25 Abril 2024
"Na Assembleia do Sínodo dos Bispos surgiram diferentes maneiras de ver a realidade, mas sempre a partir de um imenso amor à Igreja", comenta Dom Luis Marín, em entrevista de Luis Miguel Modino.
O Sínodo sobre a Sinodalidade está preparando a segunda sessão da Assembleia Sinodal, prevista para os dias 2 a 27 de outubro de 2024, dando continuidade ao trabalho realizado em outubro de 2023. O subsecretário do Sínodo dos Bispos, Dom Luis Marín de San Martín, explica nesta entrevista os passos que estão sendo dados no processo sinodal.
Papa Francisco decidiu que o atual Sínodo teria uma assembleia em duas sessões, e estamos no período intermediário entre uma sessão e outra. Como está sendo vivenciado esse tempo e quais são os passos que estão sendo impulsionados pela Secretaria do Sínodo?
Este é um momento de envolvimento, compromisso e participação, seguindo a mesma linha do processo sinodal. Entre a primeira sessão da Assembleia do Sínodo dos Bispos em outubro de 2023 e a segunda sessão prevista para outubro de 2024, a Secretaria do Sínodo está coordenando a ligação entre as duas sessões. Destacamos três fontes principais: trabalho nas conferências episcopais, grupos de estudo e comissões de canonistas e teólogos, bem como encontros de párocos.
Em primeiro lugar, temos o Relatório de Síntese como material de trabalho, o qual oferece muitas ideias para continuar desenvolvendo a eclesiologia sinodal e implementando-a na vida, estilo e missão da Igreja. Aguardamos o discernimento coordenado pelas conferências episcopais sobre como ser uma Igreja sinodal em missão, tema no qual já estão trabalhando localmente e cujos resultados nos serão enviados antes de 15 de maio.
Em segundo lugar, o Papa decidiu criar grupos de estudo sobre 10 temas, derivados do trabalho da Assembleia do Sínodo dos Bispos. São temas importantes que exigem uma grande profundidade teológica e serenidade em seu desenvolvimento, impossíveis de serem realizados no curto espaço de tempo da segunda sessão: relações entre igrejas orientais católicas e a Igreja latina; a voz dos pobres; ambiente digital; formação sacerdotal sob uma perspectiva sinodal missionária; formas específicas de ministério; relações entre bispos e vida consagrada; alguns aspectos da figura e do ministério episcopal; papel dos representantes pontifícios; critérios teológicos e metodologias sinodais para um discernimento compartilhado; e caminho ecumênico.
Esses temas serão trabalhados em grupos formados em colaboração com vários dicastérios da Cúria Romana. Isso representa uma forma concreta de desenvolver a sinodalidade na Cúria Romana, alinhada com o que foi estabelecido na constituição Predicate Evangelium. Embora esse trabalho conjunto entre especialistas de diferentes dicastérios tenha um desenvolvimento amplo e prolongado, certamente será informado ao Sínodo dos Bispos.
O Papa também criou cinco comissões de teólogos e canonistas para aprofundar no tema solicitado às conferências episcopais: como ser uma Igreja sinodal em missão. Será abordado sob três perspectivas: Igreja local, agrupamentos de Igrejas e Igreja universal. Além disso, duas outras perspectivas serão adicionadas: o método sinodal e o "lugar" da Igreja sinodal em missão.
Por fim, será realizado um importante encontro de párocos enviados pelas conferências episcopais. Ele acontecerá em Sacrofano de 29 de abril a 2 de maio. O objetivo é ouvir suas reflexões e conhecer suas experiências sobre como ser uma Igreja sinodal em missão, com foco em três aspectos específicos: compreensão da sinodalidade na vida da diocese; participação dos diferentes carismas na vida da paróquia e da diocese; dinâmicas de discernimento e organismos de participação.
Com as contribuições dessas três fontes (conferências episcopais, cinco comissões de canonistas e teólogos, e encontro de párocos), redigiremos o segundo Instrumentum laboris. Além disso, estamos preparando o que será a segunda sessão da Assembleia do Sínodo (programação, etc.), que começará com dois dias de retiro espiritual.
O senhor fala da Igreja sinodal em missão, um desejo do Papa Francisco. Quais são os desafios enfrentados hoje para concretizar esse modo de ser Igreja?
A Igreja sinodal não é outra coisa senão a Igreja de Jesus Cristo. Devemos retornar à beleza do Evangelho, com sua radicalidade e exigência, mostrando a alternativa que ele oferece em relação aos critérios do mundo. Mas não através do isolamento, da autorreferencialidade e da busca por seguranças. E muito menos através da agressividade e do confronto. Não se trata de trincheiras, mas de família. É a Igreja das mãos estendidas e dos braços abertos, acolhedora, lar comum, inclusiva e misericordiosa, dinâmica e em saída, comunicando o entusiasmo do Evangelho no qual acredita e pelo qual vive. É a Igreja coerente que testemunha e leva a Boa Nova a todos os cantos do mundo. Podemos dizer que o objetivo final do processo sinodal é a missão, a evangelização. Em última análise, acredito que a sinodalidade é fundamentalmente uma experiência de Igreja, ou seja, uma experiência de comunhão com Cristo e, por meio dele, de comunhão com os irmãos e irmãs. Somente assim nos sentiremos impelidos a comunicar o Evangelho ao nosso mundo. E somente assim seremos críveis.
