28 Fevereiro 2025
"É realmente uma beleza ouvir a palavra recuperar sua força espiritual, ser flexionada para aquela que é sua própria vocação: espírito de Deus, vento fortíssimo, fogo que acende a alma do sonho de um mundo justo, fraterno, sem o muro da inimizade", escreve Rosanna Virgili, professora do Instituto Teologico Marchigiano, vinculado à Pontifícia Universidade Lateranense, em artigo publicado por Vita Pastorale, março de 2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Os Estados Unidos são um país surpreendente e, talvez, seja precisamente por essa peculiaridade que, no dia seguinte à sua posse como presidente, Donald Trump participou de uma oração nacional na Catedral de Washington. E, diante de toda a família reunida do presidente, se apresentou a bispa Mariann Edgar Budde para seu sermão. O vídeo desse evento deu a volta ao mundo e permite que qualquer um entenda os sentimentos que afloravam no rosto do novo presidente diante das palavras da bispa que faziam referência ao famoso “Sermão da Montanha” e às bem-aventuranças dos pobres, dos mansos, dos misericordiosos e daqueles que atuam pela paz (cf. Mt 5,1ss). Uma ética completamente estranha ao Presidente que, reconhecidamente, não se preocupa muito com a bem-aventurança dos pobres, uma vez que ele mesmo promove e vive totalmente à vontade a “bem-aventurança” dos homens mais ricos do mundo; que não deve acreditar de forma alguma que sua felicidade possa coincidir com a dos mansos - os não-violentos - pelo menos de acordo com o que emerge tanto do tom quanto da substância de seus discursos, nos quais promete e trava batalha contra todos os seus oponentes com a violência do poder e da chantagem econômica.
E a bispa de Washington, com rigor religioso e honestidade evangélica, ou seja, a parrésia dos apóstolos no livro de Atos, explicou ao presidente e a todo o povo estadunidense que a “rocha sólida” evangélica sobre a qual poderá construir o bem comum é a liberdade e a dignidade de todos em uma sociedade coesa, unida e solidária é realmente inconcebível para um Trump que começa seu mandato deportando imigrantes mexicanos do país, com planos de até mesmo deportar dois milhões de palestinos de Gaza, onde planeja construir resorts para o conforto de idosos bilionários estadunidenses.
A bispa Edgar Budde, com admirável franqueza e coragem, não tem medo de insistir e vai fundo: “A unidade às vezes é sacrificial, da mesma forma que o amor é sacrificial, uma doação de nós mesmos para o bem de todos. Jesus de Nazaré, em seu Sermão da Montanha, nos exorta a amar não apenas os nossos vizinhos, mas também os nossos inimigos, e a rezar por aqueles que nos perseguem; a ser misericordiosos, como nosso Deus é misericordioso, e a perdoar os outros, como Deus nos perdoa. Jesus se desdobrou para acolher aqueles que sua sociedade considerava párias”.
É realmente uma beleza ouvir a palavra recuperar sua força espiritual, ser flexionada para aquela que é sua própria vocação: espírito de Deus, vento fortíssimo, fogo que acende a alma do sonho de um mundo justo, fraterno, sem o muro da inimizade. A Palavra que readquire sua urgência e seu poder profético para impulsionar e levar aqueles que têm o papel - ainda que passageiro - de realizar as esperanças de um país inteiro a entender que: “para alguns, a perda de sua esperança e de seus sonhos será muito mais do que uma derrota política, mas sim uma perda de igualdade, dignidade e sustento”.
Obrigado, portanto, à Sra. Budde, que reclamou também para nós, católicos, um jubileu: uma boa proclamação para os pobres, libertação para os prisioneiros, liberdade para os oprimidos. Porque os pobres e oprimidos não podem esperar até o próximo governo para ter sua parte no mundo. É por isso que, juntamente com a Bispa Budde, as mulheres católicas não devem ter medo de “gritar” o Evangelho sobre os telhados dos governos europeus que ignoram cada palavra dele, esquecendo a mais nobre memória política e ética de nosso continente.
Juntamente com todos os cristãos dos Estados Unidos, que nossas comunidades católicas também assumam a parresia evangélica. Porque, como disse a Bispa Budde: “Temos razão para rezar a Deus enquanto buscamos a unidade, porque precisamos da ajuda de Deus, mas somente se nós mesmos estivermos dispostos a cuidar dos fundamentos dos quais depende a unidade”.