Será que o estado de crises de nosso tempo se explica pela crise da social-democracia? Para o professor, é preciso estender o olhar ao nosso redor e compreender que restaurar a social-democracia não resolve todos nossos problemas
Esta semana, nos eventos que fazem memória aos atos de vandalismo em 8 de janeiro de 2023, ouvimos muito falar no restabelecimento da democracia, da demonstração de resiliência frente às investidas reacionárias. Mas será que é isso mesmo? Podemos ser tão otimistas assim? Muito do que vivemos até aqui é fruto da social-democracia e, por isso, pode-se supor que este estado de coisas acontece pela crise na própria social-democracia. Para Moysés Pinto Neto, a questão não pode ser reduzida a isso, pois, do contrário, bastaria restaurar a social-democracia e tudo estaria certo. “A imagem mais perfeita de ‘civilização’, a social-democracia europeia, tem no seu ‘lado B’ o colonialismo e a devastação do meio ambiente”, adverte.
Na entrevista a seguir, concedida por e-mail aos Instituto Humanitas Unisinos – IHU, Moysés é provocado a refletir a partir da perspectiva da social-democracia. “A época da social-democracia (1945-1977) muitas vezes foi elevada à categoria de ‘Anos Dourados’ ou ‘Trinta Gloriosos’ da humanidade. Na verdade, isso é uma imagem absolutamente circunscrita ao Norte Global, com pouco impacto sobre o Sul, inclusive porque sua implementação foi bloqueada com apoio das próprias potências do Norte, como ocorreu com a Operação Condor na América Latina e na resistência aos processos de descolonização na África”, analisa.
Assim, ele provoca: “um modelo historicamente circunscrito que tem poucas possibilidades de responder a problemas diversos produzidos por outras épocas. Que, aliás, é o caso atual, no qual, embora sobrevivam alguns resíduos (positivos) do modelo, em especial em sistemas de saúde e assistência social, observamos seu declínio cada vez mais amplo”. Não se trata de negar estes avanços da social-democracia. Moysés, na verdade, tensiona a compreender que há um ‘lado b’ e que muitas das cisões emergem deste lado. “De um lado o Estado de bem-estar foi atacado por movimentos libertários e anticapitalistas que reivindicavam a transformação radical da sociedade em todas as dimensões: econômica, política, sexual, imaginária, ecológica. De outro, o Welfare foi atacado por uma direita radical que etiquetava como ‘socialista’ qualquer dimensão que extrapolasse o caráter estritamente formal/capitalista do liberalismo”, detalha.
É por isso que o professor sugere que deixemos um pouco de lado conceitos históricos e olhemos com vagar ao nosso redor, tentando compreender o que nos cerca. É um movimento que ele considera profícuo até para compreender as esquerdas em nosso tempo e a própria insistência na social-democracia. “O problema não é o socialismo, que é um aliado ao qual sou muito simpático na sua versão ecológica, mas quando o socialismo pretende ser o Todo e resolver todos os problemas com seu instrumental conceitual, ético, técnico e político”, diz.
Por fim, ele analisa a extrema-direita, especialmente na América Latina, e reflete sobre este primeiro ano do governo Lula III. “Eu gostaria que Lula olhasse para um outro ‘fora’, o ‘fora’ da sociedade civil que o apoiou, abrindo mais espaço para os movimentos sociais não só figurarem em cargos, mas também pensar as políticas de modo geral de governo”, provoca.
Moysés Pinto Neto | Foto: arquivo pessoal
Moysés Pinto Neto é doutor em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS, com período-sanduíche no Centre for Research in Modern European Philosophy, no Reino Unido. É editor do canal Transe e fundador da plataforma educacional Alternativa Hub.
IHU – As políticas social-democratas tradicionais, originadas em projetos como o de Estado Social, têm sido suficientes para unir a maioria da sociedade em torno da democracia política como conseguiram no passado?
Moysés Pinto Neto – O modelo da social-democracia foi uma conciliação realizada no fim da Segunda Guerra Mundial como solução de compromisso entre os interesses capitalistas no Norte Global e a pressão advinda do “socialismo real” da URSS e dos movimentos de trabalhadores ao redor do mundo. Ele envolve a incorporação de novas dimensões ao liberalismo político, como os direitos sociais e os serviços públicos, adicionando um pano de fundo mais material ao caráter estritamente formal, baseado no conceito individualista de liberdade, do primeiro liberalismo.
Promove por isso a “Great Society”, ou seja, um modelo teoricamente mais inclusivo sob o prisma social e econômico. É também uma resposta à crise de 1929, com a quebra da Bolsa e o choque na economia global, passando a uma regulação e intervenção nos mercados com a finalidade de realizar objetivos comuns, evitar crises e promover serviços por meio da burocracia estatal.