Para isso, a aposta não é outra senão experimentar o Cristo ressuscitado (estamos no tempo pascal), ou seja, o Cristo vivo, unido à sua Igreja. Cristo não é apenas uma referência acadêmica em um livro, nem um slogan, uma norma jurídica ou uma bandeira ideológica. Ele é uma pessoa viva. Essa experiência do Cristo vivo nos leva também à experiência da Igreja, da comunhão, da comunidade cristã unida pelo amor. Este é o desafio do processo sinodal, que nos convida a ouvir a voz do Espírito e também a discernir os sinais dos tempos, não de uma perspectiva monolítica e indiferenciada, mas da riqueza que a Igreja nos dá ao encarnar-se na diversidade de culturas e situações do mundo atual.
Como ajudar as pessoas a entenderem que o objetivo deste Sínodo não é responder a questões específicas, mas avançar nesse modo de ser Igreja proposto pelo Papa?
Primeiro, é preciso entender bem o que é a sinodalidade. O termo já é conhecido, mas talvez ainda existam algumas confusões e equívocos que precisam ser esclarecidos. Devemos ter claro que a sinodalidade é uma dimensão constitutiva da Igreja, assim como a comunhão ou a missão. E trata-se de um processo, que se concretiza em eventos e estruturas (como o Sínodo dos Bispos, o Sínodo diocesano, os conselhos pastorais, econômicos, etc.). Mas, acima de tudo, é uma experiência. Não se trata apenas de falar sobre sinodalidade, mas de vivê-la, de fazê-la permear toda a Igreja e tudo o que a constitui como Igreja. Deve tornar-se um estilo, uma forma de ser e de agir. Para concretizar a reforma, evitando a teorização e o espiritualismo, é preciso tomar decisões e desenvolver estruturas que a tornem viável. É preciso dar passos.
Peço a todos que não tenham medo: não temam Cristo, nem o Evangelho, não desconfiem do Espírito. A sinodalidade deve nos levar à radicalidade no compromisso, à vanguarda. Seguir a Cristo é sempre um risco. Assim como é a vida. Também nos leva a fortalecer a comunhão, que é a única maneira coerente de viver a fé cristã, que nos leva à participação em Cristo ressuscitado. É hora de abandonar as zonas de conforto, a acomodação, o mundanismo, sacudir as rotinas, os modos obsoletos e falsos, para nos abrirmos à vivência forte e alegre da fé, que, obviamente, nos compromete, mas que dá sentido à nossa existência.
Embora a sinodalidade seja um processo de longo prazo, devemos dar passos concretos através da abertura ao discernimento, ouvindo a voz do Espírito no Povo de Deus. Portanto, disponibilidade à vontade de Deus, inserção na Igreja e abertura ao Espírito. O que o Papa nos pede é que despertemos, recuperemos a alegria do Evangelho e, a partir disso, assumamos nossa responsabilidade e saiamos para testemunhar, evangelizar como Igreja. Vale a pena. Está em jogo nossa coerência, nossa responsabilidade como cristãos no mundo de hoje, e está também em jogo nosso testemunho vocacional tanto à fé cristã quanto às vocações específicas. Sigamos em frente neste processo que iniciamos e que nos remete ao Cristo vivo, ao Cristo ressuscitado e à experiência eclesial no mundo. É muito concreto.
A primeira sessão da Assembleia Sinodal mostrou a riqueza da diversidade, mas ao mesmo tempo diferentes maneiras de entender a Igreja. Nessa diversidade, que o Papa insiste ser uma riqueza, é difícil superar as divergências e avançar no caminho sinodal?
Na Igreja, assim como na família, há diferenças, diferentes maneiras não apenas de ver a realidade, mas também de seguir a Cristo e de encarnar e desenvolver o Evangelho. No entanto, o amor (caridade) deve sempre prevalecer, sendo o elo de união e o que nos caracteriza como cristãos. Nada mais. Às vezes, esquecemos a centralidade do amor: sem ele, não há Igreja. Portanto, primeiro a unidade, sem a qual não é possível compreender nem aceitar a diversidade. Mas a unidade não é uniformidade indiferenciada. O amor respeita as diferenças e as integra como riqueza. Existem diferenças de personalidade (cada pessoa é única e irrepetível); há variedade de vocações, carismas e ministérios; temos diversidades culturais e de formação. Como bem lembrado, a Igreja não é apenas latina-ocidental. Ela tem vários rostos. O desafio é integrar, a partir da unidade, as variedades para enriquecer toda a Igreja. A experiência na Assembleia do Sínodo dos Bispos tem seguido essa linha, embora ainda precisemos continuar avançando.
