambiente, com os gases de efeito estufa e outros poluentes, o custo da diferença entre o velho - a ser jogado fora e trocado - e o novo, em detrimento da sustentabilidade. Para as gerações jovens e futuras isso foi um egoísmo enorme, justificado apenas em parte pela ignorância.
Nos últimos anos, os estudos e pesquisas sobre mudanças climáticas, perda de biodiversidade e poluição global se multiplicaram e agora a ignorância só pode se manter por conveniência. Mas mesmo com tal consciência, a inversão de rota é mais uma teoria do que uma prática. Segundo dados da ENEA, na Itália, ainda no primeiro trimestre de 2022, houve um aumento do consumo de energia em 2,5% e as emissões de CO2 aumentaram 8%, apesar de tudo o que se fala.
Nesta mesma perspectiva podemos ler as consequências das mudanças climáticas em Burkina Faso.
A primeira consequência me parece ser o deslocamento interno. A situação é "filha" do chamado terrorismo islâmico, mas é ao mesmo tempo "neta" da mentalidade econômica mundial, da "ditadura" da economia e das finanças fundada no modelo, justamente, de desenvolvimento linear ou até mesmo exponencial, que se afirmaram no século passado.
Partimos de longe, da guerra que a URSS travou no Afeganistão nos anos 1980, na época dos blocos adversários: os Estados Unidos, para se opor à União Soviética, acabaram criando um viveiro do terrorismo mundial que depois se revoltou contra eles mesmos.
O fundamentalismo é certamente fruto de uma interpretação radical do Islã que muitos no mundo árabe não compartilharam, mas, não menos, da necessidade de criar uma identidade forte que pudesse se distinguir da dominação estadunidense, que se tornou, após a queda do bloco soviético, quase indiscutível.
Quando houve o atentado às torres gêmeas, junto com a dor pela morte de tantas pessoas, uma parte do mundo árabe - e não só - se alegrou, pois o evento simbolizou o golpe do pequeno Davi contra o gigante Golias: um punhado de homens manteve em xeque uma nação inteira e o mundo inteiro. Eu estava na Costa do Marfim naquela época e o evento era lido de forma muito diferente da ótica ocidental.
O mundo mudou desde aquele 11 de setembro, a hegemonia dos EUA não é mais a mesma. Muitos recursos foram investidos na luta contra o terrorismo, sem obter grandes resultados: aliás, o terrorismo se espalhou para outros países e abriu novas frentes até o nosso Sahel.
Por trás - repito - está a mesma mentalidade extrativista: os EUA tentando punir os "países maus", coincidentemente ricos em petróleo, e os terroristas em busca de novos territórios, onde exista a possibilidade de agir sem perturbação para apropriar-se dos recursos da terra: as terras daqueles que, até aquele momento, viviam sossegados e não se preparavam minimamente para enfrentar uma agressão violenta e dotada de meios muito superiores.
Quem tem sucesso na estratégia de se apropriar fica imediatamente rico, extremamente rico: a partir do Covid em diante, nasceu um novo bilionário a cada 30 horas, não tanto por suas capacidades extraordinárias, mas por ter se encontrado no lugar certo na hora certa, por ser capaz de explorar os mecanismos das finanças globais; no mesmo período de tempo, aproximadamente a cada 30 horas, mais de um milhão de pessoas começaram a passar fome (cf. aqui).
Mas se um daqueles pobres - do milhão de pobres - consegue ficar bilionário, para ele evidentemente, tudo muda: eis que aqui nasce - muitas vezes entre a nossa própria gente - a miragem que justifica a adoção de todos os meios para atingir a meta.
A caça desenfreada pelos recursos da terra empurrou as pesquisas para as áreas da África onde estamos: novos depósitos de vários materiais (ouro, diamantes e outros minerais) foram descobertos; uma nova via se abriu para drogas e contrabando de todos os tipos; afirmou-se a possibilidade de criar um estado clandestino nas fronteiras de várias nações afro-sahelianas, enquanto corredores de mercadorias em trânsito foram abertos para a Europa e os EUA.
No meio de tudo isso estão a pessoas pobres. Os terroristas fazem incursões levando intimidação à população, ganhando acesso livre a vilarejos onde o Estado não consegue manter a segurança. Então, os habitantes fogem para centros habitados mais seguros.
Existem agora cerca de 2 milhões de pessoas deslocadas internamente, cerca de 10% da população (cf. aqui) em Burkina Faso. Em Ouagadougou, os deslocados são relativamente poucos, pois a maioria fica em cidades mais próximas de suas aldeias, que ficam na fronteira com o Mali e o Níger: o triângulo vermelho do terrorismo.
Mali e Nigéria (Foto: CIA | Wikimedia Commons)
Ultimamente, uma tática terrorista é atingir pontos de abastecimento de água: aquedutos, fontes públicas, bacias de contenção que alimentam a distribuição. Em Djibo, no mês de abril, o mais quente do ano, houve uma disponibilidade de água de 3 litros por habitante por dia, contra um mínimo - estabelecido pela ONU - de 15 litros. A população corre o risco de desidratação, além de grave carência higiênica. A estação chuvosa começou e a situação está melhorando um pouco, mas é claro que o problema subjacente continua grave.
A situação é tão grave justamente porque as mudanças climáticas a estão tornando tal, mesmo na ausência de guerras e terrorismo. Com mais sucesso, a estratégia dos atentados pode facilmente tomar de mira os poucos recursos hídricos - e não apenas hídricas -, depois ameaçar e chantagear.
