28 Agosto 2020
“Restituir as estratégias de desenvolvimento através de uma maior permissão para introduzir proteção quando for necessário, tanto para a regulação do investimento estrangeiro como para a troca comercial”, é o caminho que deveria ser adotado globalmente para evitar o rompimento do contrato social, afirmou o renomado economista Dani Rodrik.
A reportagem é de Javier Lewkowicz, publicada por Página/12, 24-08-2020. A tradução é do Cepat.
Rodrik é um dos economistas mais influentes do mundo. De origem turca, é professor de Política Econômica Internacional na Escola John F. Kennedy, da Universidade de Harvard, e tem uma posição muito crítica a respeito da direção que o capitalismo tomou desde o início dos anos 1990. “Não gerou mais consumo, nem diversificação, mas crises mais frequentes e mais dolorosas. A globalização das finanças não significa nada de bom em termos das coisas que mais importam”, apontou em uma palestra organizada pela Universidade Torcuato Di Tella [Buenos Aires], que teve como moderador Eduardo Levy-Yeyati, decano da Escola de Governo daquele centro de estudos.
Embora Rodrik seja muito crítico em relação ao que chama de “hiperglobalização”, também alerta que a solução não é reaplicar as políticas clássicas do Estado do Bem-Estar. Em vez disso, afirma que o desafio é mais complexo, uma vez que o futuro do emprego não residiria na indústria, mas nos serviços e considera que o Estado deve não só garantir educação, saúde e renda mínima, mas também envolver-se com o setor privado na geração de conhecimento e empregos para evitar o "dualismo produtivo", um dos grandes problemas de economias como a da Argentina.
O dualismo é dado por um nicho muito produtivo que gera poucos empregos e um grande número de setores pouco produtivos que empregam muitas pessoas.
Para Rodrik, a crise da pandemia do coronavírus aprofundou tendências pré-existentes que vinham colocando em xeque a sustentabilidade da atual organização da economia mundial.
Em primeiro lugar, está a queda do comércio mundial, que não começou com o coronavírus, mas há mais de dez anos, após a eclosão da crise financeira em 2008. “Isso rompe com a tendência iniciada no início dos anos 1990, de crescente integração comercial. A retração é explicada, em primeiro lugar, pela queda dramática nas exportações chinesas em relação ao seu Produto Interno Bruto, de 35%, em 2007, para 20%, na atualidade. Algo similar ao que acontece na Índia”, explicou Rodrik.
O economista destacou ainda a “crescente tensão entre os supostos benefícios da hiperespecialização produtiva e a diversificação”. A especialização radica em que cada país do mundo ocupa um papel na cadeia de valor de acordo com sua maior vantagem comparativa (baixos salários, tecnologia e recursos naturais, por exemplo), enquanto a diversificação implica proteção comercial para que o aparelho produtivo nacional amplie o alcance das atividades que abarca.
Acontece que o neoliberalismo extremo e suas instituições globais como a OMC e o FMI enfatizam o suposto benefício da especialização em detrimento da política de proteção comercial e demais medidas regulatórias. Mas é claro que o capitalismo globalizado em sua organização atual gera crescentes desigualdades e exclusão social, considera Rodrik.
Ligado ao anterior, está a tendência de deterioração na distribuição de renda, que também é anterior à pandemia. “Está ficando cada vez mais claro que é impossível compensar os perdedores com os ganhos da hiperglobalização”, diz Rodrik.
“O maior problema é a falta de autonomia dos países para poder aplicar políticas voltadas à manutenção do contrato social e apontar ao crescimento”, explica o economista, e alerta que essa falta de graus de liberdade para as políticas públicas é uma das grandes diferenças em relação ao período de Bretton Woods, que prevaleceu entre o fim da Segunda Guerra Mundial e a dissolução da URSS.
Para Rodrik, há um “bom cenário” possível na pós-pandemia que consiste no seguinte: “uma maior permissão para introduzir proteção quando for necessário, tanto para a regulação do investimento estrangeiro como para a troca comercial, a fim de restaurar as estratégias de desenvolvimento”. O "mal cenário" seria um endurecimento do conflito comercial, semelhante à fase que se seguiu à crise dos anos 1930.
“A América Latina sofre de um dualismo produtivo, com setores que têm alta produtividade, mas não geram empregos, e setores muito atrasados que geram muito emprego. Isso reduz as oportunidades para a faixa de renda média. O Estado de Bem-estar tradicional afirma que, com mais educação e saúde pública, os trabalhadores podem ter acesso a melhores empregos e, assim, melhorar suas condições de vida. Mas isso não funciona mais, porque não está disponível a oferta de trabalho com bons empregos. Temos que mudar a perspectiva”, explica Rodrik.
Para o economista, o “novo Estado de Bem-estar” deve envolver mais políticas produtivas, com forte integração do setor privado. Isso indica que é uma prioridade melhorar as habilidades dos trabalhadores para que possam manobrar a tecnologia, mas também acomodar a tecnologia às habilidades dos trabalhadores. Nesse sentido, elogiou o caminho institucional percorrido pelo Instituto Nacional de Tecnologia Agropecuária (INTA).
“A melhora da produtividade não precisa vir apenas do crescimento dos setores de ponta. Levando em conta o grau de atraso de grande parte da sociedade, a simples retirada de pessoas da informalidade em favor de empregos de média produtividade já melhoraria muito a situação”, considera Rodrik.
“Pode haver proteção para que determinadas indústrias se modernizem. Mas não acredito que os empregos na indústria vão voltar, não acredito que esse seja o futuro da economia. Os grandes geradores de empregos serão os setores de serviços, saúde, educação e varejo”, analisa o economista.
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Dani Rodrik propõe um "novo Estado de bem-estar" - Instituto Humanitas Unisinos - IHU