Por fim, podemos caracterizar o período como auge do “capitalismo industrial”, baseado na indústria pesada, ainda localizada no Norte global. Essa última característica é que viabilizou o pacto entre burguesia e trabalhadores, interiorizando a luta política para dentro dos partidos e da institucionalidade, sobretudo a partir dos sindicatos dos operários industriais. Um arranjo que ainda está no imaginário inclusive aqui do Sul global, como quando se arquitetou uma suposta aliança entre a burguesia industrial e os trabalhadores contra o “rentismo”, como se aquela burguesia não estivesse já completamente envolvida no mercado financeiro.
É por isso um modelo historicamente circunscrito que tem poucas possibilidades de responder a problemas diversos produzidos por outras épocas. Que, aliás, é o caso atual, no qual, embora sobrevivam alguns resíduos (positivos) do modelo, em especial em sistemas de saúde e assistência social, observamos seu declínio cada vez mais amplo.
IHU – Até onde a social-democracia nos levou enquanto humanidade?
Moysés Pinto Neto – A época da social-democracia (1945-1977) muitas vezes foi elevada à categoria de “Anos Dourados” ou “Trinta Gloriosos” da humanidade. Na verdade, isso é uma imagem absolutamente circunscrita ao Norte Global, com pouco impacto sobre o Sul – então chamado de “terceiro mundo” –, inclusive porque sua implementação foi bloqueada com apoio das próprias potências do Norte, como ocorreu com a Operação Condor na América Latina e na resistência aos processos de descolonização na África.
Muitos intelectuais continuam considerando a social-democracia como o melhor modelo possível, dado que foi o que melhor conseguiu combinar a liberdade política com a igualdade social, fazendo uma espécie de combinação entre os ideais da direita e da esquerda. Seus avanços e suas políticas são tidos como extremamente positivos para a melhoria da qualidade de vida e do bem-estar social, termo que, aliás, também a designava.
Em termos mais gerais, podemos dizer que nada do luxo que vigorou na Europa foi obtido sem o sacrifício de todo resto humano e não humano.
Assim como o homem europeu se projetou como o centro do cosmos, entendendo sua experiência como a mais avançada e sua humanidade como um atributo único em relação à “Natureza” (na qual estavam incluídos os selvagens, as mulheres, os animais, etc.), também a experiência social-democrata é uma projeção do Norte Global que o coloca no centro da cosmopolítica, ignorando o legado colonial que a viabilizou e os impactos ecológicos produzidos pelo modo de vida baseado no consumo que desenvolveu. Hoje, inclusive, há termos como “capitalismo fóssil” e “democracia do carbono” para requalificar o período.
Temos, por isso, o paradoxo benjaminiano em que a civilização se encontra com a barbárie: a imagem mais perfeita de “civilização”, a social-democracia europeia, tem no seu “lado B” o colonialismo e a devastação do meio ambiente.
IHU – Como compreender a chamada crise da social-democrata? Em que medida podemos encontrar referências e semelhanças desta crise que vivemos em nosso passado?
Moysés Pinto Neto – A crise da social-democracia é algo extremamente complexo que passa por diversas variáveis, mas vou colocar apenas duas para simplificar.
De um lado, a juventude dos países do Norte global, os povos colonizados, os movimentos revolucionários, negro e feminista e a resistência ao autoritarismo soviético unem-se para contestar as estruturas de poder que vigoravam no coração da “Civilização”. Inspirados pelas contraculturas, pela luta pelos direitos civis, pela democracia, pela crítica ao modo de vida consumista e a busca de perspectivas libertárias, esses atores produziram uma hecatombe que colocou em questão a estrutura tecnocrática, patriarcal, colonial e racista da social-democracia. O modo de produção fordista e sua perspectiva vertical, disciplinar e unidimensional é colocado em xeque, reivindicando-se novas formas de agir, pensar, trabalhar e viver.
Além disso, até liberais norte-americanos reconhecem hoje que a tese do excepcionalismo democrático da América é falsa: os EUA, para os negros, foi desde sempre um estado de exceção que vigorou. Há inúmeros livros, documentários e filmes que apresentam a realidade explícita do fascismo supremacista dos EUA.
Portanto, de um lado o Estado de bem-estar foi atacado por movimentos libertários e anticapitalistas que reivindicavam a transformação radical da sociedade em todas as dimensões: econômica, política, sexual, imaginária, ecológica.
De outro, o Welfare foi atacado por uma direita radical que etiquetava como “socialista” qualquer dimensão que extrapolasse o caráter estritamente formal/capitalista do liberalismo. Baseada em um individualismo agressivo (“não há sociedade, apenas indivíduos e suas famílias”), essa direita aproveitou-se do ressentimento contra as contraculturas para combinar um rebote cultural baseado no conservadorismo punitivo, em todas as suas dimensões (escola, família, sexualidade, etc.) com o retorno do dogma do livre mercado como modo mais adequado para gerir a sociedade.
