12 Novembro 2020
Vittorino Andreoli diz o que pensa e pensa o que diz. Uma raridade. Ele acha cada vez mais difícil distinguir entre loucos e não loucos: vê os normais fazendo coisas de loucos e os loucos fazendo coisas extraordinárias. Do jeito que está, este mundo não lhe agrada. Está ficando cada vez mais difícil. Poluído pelas palavras. Feito por gente que foge diante da responsabilidade. Como psiquiatra, ele vê avançar uma nova patologia: a incoerência. Aqueles que dizem tudo e o contrário de tudo. Existe um egoísmo generalizado, um abuso do "eu". Dá vontade de fugir, ele admite. Procurar o silêncio das pedras, contra o ruído inútil das banalidades. Mas não podemos fugir, ele explica. Seria covardia. Nós fazemos a sociedade. Quem vê certos perigos tem o dever de alertar sobre os riscos que se correm.
E aqui estamos nós, então. Depois da clínica, da pesquisa, dos ensaios científicos, das dezenas de livros e das centenas de conferências, Andreoli se propôs este objetivo: ajudar os outros, ser útil, transmitir sua ideia de homem na dificuldade de existir e viver neste tempo, um tempo doente, tornado dramático pela pandemia.
“Estamos num estado confusional”, admite. Diante de um grande psiquiatra logo ficamos com vontade de lhe perguntar em que podemos nos agarrar.
“Quase todos os pontos de segurança foram perdidos ...” é a primeira resposta.
Mas Andreoli é um pessimista ativo. “Não gosto de pessoas que dizem que não há mais nada a fazer. Hoje há muito o que fazer”.
Então ele voltou à estrada para reorganizar seus pensamentos e criar um alfabeto de bolso para a vida. Em quinze etapas, ele explora os sentimentos humanos, fala sobre a vida, nos faz entender quem somos. O homem não é um cabaré, um objeto do showbiz. "Somos pessoas que precisam de outras pessoas." Laços e afetos são o que contam, não a superficialidade.
“Hoje gostaria de poder ajudar as pessoas a viver melhor, a juntar os pontos que constituem uma existência. Tento acender algumas luzes para enxergar no escuro”.
A entrevista com Vittorino Andreoli é de Gian Giacomo Schiavi, publicada por Corriere della Sera, 11-11-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
No escuro, existe o medo. Por que você começou disso, professor Andreoli?
Esta é a sociedade do medo. Nossos dias hoje são cadenciados pelo medo e o medo gera violência, nos paralisa. E mesmo assim ...
E mesmo assim...
E mesmo assim, sem medo, não haveria a coragem. Veja, o medo é um elemento estrutural da existência. O herói também sente medo. Mas o supera pelo bem dos outros.
Qual é o medo que mais assusta?
Neste momento, a solidão.
E como se contrasta?
Com a proximidade, com o outro, com o conjunto. O homem assustado precisa de alguém que o escute, de uma voz, alguém em quem possa confiar. Juntos, a vida é mais humana.
Quem alimenta o medo?
Hoje não há dúvida, o Covid. Mas o que preocupa é a política que vive do medo dos homens. Fez dela o seu negócio.
Muitos egoísmos e individualismos ...
Existe um narcisismo exasperado.
Quando o medo se transforma em perigo?
Quando ultrapassa uma determinada intensidade e vira angústia, pânico.
Em vez disso, o que é a ansiedade?
A ansiedade surge como condição para melhor enfrentar novas situações, é um ativador de energias. Como, por exemplo, a ansiedade do aluno antes de uma prova.
E quanto à raiva?
É um impulso, é a violência dentro de nós que tende a sair.
Hoje há tanta raiva ...
Hoje vivemos mal. Por isso, acumulamos raiva, mal-estar, frustração. Existe uma raiva interna que precisa ser gerenciada. Quando sai por acumulação, produz violência.
Dicas para viver com menos raiva e menos medo?
Devemos partir do homem que deve ajudar o homem.
E redescobrir a alegria de viver ...
A alegria é um sentimento belíssimo. Todo mundo fala sobre felicidade, mas a felicidade diz respeito ao eu. A alegria é um sentimento compartilhado, diz respeito ao nós.
Você elogia o valor do perdão.
O perdão nos toca profundamente. Traz consigo a humildade, que não é modéstia, é a grandeza de São Francisco. O perdão é para-doar. Assim o significado fica ainda mais claro.
Existe um sentimento para relançar?
A paixão. A paixão é o que dá cor à nossa vida.
Você a combina com a vontade.
A vontade é um ato de energia, mostra o desejo que você tem de continuar: serve para superar um obstáculo, para enfrentar desafios impossíveis.
Os sentimentos se desgastam com muita facilidade hoje, como a sola dos sapatos, você escreveu. Vivemos de emoções. Mas qual é a diferença entre sentimento e emoção?
O sentimento é um vínculo. As emoções dizem respeito aos sentidos, a fisicalidade. O computador e a TV transmitem emoção, não sentimento. Os sentimentos são duradouros e nos unem uns aos outros.
Você considera que certas definições dadas aos sentimentos, como fragilidade, estão erradas.
A fragilidade indica que você precisa do outro. Mas não é uma fraqueza.
Como no amor, você escreve.
O amor é a combinação de duas fragilidades.
Um sentimento belíssimo.
Amor é vida, é relação e significa: sem você eu não posso viver. Assim, vivem duas pessoas que se amam. O amor é um sentimento essencial: do pai pelo filho, do irmão pelo irmão, do avô pelo neto ...
O que é o desejo?
É a capacidade que cada um de nós tem de se considerar diferente do que é hoje. Mas a sociedade matou o desejo.
Como?
Virou spot comercial: você comprou isso? E esse outro? O desejo reduzido a objeto é outra coisa. Em vez disso, é aspiração, uma meta a ser alcançada, um passo à frente. Mas para isso você tem que se empenhar ...
O que você vê no fim do túnel?
Que a vida se expressa vivendo nos outros. Temos que construir a era do “nós”.
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Nos dias do medo vamos construir a era do “nós”. Entrevista com Vittorino Andreoli, psiquiatra - Instituto Humanitas Unisinos - IHU