A outra praga associada é a escassez de alimentos. No ano passado, as chuvas foram abaixo da média, principalmente nas áreas rurais onde se concentra a produção de alimentos básicos como milho, milheto e arroz. O abandono das terras conquistadas pelo terrorismo privou os agricultores de uma colheita já provada pelos fatores ambientais.
Teme-se este ano uma grave carência alimentar - para não dizer uma catástrofe - no período intermediário entre o fim dos estoques do ano anterior e o início do produto deste ano. Para piorar, há a guerra na Ucrânia, que fez subir os preços mundiais dos cereais e dos transportes - e isso também, recordemos bem, mais por razões especulativas financeiras do que reais -, pelo que, para além de não poder contar com a produção nacional, há uma forte dificuldade de importação.
A Igreja não fica só olhando. A Caritas de Ouagadougou comprometeu quase 70% da angariação de fundos anual para estocar em previsão do pico de necessidade que se espera nos próximos meses. Nos últimos dias em nossa missão, graças a esses fundos, compramos uma tonelada de arroz para manter em estoque para atender às necessidades urgentes daqueles que baterem à porta.
Não esqueçamos que a escassez de alimentos é resultado da política e do mercado, para os quais as pessoas, em vez de cultivar milho ou arroz, têm preferido nos últimos anos cultivar algodão ou caju para exportação, em benefício do processamento industrial ocidental. Esta é, obviamente, uma política que não leva em conta a autossuficiência, cujas consequências são pagas a caro preço.
Nós, missionários, tentamos acionar mecanismos de mudança. Por exemplo, promovemos cursos de irrigação por gotejamento que usam menos água e exigem menos trabalho. Mas é preciso ressaltar que a primeira pobreza é aquela cultural: as pessoas muitas vezes frequentam o curso porque é subsidiado, eventualmente começam a testar a irrigação por gotejamento, mas assim que o controle e o monitoramento do projeto se afastam, retomam o antigo sistema de irrigação, porque, para eles, sempre funcionou.
É verdade, funcionava quando as chuvas eram mais equilibradas e a população era um quinto da atual! Esse raciocínio infelizmente é muito elaborado para ser compreendido pela maioria das pessoas sem um certo nível de educação.
Ruas de Ouagadougou (Foto: Syced | Wikimedia Commons)
Um problema aparentemente oposto, especialmente na cidade, é representado pelas inundações. Devido ao crescimento demográfico, os bairros despontam como cogumelos, habitados espontaneamente e não regulamentados, portanto, sem infraestruturas.
Como a estação seca dura de 6 a 8 meses, um bairro inteiro de barracos pode se desenvolver sem saber onde a água vai parar durante a estação chuvosa: quando ela chega, acontecem os alagamentos e as casas desmoronam por todo lado. Construções colocadas de forma irracional alteram o fluxo das águas e as chuvas - cada vez mais raras, mas também mais intensas - desafogam abrindo suas próprias estradas.
Os tijolos de barro conservam o ambiente mais fresco, mas na cidade, por causa das enchentes que mencionei, tornam a moradia precária, então as pessoas preferem usar o cimento que é mais seguro e mais fácil de trabalhar. Mas isso aumenta a cobertura de cimento e a impermeabilização do solo. E a água flui mais rápido. Além disso, o cimento vem de longe, do exterior, então aumentam os consumos de combustível para o transporte, com tudo o que isso acarreta no círculo vicioso.
Há também quem esteja tentando propor soluções feitas com materiais locais, mas é preciso estudo, paciência, dedicação, enquanto os resultados não são imediatos. As pessoas também pensam que essas são soluções para pobres, enquanto tudo o que fazem é sonhar sair da pobreza. Para eles, a casa de cimento é o símbolo da segurança econômica, assim como a motocicleta em relação à bicicleta ou o carro em relação à motocicleta.
Em Ouagadougou, Burkina Faso, o moto é o principal meio de transporte (Foto: Cheri Amarna | Wikimedia Commons)
Outra observação diz respeito à perda de biodiversidade. Algumas plantas estão desaparecendo ou diminuindo visivelmente, devido às mudanças climáticas, ao uso de pesticidas e fitofármacos mal dosados com a miragem dos ganhos fáceis: as plantas que fazem parte da medicina tradicional e que são úteis para os tratamentos também estão desaparecendo. As consequências das mudanças climáticas estão realmente sob nossos olhos. As soluções são muito menos evidentes e difíceis de aplicar: é um grande desafio!
Vou falar também da palha: existe um tipo de palha que é usada aqui para fazer telhados que mantêm o frescor dentro de casa, mas está cada vez mais difícil encontrá-la, justamente por conta das mudanças climáticas e da urbanização. Por isso, se recorre a outros materiais - chapa metálica ou plástica - que não são tão confortáveis e não são ambientalmente sustentáveis, alimentando novamente o círculo vicioso.
Concluo retomando meu pensamento. Por trás do problema das mudanças climáticas - assim como do terrorismo e da guerra - há uma mentalidade consumista-extrativista, uma vontade de domínio que é ainda mais forte do que aquele pouco de consciência adquirido sobre os danos que disso decorrem.
O nosso povo sofre muito com isso, mas não consegue perceber plenamente o que está em jogo e o quanto é necessário mudar de estilo de vida: por isso, ainda está à procura de soluções de desenvolvimento no modelo visto até agora, as mesmas que também são a causa de seus males.