Esse duplo disparo, que constitui uma espécie de X, muitas vezes leva a esquerda pré-1968 a confundir os dois movimentos, colocando ambos na mesma prateleira. A questão é complexa, mas a minha perspectiva é que são completamente diferentes – e suas diferenças com o Estado de bem-estar vêm de lugares totalmente distintos e até opostos.
IHU – Como as reformas liberais têm minado a social-democracia? Aliás, de que liberalismo estamos falando hoje?
Moysés Pinto Neto – Existe uma miríade tão grande de liberalismos que não me sinto competente para dissertar a respeito.
As reformas liberais, por outro lado, envolvem não apenas uma dimensão de desburocratização, com a delegação de serviços públicos para a iniciativa privada, mas também uma produção de subjetividade voltada para as exigências de mercado. Percebemos claramente em áreas como saúde, educação e mesmo na religião uma influência abissal da subjetividade neoliberal como matriz. Basta pensar nas “formações por competências”, no “capital humano”, nas formas neodisciplinares de dietas (“nutricionismo”) ou na teologia da prosperidade.
Pode parecer clichê falar de “subjetividade neoliberal”, mas é uma realidade posta. Nem todos os clichês são falsos, às vezes sua repetição não é monótona, mas impositiva dada a evidência do fenômeno. A saúde, por exemplo, é tratada como uma mercadoria à venda pelos dois prismas: de um lado, o serviço como algo oneroso (plano de saúde, medicamentos caros, etc.); de outro, são os próprios indivíduos que entregam seus corpos e suas almas (ou seja, sua saúde) para as exigências de performance demandadas pelo mercado. O sucesso de termos como “positividade tóxica” indica isso. E essas exigências são abstratas, baseadas em estatísticas, portanto teoricamente ilimitadas. Os corpos, por outro lado, são finitos.
Entre a finitude dos corpos, inclusive do corpo da Terra, e a infinitude abstrata do capitalismo está a nossa época: o Antropoceno, o fim do mundo que, como sempre, é “fim de um mundo”; no caso, o mundo baseado no progresso como “afluência”, ou seja, o sonho dos intermináveis “Anos Dourados” eurocêntricos.
IHU – Como este liberalismo impacta as esquerdas globais e, em espacial, a nacional?
Moysés Pinto Neto – O impacto ocorre sob muitas formas, mas creio que o efeito mais avassalador, para o qual a esquerda ainda não tem resposta, é a destruição do seu espaço-tempo.
A noção de “esquerda”, cunhada a partir da revolução francesa e depois associada a movimentos socialistas, trabalhistas, comunistas e anarquistas, foi criada em um determinado espaço-tempo que já se desestruturou. Suas principais infraestruturas, os sindicatos e o Estado-nação, foram dissolvidos de forma impiedosa e contundente pela direita, que implementou o espaço “global” e destruiu as regulações e as organizações coletivas, instaurando um capitalismo extremo.
Por outro lado, como se vem afirmando repetidamente, a ascensão do “realismo capitalista” é a destruição do tempo da esquerda da afluência, ou seja, do futuro, sempre entendido como algo que melhora o presente – o progresso.
A esquerda não soube reencontrar um projeto por duas dificuldades: primeira, porque seu espaço de organização e efetividade foi destruído. As organizações coletivas foram minadas e o Estado-nação não tem força suficiente para confrontar as redes de capital global, que operam em um nível transnacional e têm um monumental poder de pressão. O que ocorre, com isso, é que a esquerda assume prometendo mudar a estrutura, mas não tem solução e nem poder suficiente para operar essas transformações.
Não me refiro apenas à governabilidade, que é apenas a última camada dessa disputa. E nem mesmo a “ideias” ou “projetos”. Refiro-me a espaço de ação mesmo, a capacidade de operar mudanças eficazes.
As redes financeiras, industriais, mafiosas, entre outras, não são apenas atores que interferem na paisagem política. Elas são a própria paisagem. Assim, o espaço de ação fica sempre limitado. É duvidoso que as fronteiras nacionais, hoje, sejam o melhor marcador para estabelecer lutas. Tendo a acreditar que não. É melhor pensar em espaços menores, em que as intervenções situadas podem produzir grandes resultados efetivos, e maiores, como a transversalidade da questão ecológica que envolve frear o capitalismo.
Mas existe outro desafio ainda mais profundo, que é a esquerda compreender que as instituições do Estado de bem-estar também foram contestadas por dentro, sendo atacado seu caráter tecnocrático, autoritário, racista, misógino, entre outros. Ou seja, as transformações no capitalismo industrial e no Estado-nação não ocorreram apenas em função de avanços da direita, mas também de uma desconstrução do modo de vida instaurado no Ocidente como regra geral, universal e abstrata.
