21 Março 2024
A entrevista é da Conferência Episcopal do Chile, publicada por Religión Digital, 20-03-2024.
Luis Marín de San Martín nasceu em Madri em 1961. É membro da Ordem de Santo Agostinho, formado em Teologia Espiritual e doutor em Teologia pela Pontifícia Universidade Comillas. Sua tese tratou da eclesiologia de São João XXIII, aquele que abriu as janelas para que o Espírito entrasse na Igreja e soprasse fortemente no Concílio Vaticano II. Foi pároco, conselheiro, guia de retiros espirituais, formador, arquivista, e teve uma proximidade especial com os leigos no trabalho pastoral, entre as suas muitas tarefas em Roma.
O que significa uma Igreja em estilo sinodal? Por que o Papa Francisco optou pela sinodalidade?
A Igreja no estilo sinodal significa uma Igreja estilo de Jesus Cristo. O único que existe, o único verdadeiro. O Papa Francisco não inventou nada. O que ele fez foi recuperar e valorizar uma dimensão essencial da Igreja, já presente nas comunidades primitivas. Convido-vos a ler os Atos dos Apóstolos, especialmente 4,32-35 (a comunidade dos crentes); 10,1-18 (Pedro e Cornélio); 15,5-35 (Concílio de Jerusalém).
Caminhar juntos, comunhão no caminho, pertence ao ser da Igreja e deve manifestar-se na ação e no estilo. Refere-se à incorporação em Cristo e, portanto, à comunhão com todos os irmãos e irmãs, em unidade pluriforme; ao caráter dinâmico da experiência de fé; ao envolvimento de cada um, segundo a vocação e o chamado particulares; ao impulso evangelizador.
O Papa Francisco escolheu a sinodalidade porque, como disse claramente: “o caminho da sinodalidade é o caminho que Deus espera da Igreja do terceiro milênio”. É uma possibilidade de renovação profunda, de reforma, segundo o modelo que é Cristo. Não se trata antes de mais de uma questão administrativa, nem de estruturas, nem mesmo de atividade pastoral, mas de coerência. Trata-se de abrir-nos ao Espírito, que nos une a Cristo, nos constitui Igreja e nos torna testemunhas da Boa Nova. Estamos diante de uma oportunidade impressionante, de um momento de graça.
Numa Igreja ferida por notícias de abusos, acobertamentos e negligência, como convidamos o povo de Deus a confiar nela e a participar?
A questão do abuso, além de ser um ato criminoso, nos faz ver a terrível realidade do pecado na Igreja. É necessário, à luz de Cristo, encará-lo, assumi-lo, desenvolver processos de purificação e cura, com tudo o que eles implicam. Não podemos limitar-nos a dados frios ou a meras crônicas: referem-se a pessoas vulneráveis, a seres humanos específicos. É um escândalo terrível que os pastores se transformem em lobos. Penso que devemos interrogar-nos também sobre as causas, para que seja possível limpar a fonte pútrida que deu origem ao horror. A este respeito, parece-me que estão a ser dados passos firmes.
O processo sinodal desenvolve-se num contexto específico, num momento histórico específico, também com as suas sombras e a sua realidade de pecado. Está orientado para a autenticidade e a coerência, para que a Igreja seja como deve ser. Fomos chamados por Cristo e devemos honrar a vocação cristã. Certamente toda esta questão envolve abuso de poder, distorção de autoridade e pecado. Isso causa consequências verdadeiramente trágicas e destrutivas. No processo de reforma todos somos necessários e isso exige o envolvimento de todos.
Que progressos e/ou realizações o Sínodo teve até agora?
É um processo com velocidades diferentes, mas, depois da fase diocesana e iniciando a etapa continental, já se percebem luzes evidentes.
Em primeiro lugar, tudo o que se refere à realidade sinodal da Igreja foi grandemente esclarecido. Não só no que diz respeito ao termo “sínodo”, que antes se referia exclusivamente à assembleia do sínodo dos bispos, ou “sinodalidade”, palavra desconhecida e até difícil de pronunciar. Hoje é amplamente sabido que “sínodo” significa “caminhar juntos” ou “comunhão no caminho”. E isso pertence à Igreja: toda a Igreja é sinodal.
Em segundo lugar, percebe-se que a sinodalidade não é teórica, mas envolve a vida e nos abre a um processo de renovação profunda em todos os níveis. Isto se concretiza, entre outros aspectos, na necessária participação de todos os batizados na vida da Igreja. Começamos a compreender que nenhum cristão deve ser um mero espectador na Igreja, mas sim um protagonista, e que diferentes vocações apresentam diferentes formas de seguir a Cristo, baseadas na igualdade básica como cristãos.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Luis Marín de San Martín, subsecretário geral do Sínodo: “É um escândalo terrível que os pastores se transformem em lobos” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU