21 Outubro 2025
“Trump está enviando bilhões de dólares americanos para outro país para apoiar um presidente fracassado que levou seu país à ruína ao perseguir as preferências políticas de Trump. Se Milei fracassar, o programa de austeridade, muito semelhante ao de Trump, também sofrerá um duro golpe”. A reflexão é de Branko Marcetic, em artigo publicado por Jacobin, 18-10-2025. A tradução é do Cepat.
Eis o artigo.
O apoio de Donald Trump a Javier Milei está gerando crescente mal-estar nos Estados Unidos: o presidente argentino receberá US$ 40 bilhões que Trump fez aparecer do nada, enquanto os estadunidenses sofrem os cortes com os quais “economizou” essa quantia.
Em novembro passado, os estadunidenses votaram em um presidente que prometeu colocar “a América em primeiro lugar”. Em vez disso, precisam se contentar com “a Argentina em primeiro lugar”.
No início desta semana, o governo Donald Trump anunciou que dobraria o valor do resgate financeiro planejado para a Argentina, que, sob o severo programa de austeridade do presidente Javier Milei, viu sua economia estagnar e o país correr para vender US$ 1 bilhão de suas reservas estrangeiras para estabilizar sua moeda, que estava em queda livre.
O plano da equipe de Trump é arrecadar mais US$ 20 bilhões do setor privado para enviar ao país em crise, além dos US$ 20 bilhões em dinheiro dos contribuintes americanos que Trump já prometeu usar para comprar pesos, o que supostamente seria um empréstimo. Os US$ 40 bilhões que Trump está enviando ao país equivalem, aproximadamente, aos US$ 41,8 bilhões que deve ao Fundo Monetário Internacional (FMI), de longe a maior dívida da organização, metade da qual foi contraída durante o governo Milei no início deste ano.
Isso não traz nenhum benefício aos trabalhadores estadunidenses, e o presidente nem sequer finge que há. Como ele mesmo explicou: “Trata-se apenas de ajudar uma grande filosofia a prevalecer em um grande país”, porque “a Argentina é um dos países mais bonitos que já vi, e queremos que tenha sucesso. É muito simples”.
Essa “grande filosofia” é o “anarcocapitalismo” ou libertarianismo do presidente argentino Milei, que defende que o governo deve ser radicalmente reduzido e seu papel na sociedade limitado ao mínimo indispensável, deixando os interesses privados e corporativos fluírem livremente. Se aplicada com seriedade, transformar essa filosofia em realidade concreta exige o desmantelamento de programas de segurança social como o vale-alimentação, Medicaid e a Previdência Social; o esvaziamento de agências úteis como o PBS ou o Escritório de Proteção Financeira do Consumidor; e uma redução em massa do emprego público, o que deixa centenas de milhares de pessoas desempregadas. Pode parecer que essa “filosofia” guarda uma semelhança assustadora com a filosofia que norteou a política interna de Trump nos últimos nove meses.
Em outras palavras, Trump está enviando bilhões de dólares americanos para outro país para apoiar um presidente fracassado que levou seu país à ruína ao perseguir as preferências políticas de Trump. Se Milei fracassar, o programa de austeridade, muito semelhante ao de Trump, também sofrerá um duro golpe.
Enquanto isso, reserve um tempo para pensar no que esse dinheiro poderia ser usado internamente se Trump realmente cumprisse suas promessas, feitas há uma década, de parar de enviar a riqueza dos Estados Unidos para o exterior e, em vez disso, usá-la para ajudar os estadunidenses em dificuldades.
Neste momento, o governo federal dos EUA está em meio a uma paralisação de três semanas porque os republicanos se recusam a estender os subsídios da Lei de de Assistência Médica Acessível (Affordable Care Act), cujo vencimento iminente fará com que os planos já exorbitantes do seguro saúde disparem e deixem quase cinco milhões de pessoas sem cobertura. Qual é o custo desses subsídios? De acordo com o Escritório de Orçamento do Congresso (CBO), aproximadamente US$ 350 bilhões em fundos dos contribuintes ao longo de dez anos, incluindo US$ 23 bilhões em 2026 e US$ 32 bilhões em 2027.
Em outras palavras, a quantia que Trump está arrecadando desesperadamente para ajudar seu amigo libertário na Argentina seria suficiente para pagar por quase dois anos de trabalho para garantir que os estadunidenses não sejam deixados na miséria por planos de saúde gananciosos. E este está longe de ser o único exemplo.
Os cortes no Programa de Assistência Nutricional Suplementar (SNAP) no “Big Beautiful Bill” (BBB) de Trump, que levarão a um forte aumento da fome, totalizam US$ 186 bilhões nos próximos dez anos, uma média de aproximadamente US$ 19 bilhões por ano. Assim, a ajuda de Trump a Milei poderia ter pago por mais dois anos de benefícios integrais do vale-alimentação em um momento de forte alta nos preços dos alimentos.
O valor que Milei está recebendo de Trump também é quase a mesmo (US$ 45 bilhões) que Trump cortará do Medicare no próximo ano, de acordo com o Escritório de Orçamento do Congresso (CBO). Isso representa mais do que um ano de cortes, em média (US$ 30,7 bilhões), que Trump fez para tornar o pagamento de empréstimos estudantis mais inacessível. Também poderia ter pago por mais um ano vários incentivos fiscais para a produção de energia renovável, cuja revogação por parte de Trump deverá aumentar as contas de serviços públicos.
A quantia que Trump está drenando tão despreocupadamente para fora do país através da fronteira sul também representa mais de um quarto dos relativamente escassos US$ 150 bilhões que seu amigo bilionário Elon Musk “economizou” em gastos governamentais. Lembre-se, Musk fez isso e contribuiu generosamente para o déficit federal, dizimando o governo: deixando centenas de milhares de estadunidenses desempregados, mergulhando a Administração da Previdência Social no caos, destruindo a pesquisa sobre o tratamento do câncer, minando o Serviço Postal dos Estados Unidos e fechando a agência que financia o Programa Meals on Wheels e ajuda a idosos e deficientes em geral, para citar apenas alguns exemplos.
É irritante pensar em como a vida dos americanos se tornou muito mais difícil apenas para “economizar” uma soma de dinheiro que Trump parece capaz de tirar do nada a qualquer momento.
É lamentável que o presidente não considere ajudar o povo estadunidense tão importante para seu legado político quanto apoiar um líder estrangeiro em declínio. Caso contrário, ele poderia ter encontrado alguns bilhões extras entre as almofadas de seu sofá na Casa Branca para jogar para eles também.
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