A demanda por “empregos”, por exemplo, subestima o papel que a crítica ao modo fordista desempenhou e desempenha ainda hoje. As demandas de flexibilidade, horizontalidade e outras dimensões que foram capturadas pelo neoliberalismo não foram o resultado de um programa reacionário. Pelo contrário, elas envolviam um questionamento da ética burguesa do trabalho e do dinheiro, reivindicando vidas que possam fugir dos grilhões do controle capitalista e explorar novos sentidos.
A esquerda ainda não conseguiu formas efetivas de prolongar essas tendências, não apenas incorporando suas lutas (o que poderia ser associado, por exemplo, à recente Constituição Chilena que foi rejeitada pelo primeiro referendo ou à renda básica universal), mas alterando a paisagem como um todo.
Para alguns, o conceito de “revolução” daria conta disso. Sou bastante cético, basicamente porque acho este conceito demasiado circunscrito a um imaginário messiânico (cristão, em especial, mas também secular) e, em sua versão moderna, também cartesiano (com a ideia do “ponto zero”).
IHU – Vivemos, pelo menos, duas grandes guerras: uma em Gaza e outra na Ucrânia. Como o senhor conecta os contextos destas guerras com a crise civilizatória que temos vivido, passando pelo avanço liberal e pelo baque na social-democracia? Ou esta conexão não existe e a análise requer outros caminhos?
Moysés Pinto Neto – Não sou capaz de responder isso em profundidade. Do ponto de vista da lei internacional, não há muitas dúvidas: ambos os Estados estão fora da lei e violam sistematicamente os direitos humanos e a soberania dos países atacados. Mas uma perspectiva desse tipo explica pouco, porque apenas demonstra que a normativa ideal (o “dever ser” jurídico) não está sendo observada.
O que vejo é que a Rússia é o protótipo de um novo tipo de autoritarismo com fachada democrática e institucionalizada, lastreado no conservadorismo cultural e em oligopólios capitalistas em conluio com o Estado, e as razões para seu ataque à Ucrânia são baseadas em uma lógica imperial. Não sabemos exatamente o nível de influência das ideias de Dugin, por exemplo, mas seu projeto é a redistribuição racializada do espaço político europeu. A raça, contudo, é escondida atrás do conceito de Nação, como aliás ocorre em toda extrema-direita europeia. Portanto, independente da ruindade de Zelensky, entendo que o ataque à Ucrânia é injustificado e imperial.
Sobre Gaza, tampouco me sinto competente. Entendo apenas que há fatores a serem considerados, como o fato de que não há possibilidade de justificação racional do que Israel vem fazendo em relação aos palestinos. Trata-se, a meu ver, portanto, de genocídio.
É verdade que o antissemitismo continua sendo uma força social viva em todas as sociedades e, muitas vezes, coloca o povo judaico na defensiva. O que é curioso, no entanto, é que vejo o antissemitismo como um dos protótipos do próprio pensamento conspiratório da extrema-direita mundial (substitua “globalista” por “judeu internacional”), e é justamente a extrema-direita que tem em Israel um dos países em que mais livremente impõe seu programa. Talvez seja o mesmo paradoxo do patriota, vestido com a canarinha, que odeia o Brasil.
Nem vou entrar na discussão sobre o sionismo. Mas o que afasta a aproximação oportunista entre crítica do genocídio e antissemitismo é a falsa associação entre povo e Estado-nação, que jamais se confundem. O Estado-nação já é uma transformação potencialmente supremacista dos múltiplos povos da Terra (e da terra). O Estado-nação de Israel é indefensável.
IHU – Ainda sobre a guerra em Gaza, agora relacionando com o ativismo de esquerda no tema Israel e Palestina, como o senhor observa as reações da esquerda? Por que é tão difícil para grande parte da esquerda considerar a humanidade básica e o sofrimento traumático de civis, incluindo cidadãos israelenses, como ponto de partida consistente?
Moysés Pinto Neto – Se adotarmos um humanismo de base, por exemplo utilizando a noção de direitos humanos, fica fácil resolver as questões geopolíticas mundiais. O problema é que esse horizonte é puramente normativo, do humanismo liberal. O mundo real está mais próximo das disputas de força de Maquiavel e Nietzsche. Assim, com a entrada da materialidade, as questões ficam mais complexas, com nuances. Mesmo o que podemos considerar como sofrimento pode, em determinados contextos, ser uma disputa entre dois sofrimentos, ou entre dois horrores.
Adotar uma perspectiva de não violência como ponto de partida é, sem dúvida, o melhor, do ponto de vista do pensamento. Mas, em relação ao mundo real, nem sempre é efetiva. Então, entram as nuances. As estratégias. Entendo que a estratégia do Hamas é injustificável, embora também entenda que dificilmente será possível arquitetar uma saída do Estado colonial sem passar por algum tipo de violência. Quem sabe estou errado e os liberais, corretos? Até agora, não parece muito plausível acreditar em qualquer saída “civilizada” para o problema, como a partir de uma razão comunicativa ou a observância de parâmetros jurídicos, dado que a própria civilização e sua ideia contemporânea foram construídas a partir das ruínas dos colonizados.
