29 Junho 2021
"A última obra do filósofo Vito Mancuso, A proposito del senso della vita são páginas que tentam recontectar os fios do que parece perdido para sempre: o sentido do que cada um quer e pode ser, sua massa como ser humano, seus ideais, seus valores", escreve o vaticanista Paolo Rodari, em artigo publicado por la Repubblica, 27-06-2021. A tradução é de Luisa Rabolini.
Não sabemos mais quem somos e quem realmente queremos ser. Embora saibamos perfeitamente o que queremos ter: riqueza, poder, prazer. Nasceu dessa observação, tão brutal quanto fiel à verdade e que a pandemia Covid-19 tornou mais evidente, a última obra do filósofo Vito Mancuso, A proposito del senso della vita (Sobre o sentido da vida, em tradução livre, Garzanti), páginas que tentam recontectar os fios do que parece perdido para sempre: o sentido do que cada um quer e pode ser, sua massa como ser humano, seus ideais, seus valores. Muitas vezes, até mesmo nossos ilustres predecessores se identificaram encontrando inimigos para si, contrapondo-se a eles. Sócrates determinou sua identidade contra os sofistas e os filósofos da natureza. Jesus contra as autoridades religiosas e políticas de seu tempo.
E, ainda hoje, a grande maioria das pessoas se define com base nisso e por quem não é e não quer ser. Ou, melhor ainda, com base em quem é seu inimigo. Por isso vivemos cada vez mais dissociados, incapazes de coletividade, indivíduos separados e sem possibilidade, explica Mancuso, de "formar uma sociedade". Deus está morto há muito tempo. E continua faltando uma ideia mãe que harmonize entre si as nossas liberdades e doe harmonia à vida interior de cada um. A solução, porém, explica Mancuso, não deve ser buscada fora de si, mas dentro de si mesmo. Esta é uma das grandes revoluções do seu pensamento tão profundo e ao mesmo tempo límpido, este é o motor de A proposito del senso della vita: é em nós que vive, ainda que às vezes enterrada, a possibilidade de ser e de gerar vida autêntica. O sentido da vida está em nós e não fora de nós. Agora podemos escolher se ser só e apenas contra alguém, ou se abraçar a harmonia entre nós, aquela harmonia baseada no que somos, ou seja, sobre a nossa própria natureza humana.
O sentido da vida não é algo que vem de cima, uma verdade a ser aceita sem discussão. Pelo contrário, é uma “construção” que cada um pode decidir fazer ou não: é como um caminho a percorrer, pode-se trilhá-lo se quiser, ninguém nos obriga a fazê-lo. E que a construção seja o caminho o testemunham muitos pensamentos, entre eles aquele do jesuíta Teilhard de Chardin para quem “o mundo representa uma obra de conquista atualmente em curso”. O mundo, e portanto também a nossa vida, é um imenso andar às cegas, "uma imensa busca": os seus progressos só podem ser feitos "à custa de muitos fracassos e de muitas feridas". Por isso, a vida, com seu mal inevitável, deve ser consertada, tornada melhor e, portanto, não "justificada". Dar sentido a ela, tentar lhe dar sentido, é uma escolha pessoal.
Não há sentido sem consentimento, insiste Mancuso. É por isso que cada um de nós é o artífice ou o intérprete final do sentido que decide dar à sua existência. Mas isso não é tudo. A vida como tal é relação. O sentido da vida é sinergia, explica Mancuso. O termo é retomado de Marco Aurélio. Para Mancuso, significa que existe uma ligação entre as diferentes formas de vida: tudo é relação. E aqui reside a ligação entre as duas teses básicas do seu livro: “Sentir é sempre con-sentir, sentir com, sentimos aquilo com que estamos ligados”. Se é verdade que cada um deve decidir seu próprio sentido, é igualmente verdade que ele reside na relação, no equilíbrio harmonioso entre as prerrogativas individuais e a perspectiva relacional. A onipotência egótica, portanto, não pode ser o caminho.
O caminho, no máximo, são os pequenos gestos cotidianos para se redescobrir na relação e ao mesmo tempo necessitados de sentido. Quais? Cada um pode encontrar os seus. Mancuso lista vários.
Entre eles, cuidar da beleza do mundo, limpar, arrumar, ordenar, reorganizar. Lembrar-se que mesmo um único pedaço de papel jogado no chão diminui a beleza do mundo e suja a própria interioridade. Cuidar da beleza física, não para o olhar alheio, mas para celebrar o próprio existir. Amar a natureza, buscá-la incansavelmente. Amar o Espírito, invocá-lo incansavelmente. O Espírito, que é senhor e dá a vida, também vivifica a beleza. E, finalmente, agradecer. Agradecer à vida. Agradecer a Deus, à Deusa ou ao Divino. Agradecer ao mistério.
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O mistério da vida é redescobrir a beleza - Instituto Humanitas Unisinos - IHU