Na Assembleia do Sínodo dos Bispos surgiram diferentes maneiras de ver a realidade, mas sempre a partir de um imenso amor à Igreja. Acredito que não se trata de uma confrontação entre grupos ideológicos, mas sim de ouvir o Espírito, discernindo juntos a vontade de Deus, buscando sempre o bem da Igreja. Isso é o que, humildemente, tento fazer eu e também muitos irmãos e irmãs. É a experiência que tive nos trabalhos da Assembleia do Sínodo dos Bispos: fundamentalmente, um profundo e enorme amor à Igreja. É algo que agradeço do fundo do coração porque tem me ajudado muito.
Que resultados são esperados da segunda sessão?
Devemos lembrar que o Sínodo dos Bispos não tem poder de decisão, não é deliberativo, mas consultivo; apenas pode fazer propostas ao Santo Padre. Portanto, não se trata de um pequeno parlamento que legisla e toma decisões para toda a Igreja, utilizando o voto para impor alguns critérios sobre outros, como é feito no debate político. Não é isso. Já disse que sem oração e sem Espírito Santo, não há Sínodo, porque não haverá discernimento da vontade de Deus, mas confronto ideológico. Isso também não significa que estamos buscando manobras políticas ou acordos típicos de um grupo desanimado e sem vida.
Pelo contrário, trata-se de recuperar a dimensão profética: nos colocar verdadeiramente nas mãos do Senhor, ouvir o Espírito (que fala na comunhão eclesial) e nos deixar guiar por ele. O profeta fala a verdade clara e direta porque está em contato com Deus; anuncia e denuncia, mas não "de cima para baixo" ou "de fora para dentro", mas "de dentro para fora"; não é um profeta de desgraças, mas testemunha a alegria da salvação e, por isso, é gerador de esperança. Por que não? Já chega de divisões na Igreja, de nos desgastarmos em agressões e confrontos, enquanto o mundo precisa urgentemente de Cristo. Não é a ideologia, mas o Evangelho; não são grupos organizados de pressão, mas a comunidade do Espírito; não é o parlamento, mas a família. Esta é a verdadeira revolução. Tomara que sejamos capazes de aproveitar a oportunidade que o Senhor nos oferece.
Outro ponto a ter claro é o tema estabelecido pelo Papa Francisco para esta Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos: "Por uma Igreja sinodal, comunhão, participação e missão". Outros temas, por mais relevantes e importantes que sejam, não são objeto do Sínodo e deverão ser abordados em outro momento ou por meio de outras estruturas sinodais. Após o discernimento, serão feitas propostas concretas ao Santo Padre, para que ele tome as decisões. Se não houver consenso, também podem ser apresentadas opções complementares. Ou então continuar o discernimento. Mas é preciso avançar em comunhão, conscientes de que o Espírito Santo costuma surpreender as previsões. Assim, a Igreja aprofunda no dado revelado para comunicá-lo na vida. Tenho muita confiança e acredito que, embora não seja fácil, vale a pena se dedicar a isso com empenho.
Depois do que foi vivido na primeira sessão, como alguém que faz parte da Secretaria do Sínodo, o que eu pediria aos membros da Assembleia para a segunda sessão?
O primeiro ponto é o que o Santo Padre nos disse: precisamos ouvir o Espírito Santo, porque o Sínodo é fundamentalmente um evento espiritual. Se não for assim, não funciona. Por isso, devemos ir com a mente aberta e o coração pronto para mudanças. Não para impor nossas próprias ideias, nem para convencer os outros a seguir o nosso caminho, mas sim para estar disponíveis à renovação que o Espírito nos traz, através da oração e do discernimento. Em comunhão, podemos descobrir novos caminhos, outras maneiras de tornar realidade o que o Senhor quer para sua Igreja hoje.
Também diria que precisamos estar atentos aos sinais dos tempos de hoje e não ter medo de dar passos adiante, de desenvolver aquilo que pode e deve ser desenvolvido, mantendo-nos firmes no depósito da fé, que não muda. Devemos também permitir, de maneira mais clara, a entrada dessa variedade de sensibilidades, culturas e realidades na Igreja, pois isso constitui uma grande riqueza. A partir da unidade fundamental, talvez possam surgir desenvolvimentos e decisões diferentes em um continente ou outro, como já acontece na liturgia. Não se trata de seguir modismos, mas de respeitar as idiossincrasias.
Por último, encorajo a viver este momento como um verdadeiro Kairós. É impressionante. Estamos diante de um tempo de Deus, cheio de beleza e criatividade. Acredito que não podemos deixar de nos entusiasmar se realmente deixarmos de lado nossos medos, barreiras, cansaços e rotinas. Assim, devemos ir para esta segunda sessão: sabendo que fomos convocados pelo Espírito e que o Senhor está presente para renovar sua Igreja. Por isso, nossa missão fundamental no Sínodo é ser um canal da graça e não um obstáculo; facilitar e não bloquear. Dessa forma, tornamos possível a presença do Senhor neste momento da história. O desafio é ser Evangelho hoje.
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“A sinodalidade deve nos levar ao compromisso radical, à vanguarda”. Entrevista com Luis Marín de San Martín - Instituto Humanitas Unisinos - IHU