IHU – Em que medida podemos considerar lúcidas as análises da esquerda contemporânea acerca da crise ambiental, social e econômica? Como observa a forma como temas como violência de gênero, desenvolvimento econômico-social, emergência climática, entre outros, têm sido tratados?
Moysés Pinto Neto – Não existe uma esquerda, mas no mínimo duas esquerdas sobre essa questão.
De um lado, a esquerda que pensa a partir do desenvolvimento industrial e do progresso tecnológico, que vê o futuro como de abundância generalizada para todos do mundo, uma vez levantada a exploração capitalista. Tenho chamado essa esquerda de “edenista”, uma vez que “aceleracionista”, como chamava antes, dá margem à muita equivocidade. Associo essa esquerda à meta do paraíso: o luxo abundante para todos. Se dissesse “paradisíaca”, ficaria estranho. Escolhi a imagem do jardim do Éden, porque também há uma herança teológica aí em jogo.
De outro lado, existe uma esquerda que nem sei se vê nesse rótulo (“esquerda”) sua melhor designação, mas de qualquer modo coloca a questão da descolonização no primeiro plano e aplica as categorias anticoloniais, que são compartilhadas pelos edenistas, também no nível das próprias estruturas com as quais organizamos ontologicamente o mundo. Chamo essa esquerda de “indigenista”. Nesse caso, civilização, progresso, direitos, abundância, tecnologia são, entre muitas outras, palavras que entram em disputa. Vejam o recente impacto do Antonio Bispo dos Santos, ao inventar palavras como biointeração, confluência, diversais, politeístas, orgânicos.
Bispo é tão anticapitalista quanto o marxista mais radical: a diferença é que ele não está situado no interior do Modernidade, que, para o marxista (enquanto um herdeiro de Hegel), é algo inevitável.
Então, a esquerda edenista vai querer atravessar a Modernidade e o capitalismo por dentro, entendendo que simplesmente “não existe fora”, reivindicando com isso um novo complexo industrial, novos parâmetros normativos universais, o fim da exploração econômica, a abundância distributiva do luxo. De outro lado, a esquerda indigenista vai multiplicando as fissuras, conectando-se às experiências intensivas dos diversos povos, extramodernos ou não, que não se reconhecem como capitalistas. Seu pluriverso é anticapitalista, mas não apenas: é também a busca de uma reconfiguração do espaço-tempo a partir do múltiplo encantado, fazendo proliferar muitos mundos em detrimento do mundo totalitário não apenas da mercadoria, mas também das formas de vida antropocêntricas, patriarcais, brancas, etc.
Como se vê, considero o projeto indígena mais radical que o edênico: sua desconstrução é mais radical. Por outro lado, o mundo indígena é “compacto”, não tem a possibilidade do desenvolvimento infinito, do progresso linear, da abundância generalizada. O mundo indígena é repleto de perigos e precauções.
Gaia não é uma deusa bondosa e misericordiosa. Não é à toa que se procura recuperar o sentido politeísta/pagão/não axial/imanente de divindades, o que se sintoniza também com o crescente interesse no pensamento dos indígenas e na retomada da ancestralidade africana. É um mundo do cuidado e de atenção, mas no duplo sentido: se dirigir para, mas com cautela, como quando usamos a expressão “tenha cuidado!” ou “preste atenção!”
IHU – Fala-se que vivemos uma nova “grande transformação”. No que isso consiste? E como observa a forma como a esquerda apreende esta nova transformação?
Moysés Pinto Neto – O termo “Grande transformação” vem de Karl Polanyi, mas é apenas uma maneira de abordar o que está ocorrendo. Se tivesse que definir o que passaria por esse rótulo no momento, eu diria que é a ultrapassagem do “ponto de não retorno” em relação à crise ecológica, carregada, por exemplo, no termo Antropoceno.
Essa passagem recoloca em questão toda paisagem moderna (sobre a qual está inscrito o atual capitalismo): o ser humano é excepcional, único portador do espírito na Terra, que por sua vez é um depósito de recursos que deve ser dominado e rendido para prover o bem-estar humano. A concepção leva a uma divisão entre externo e interno, em que o externo é a Natureza; o interno, a cultura (ou “espírito”, “sociedade”, “humano”). Isso se desdobra no plano cognitivo em uma divisão entre as ciências da natureza, ou ciências propriamente ditas, e as ciências humanas ou humanidades. As humanidades, que abrangem as dimensões da política, da ética e do direito, são assuntos “internos”. As ciências, que abrangem a técnica e a indústria, são assuntos “externos”. No meio do caminho, está, hoje, a economia, como o motor que conecta um ponto ao outro.
