16 Julho 2025
O Ibama negou no início deste mês uma licença-prévia requerida pela Petrobras para a 4ª etapa de exploração do pré-sal na Bacia de Santos. Seria comum, entre idas e vindas de processos de licenciamento de projetos de grande impacto, não fosse a razão para a negativa: o órgão ambiental condicionou a autorização à apresentação de um programa específico sobre ações contra as mudanças climáticas. Solicitação justa, já que é a queima de combustíveis fósseis a principal causa da crise do clima.
A reportagem é publicada por ClimaInfo, 15-07-2025.
A nova etapa do pré-sal é o maior projeto de licenciamento ambiental do Brasil, destacam André Gomes na Folha e o Megawhat. São investimentos de R$ 196,4 bilhões. Por isso a negativa do Ibama, baseada numa premissa climática, desagradou a estatal, acusando o órgão de “discriminação”. Reclamação que não caberia a quem se autointitula “líder da transição energética justa”.
A avaliação técnica do Ibama é que as ações de mitigação climática adotadas hoje no pré-sal, como a reinjeção de gás fóssil nos poços e a redução da queima do combustível, são insuficientes frente à gravidade da crise climática. Por isso, o órgão exige um programa específico, com metas claras ligadas a cinco eixos: transparência, monitoramento, mitigação, compensação e adaptação.
A Petrobras, porém, negou-se a apresentar um plano sobre o tema. A “líder da transição energética” afirma que não há regulamentação específica para esse tipo de exigência no licenciamento, o que criaria um tratamento desigual no setor de petróleo e gás fóssil. Então tá.
Mas o Ibama alega que não há como avançar sem o programa. “A Petrobras possui diversos compromissos públicos de redução de emissões, mas esses compromissos não estão refletidos no licenciamento ambiental, o que impede o acompanhamento da evolução dos indicadores”, respondeu à petroleira.
Além disso, afirmou que, “considerando o contexto de agravamento da crise climática, a urgência na redução das emissões líquidas e a responsabilidade compartilhada de atendimento das metas climáticas, não parece razoável o desenvolvimento da exploração petrolífera com tamanho saldo positivo de emissões de gases de efeito estufa”. Mais claro, impossível.
A operação das 10 plataformas da etapa 4 do pré-sal, segundo o Ibama, prevê emissões de mais de 7,6 milhões de toneladas de dióxido de carbono equivalente (tCO2e) por ano, de 2032 a 2042. Comparando, o parque de geração termelétrica a combustíveis fósseis no Brasil, que soma 67 usinas a carvão, gás e óleo, emitiu 17,9 milhões de tCO2e em 2023. Logo, só a nova etapa vai emitir 43% do que é emitido por todo o parque térmico ligado à rede elétrica básica.
O volume de emissões chega perto de tudo o que é emitido nas três etapas anteriores do pré-sal. Em 2023, as plataformas que já operam nas três primeiras fases emitiram 10,8 milhões de tCO2e, segundo dados da Petrobras.
É importantíssimo explicar que as emissões listadas pelo Ibama para a etapa 4 são relativas à operação. Se contabilizada a queima dos combustíveis fósseis que serão extraídos, o volume seria quase 25 vezes maior, chegando a quase 180 milhões de tCO2e por ano, calcula, Shigueo Watanabe Jr., pesquisador do ClimaInfo. Ou seja, o impacto nas mudanças climáticas ainda é muito maior.
O Projeto Etapa 4 prevê a instalação e a operação de 10 plataformas de produção e devidas estruturas de escoamento. Elas serão instaladas a pelo menos 178 km da costa de São Paulo e Rio de Janeiro, em profundidade acima de 1.880 m. A Petrobras estima uma produção média de 123 mil m3/dia de petróleo [quase 800 mil barris por dia] e de 75 milhões m3/dia de gás fóssil.
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