07 Março 2022
"Como se pode ver, as semelhanças entre a Segunda Guerra Mundial e aquela que Putin gostaria de transformar na terceira são assustadoras. Assim como é assustador e parece um mau presságio, que Putin chame de 'nazista' um jovem presidente judeu eleito com 75% dos votos de cidadãos ucranianos", escreve o jornalista e ex-deputado italiano Furio Colombo, pelo Partido Democrático, em artigo publicado por Il Fatto Quotidiano, 06-03-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Eu vivi por anos uma longa guerra. Agora que volta, eu a reconheço. Aqui estão os sintomas. Primeiro, uma espera desorientadora e alarmante, em meio a fatos e discursos assustadoramente oscilantes. Então, um golpe de extrema violência é desencadeado em um ponto muito vulnerável do mundo para que haja, imediatamente e ao mesmo tempo, medo e sofrimento. Seguem-se reações apreensivas, agora como então. São as vozes da indignação, da condenação, do medo que também se torna mobilização improvisada sem saber para o quê (se você estiver do lado dos cidadãos). Fala-se de "pacificação", de ajudas para quem deve resistir, de armas para quem deve lutar. Chega a convocação quase repentina de um encontro de delegações dos dois lados, a quem, diz-se, está confiada a tarefa de evitar a guerra (que já começou, enquanto as delegações estão se reunindo). Melhor se, como em Munique, o encontro for convocado perto de quem ataca, para que a impressão seja de que quem já está sob fogo possa oferecer ao invés de obter.
Mas a semelhança entre a mesa de Munique, enquanto eclodia a Segunda Guerra Mundial, e o encontro de russos e ucranianos em torno da mesa na floresta bielorrussa é confirmada pela inutilidade do resultado. Ou melhor, da função de ter alcançado uma forma falsa e parcial e um acordo que por um momento alivia a tensão de quem está imediatamente exposto ao perigo e de quem teme que ele chegue.
Uma vez estabelecidas as condições preliminares, que descrevi a partir da verdade do que sei agora e do que me lembro de então, é claro que também desta vez a guerra já começou e que devemos tentar saber ou imaginar o que acontece em seguida, já que o mecanismo da guerra não prevê nenhuma possibilidade de voltar ao início, de refazer as cenas, como nos filmes.
Entretanto, porém, hoje como então, começa a segunda coluna de notícias, com a qual o agressor assegura para si um espaço-tempo de acusações difamatórias com três características: o acusador é irrefutável a menos que seja posto sob acusação (e a guerra confirma). O acusador não deve apresentar provas porque o nível de seu poder e sua autoridade militarizada devem bastar. O acusador tem razão porque a acusação que traz é a causa extrema e inevitável da guerra. E a guerra já está em andamento, com seus bombardeios e suas mortes que são autenticadas pelos próprios portadores da morte, muito ativos na construção de cenários, que não devem ser verdadeiros, mas críveis e acreditados.
A força frenética de atacar imediatamente e primeiro (que foi a força de Trump como de seus personagens, em vão contrastada pelos agredidos, como a invasão do Capitólio) dá seus terríveis frutos imediatamente. A voz dos agredidos dificilmente é ouvida diante dos gestos tresloucados recém realizados, assim como pouco foi ouvida, embora corajosa e única, a voz de Churchill que assumiu sozinho (como agora o presidente ucraniano Zelensky) a tarefa de refutar e negar as razões de uma guerra que já explodiu e falsamente impedida de se revelar imediatamente em suas verdadeiras e terríveis dimensões.
É importante atentar para a repetição frenética de Putin da palavra "nazista" como acusação e prova definitiva do motivo de bloquear um povo sob as bombas e da missão que lhe compete como dever democrático, de cortar a cabeça à "besta nazista". Há algo de elementar e infantil em fingir não conhecer a história de todos, a história de seu país, sua história, a história (completamente inventada) do que está acontecendo, a história do massacre da população civil, que é a maneira de Putin de governar e até mesmo a história pessoal de seu inimigo Zelensky.
O discurso furioso proferido em uma sala vazia por 45 minutos há poucos dias, imaginando até um minuto de silêncio de uma multidão inexistente em homenagem a um de seus heroicos oficiais, talvez, exceto o discurso de Trump para incitar o ataque ao Capitólio, não tem precedentes na história. Talvez nem mesmo Putin tenha precedentes na história. Ninguém, depois de Hitler, matou mais, da Chechênia arrasada em vingança após a vitória, ao tiro na cara de Anna Politkovskaya enquanto estava carregada de sacolas de compras em uma rua de Moscou, ao grupo de mulheres chechenas rebeldes em se fecharam no teatro Dubrovka em Moscou, e foram mortos com um gás nunca revelado junto com centenas de espectadores que deveriam ter sido reféns, à destruição sistemática de casas e pessoas (principalmente crianças) em todas as aldeias sírias. Ninguém mentiu mais.
Tudo é falso na narrativa de Putin, ninguém, no momento, tem dívidas mais assombrosas com a história. Como se pode ver, as semelhanças entre a Segunda Guerra Mundial e aquela que Putin gostaria de transformar na terceira são assustadoras. Assim como é assustador e parece um mau presságio, que Putin chame de "nazista" um jovem presidente judeu eleito com 75% dos votos de cidadãos ucranianos.
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Apenas Hitler somou mais mortes e mentiras do que Putin - Instituto Humanitas Unisinos - IHU