O Antropoceno destrói essa configuração: o interno e o externo estão agora misturados, pois a internalidade (a cultura, o espírito) invadiu a externalidade (a natureza), criando sua reconfiguração antrópica, e a externalidade (natureza) invadiu a internalidade (cultura) na medida em que o problema ecológico passou a integrar a paisagem do cotidiano humano, com enchentes, temperaturas extremas, incêndios, etc. Com isso, a desconstrução entre interno e externo começa a operar e, com ela, a distribuição das agências. Passamos a considerar sob outro prisma outros seres, como animais, plantas e mesmo minerais, ou ainda a própria Terra, como na Constituição do Equador, que reconhece a Pachamama como sujeito de direitos.
Isso nos provoca uma reviravolta surpreendente: é nos “primitivos”, “atrasados”, enfim, nesses que andam nos vagões de trás do trem da História, que já existe essa perspectiva. Não há nada de novo no front. E, de repente, podemos nos acordar de um longo sonho no qual figurávamos como o pico da civilização, do progresso, da humanidade e da história.
No contexto do Antropoceno, entendo que a antiga esquerda deve cada vez mais se aproximar daqueles que estão nesse lado.
IHU – As democracias ocidentais saberão enfrentar os efeitos da nova “grande transformação”, que é ainda mais cultural-antropológica do que técnico-científica?
Moysés Pinto Neto – Não acho produtivo restabelecermos a diferença entre “técnico-científico” e “cultural-antropológico” pela simples razão de que é assim mesmo que funciona a Constituição moderna. E, entre os modernos reformistas, poderíamos colocar aqueles que gostariam de aproximar os conceitos técnicos e científicos, regidos pela razão instrumental, de uma razão prática, ou ético-política, ou ainda bioética, que atribuiria sentido, humanizando as áreas das ciências da natureza.
Acho que devemos adotar uma perspectiva ainda mais radical, reconhecendo que a própria cisão entre natureza e cultura é responsável pela externalização do ambiente que permite ao capitalismo criar um espaço-tempo abstrato ao qual todo resto se submete, por exemplo, o PIB. Alguém dirá: esses números não são abstratos, são medidas concretas do mundo, mas sabemos – e dentro da própria economia essa crítica é cada vez maior – que essas quantificações e suas medidas não correspondem, no seu crescimento, necessariamente à melhoria da qualidade de vida. Como, aliás, ocorre no Brasil, em que o crescimento é concentrado e os índices brutos acabam se traduzindo em destruição de mundos mais que em intensificação da experiência, envolvimento.
Ou seja, penso que a mudança é ontológica, ou, como venho preferindo, cósmica. É preciso que sejamos capazes de atravessar nossas categorias e reconfigurar a política a partir de novas articulações, redes, teias, camas de gato, gambiarras, agências, agenciamentos, dispositivos, abrindo-a para a entrada de novos atores, como os animais, as paisagens, os minerais, os encantados e os encantamentos, entre muitos outros, infinitas outras.
O tamanho da tarefa já indica a resposta: não. As democracias ocidentes são ligadas a um paradigma eurocêntrico historicamente circunscrito, o humanismo antropocêntrico e a filosofia da representação. Nisso, poderia citar Derrida para dizer que a democracia é sempre um por vir. Portanto, trata-se de atravessar essa forma finita e circunstancial da democracia representativa liberal para novas formas mais radicais, pluriversais, policêntricas, poliárquicas.
IHU – Como analisa os movimentos da extrema-direita na América Latina? E no Brasil?
Moysés Pinto Neto – Os movimentos de extrema-direita indicam algo que já sabíamos há tempos, mas custávamos a acreditar: existe uma fração muito grande da população predisposta a aceitar soluções fascistas. Não é maioria, nem metade. Mas compõe uma fatia considerável. No Brasil, por exemplo, o núcleo duro do bolsonarismo nunca baixou de 25%. É ¼ da população. O papel de Bolsonaro na pandemia mostra que é um núcleo praticamente indestrutível, pois não consigo visualizar atuação pior do que a do ex-presidente. Ou seja, esse quarto está predisposto a aceitar qualquer coisa.
Por outro lado, há uma fatia razoável da esquerda, digamos que mais ou menos na mesma quantidade, e um terceiro segmento pendular que oscila pragmaticamente. No Brasil, foi possível opor ao projeto da extrema-direita, com toda sua máquina de propaganda digital e o mais fraudulento uso de recursos públicos para eleição desde a República Velha, um projeto com preocupação social. Na Argentina, esse horizonte parece apagado, dado o fracasso do progressismo para enfrentar a inflação galopante. Milei aparece na combinatória entre a “política de trolls” das plataformas digitais, com sua dimensão caricata de “populismo avacalhado”, e do desespero diante da estagnação que não oferece alternativas fora do peronismo e sua oposição clássica.
Esse, em geral, tem sido o primeiro momento: populismo catalisado pela insatisfação com o establishment. Depois, começam a aparecer, como nos casos brasileiro e norte-americano, o engajamento fascista e uma parte do público indignado deserta, enquanto outro se organiza e radicaliza.
As dinâmicas desses movimentos variam de país para país. No Brasil, eles vêm turbinados pelo investimento das velhas e novas oligarquias, rurais e urbanas, latifundiárias e financeiras, que apoiam amplamente a extrema-direita. A dissidência em geral se dá com campos de centro-direita como grandes grupos de mídia e outros identificados como establishment no nível político da “descompostura”, embora quase sempre exista uma afinidade com o discurso econômico “ancap”.
Mas existe uma força que vem de baixo para cima, o bolsonarismo/fascismo popular, que é mais complexo: envolve uma combinatória entre punitivismo e conservadorismo, mais uma defesa da desregulação para abrir espaço a párias-aventureiros, daí a relação com milícias. Em As origens do totalitarismo (Companhia das Letras, 2013), Arendt mostra como desse segmento sai a base do Partido Nazista ao longo de três décadas.
As origens do totalitarismo, de Hannah Arendt | Imagem: divulgação
Por aqui, há um misto de teologia da prosperidade com economia da ilegalidade (veja o caso dos traficantes evangélicos ou dos garimpeiros), colocando-se ainda no combo a plataformização do universo do “dinheiro rápido” (apostas, criptomoedas, influenciadores, fazenda de cliques) e dos golpes (pirâmides, fraudes etc.).
Nesse sentido, não poderia deixar de registrar que a ascensão mundial da extrema-direita está muito ligada à plataformização, cuja estrutura favorece o tipo de conteúdo baseado no pânico moral. O Brasil é um dos países de uso mais intensivo das plataformas. Não por coincidência está tão propenso à extrema-direita.
IHU – Um ano de governo Lula III. Em sua opinião, quais os maiores avanços e os limites que encontramos neste primeiro período?
Moysés Pinto Neto – A eleição de Lula foi decisiva para evitar o surgimento de algo que não sabemos até onde iria. Um segundo mandato de Bolsonaro poderia ser não a destruição da democracia, que por si só ainda não existe efetivamente no Brasil, mas a instauração de um Estado fascista militarizado e a desregulamentação geral, possibilitando que as oligarquias instaurassem regimes locais de domínio total: econômico, político e cultural. Esse é seu maior avanço.
Além disso, podemos citar a retomada dos programas sociais, cuja eficácia já foi atestada durante os anos do PT e a direita, no começo, pretendeu manter, até finalmente ir pouco a pouco revogando os direitos conquistados e ampliando a pobreza. A simples reinstauração do que havia sido colocado já é suficiente para justificar uma melhora.
Em outras questões, entendo o governo Lula de modo mais ambíguo. A política econômica de Haddad é contestada pela esquerda, a mesma esquerda que, conforme ele próprio ironizou, comemora seus resultados. Não sou capaz de analisar quem tem razão. Na área ambiental, Lula parece abrir mais espaço para Marina Silva, que ele já percebeu ser um dos seus pilares da política internacional, mas continua ambíguo em várias questões, como a extração de petróleo na foz do Amazonas. Uma ambiguidade perigosa e incompreensível.
Na área da política institucional, Lula é obrigado a conciliar com o Centrão para governar e neutralizar a bancada bolsonarista. Isso tem um custo altíssimo. O papel do Centrão tem sido cada vez mais concentrar poder no Congresso Nacional e tornar-se uma correia de transmissão de clientelismo e corrupção. No entanto, é preciso reconhecer que as circunstâncias são muito desfavoráveis. O que espero é que Lula tenha uma boa estratégia para a sucessão de Lira. Depois disso, as cobranças podem aumentar.
Além disso, a retomada democrática em relação ao 8/1 ainda é fraca. Avançamos pouco na regulação de plataformas, que são a infraestrutura que geraram o caldo golpista, e não há punição de militares, que foram os principais fiadores da movimentação bolsonarista. Múcio, como outros do governo, alegam que “os militares não embarcaram”. Falso: desde o começo do governo Bolsonaro, tudo que este fez de absurdo foi chancelado com um fuzil apontado para a cabeça da sociedade civil ameaçando um golpe militar. O mesmo ocorreu com o 7/9 do ano anterior, o pós-eleições, etc.
No mais, acho que Lula adotou a estratégia de “fora para dentro”, que funcionou nos seus primeiros mandatos. Ou seja, enquanto aqui ele era ridicularizado, criticado e desvalorizado, sua imagem internacional era cada vez mais enfatizada e celebrada. Com isso, produziu-se uma certa tensão na dissonância de abordagens, produzindo gradualmente uma afinação maior com o noticiário estrangeiro. Isso foi visível na abordagem da Globo ao longo dos primeiros mandatos. Lula tentou trazer sua respeitabilidade internacional como signo para o recuo das elites locais na tração de uma oposição furiosa ou um golpe de estado, buscando com isso construir uma governabilidade mínima.
Por ora, Lula assume em um contexto em que as elites econômicas não estavam dispostas a perder. E partiu para a negociação, usando a carta internacional a seu favor, buscando apoio de fora para dentro. Só que todas as trocas foram em prol da dimensão econômica, comandada por Haddad, o que reacende a luz do economicismo que prevaleceu ao longo do lulismo. Mesmo assim, óbvio que a reforma tributária foi uma conquista importante.
Agora, no entanto, eu gostaria que Lula olhasse para um outro “fora”, o “fora” da sociedade civil que o apoiou, abrindo mais espaço para os movimentos sociais não só figurarem em cargos, mas também pensar as políticas de modo geral de governo. A “frente ampla” não foi só com a centro-direita, mas também com a sociedade civil, que ocupou um papel central para a eleição de Lula.
Por isso, espero ver Lula mais aberto para ouvir Marina Silva, Anielle Franco, Silvio Almeida, Sonia Guajajara e outras não apenas em relação às suas pastas, mas em relação ao futuro do projeto. A esquerda partidária em geral subestima a força desses movimentos. Ela acredita que os votos de Lula vieram do seu carisma, da lembrança dos seus governos e da organização do PT. Isso é verdade, mas apenas meia verdade. Uma fração muito relevante do apoio veio de movimentos independentes e de tendências libertárias da sociedade civil que não toleravam mais o bolsonarismo no poder.
IHU – Uma “utopia socialista” ainda pode ser um caminho para superarmos este estado de crise civilizacional? Ou o melhor mesmo seria reanimar o “Espírito da Utopia” (numa referência a Ernst Bloch) em outro sentido?
Moysés Pinto Neto – A questão de nomenclatura é sempre delicada. Nunca fui entusiasta da palavra “socialismo”, embora tenha sempre me definido como anticapitalista. Para algumas pessoas, anticapitalismo e socialismo são sinônimos. Estão erradas. O socialismo é um projeto situado em um contexto histórico, baseado em uma antropologia específica e com objetivos que não são necessariamente idênticos aos demais projetos anticapitalistas. É um caso do anticapitalismo.
Por isso, o problema não é o socialismo, que é um aliado ao qual sou muito simpático na sua versão ecológica, mas quando o socialismo pretende ser o Todo e resolver todos os problemas com seu instrumental conceitual, ético, técnico e político, ignorando outros projetos como se pudessem ser subsumidos em uma mesma totalidade.
Essa disputa tem me gerado alguns problemas com aliados. Eles entendem que acirrar essa diferença é desnecessário, que discursos como, por exemplo, o ecossocialismo seriam suficientes para contemplar uma aliança geral. Eu entendo que não: para compor com essas novas forças, precisamos nos desvencilhar do imaginário da unidade que subsume as diferenças, mesmo que isso signifique sua posterior reinvenção em novas formas. Gaia, por exemplo, não é um metabolismo. O mundo socialista do trabalho não alienado não é a mesma coisa que os mundos indígenas ou quilombolas. Há diferenças. E não há problema nisso, o problema é querer transformar tudo na mesma coisa.
Além disso, o capitalismo não subsumiu tudo: essa ideia é baseada na figura do círculo que engloba tudo e não tem fora. Há outras figuras para descrever a realidade, que não passam por essa topologia limitada de dentro e fora. Nós somos todo tempo capitalistas e anticapitalistas, porque o capitalismo não é simplesmente algo que se está dentro ou fora de modo absoluto e total. Da mesma forma, as tendências anticapitalistas não são simplesmente um dentro ou um fora. Se não fosse assim, noções como a “contracolonialidade” jamais fariam algum sentido (talvez para alguns não façam mesmo, e é justamente contra eles que estou escrevendo).
Analisar a questão com outras topologias permite, aliás, escapar da lógica das “contradições” ou, pior, “traições” que costumam povoar críticas moralistas sobre indivíduos que são usadas tanto pela direita quanto por parte da extrema-esquerda.
Que é preciso construir uma aliança pluriversal de luta contra o capitalismo, não há dúvida. Porém ela deve ser o mais pluriversal possível, inclusive abrindo mão do círculo da unidade, recorrendo a outras formas de articulação e outras figuras de composição. Nela, deve prevalecer a tolerância ontológica e epistemológica, jamais um fundacionismo baseado numa verdade cujo desvio significa uma espécie de pecado moderno, sujeito à condenação pelo Vaticano Vermelho.
Isso significa que as próprias imagens da composição podem variar entre os sujeitos que compõem a aliança: para uma determinada agência, estar na aliança pode ser explicável por X, enquanto para outra, por Y. E tudo bem. Desde que haja uma convergência no plano da eficácia, isso é que importa. Nesse ponto, continuo sendo um pragmatista radical.