23 Mai 2025
"Leão é, portanto, um nome apropriado para um papa de nossa atual era de declínio imperial. É um lembrete de que nossa fé está acima da política contemporânea e acima da autoridade temporal."
O artigo é de Antonio De Loera-Brust, publicado por America, 21-05-2025.
Antonio De Loera-Brust é o diretor de comunicação da United Farm Workers. Anteriormente, atuou como assistente especial do secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken. Foi bolsista O’Hare na America Media de 2017 a 2018.
“O catolicismo sobreviveu ao Império Romano. Também vamos sobreviver ao Império Americano”. Foi o que um padre jesuíta me disse certa vez em um pub em Nova York, durante meu período como bolsista O’Hare na revista America. Essas palavras têm ecoado em meus ouvidos ultimamente porque, para o bem ou para o mal, parece que a ordem global liderada pelos Estados Unidos está chegando ao fim.
O presidente Trump provavelmente é mais um sintoma do que uma causa, mas poucos contestariam que a influência global dos EUA está em declínio. No Iêmen, o grupo militante houthi parece ter resistido à nossa campanha de bombardeios, com o presidente elogiando sua bravura. A derrota americana no Afeganistão ainda repercute, enquanto o apoio dos EUA a Israel, mesmo enquanto este impõe fome a Gaza, enfraquece nossa autoridade moral e posição diplomática no mundo. A paz duradoura entre Ucrânia e Rússia parece tão distante como sempre foi, mas hoje em dia, ninguém realmente espera que o governo dos EUA seja capaz de mediar com sucesso esses conflitos.
É nesse tempo de declínio americano que surge o primeiro papa americano. Na verdade, ele é mais nosso segundo papa latino-americano, possuindo cidadania peruana além da americana, e falando espanhol — não inglês — em sua primeira bênção da sacada de São Pedro. Sua perspectiva latino-americana certamente ajudou o Colégio Cardinalício a superar o tabu de escolher um americano. Mas talvez também tenha ajudado a percepção de que a era do poder incontestado dos Estados Unidos está chegando ao fim.
A escolha do nome pelo papa é especialmente relevante nesse contexto. O Papa Leão XIV reconheceu que sua escolha foi inspirada, em parte, pelo Papa Leão XIII, autor da Rerum Novarum, a encíclica que afirmou o apoio da Igreja aos trabalhadores e aos sindicatos. Mas o nome também evoca Leão I, conhecido como Leão Magno, que carregou o peso do papado durante o colapso final do Império Romano do Ocidente. Venerado como santo, Leão I é creditado com o milagre de convencer Átila, o Huno, a abandonar sua invasão da Itália em 452. Diz-se que em Mântua, no que hoje é o norte da Itália, Leão I saiu para encontrar Átila face a face, sem ter um exército próprio.
Jamais saberemos exatamente o que foi dito naquele encontro. Alguns afirmam que Átila viu uma visão de São Pedro e São Paulo empunhando espadas; pelo menos é assim que aparece no afresco de Rafael sobre a cena, no Vaticano. Historiadores modernos propuseram que doenças já estavam corroendo o exército do huno, e que a retirada após o encontro com Leão foi uma escolha estratégica perfeitamente racional. Mas o fato de os hunos terem sido derrotados por micróbios também pode muito bem ter sido um ato de Deus. Podemos afirmar que o Papa Leão I salvou Roma, não com o poder da espada, mas com o poder de sua fé, que foi recompensada.
Três anos depois, mesmo com Átila morto e enterrado, Roma estava em pior situação. O imperador Valentiniano III ordenou o assassinato do general Flávio Aécio, o líder militar mais competente de Roma, que havia anteriormente derrotado a invasão de Átila na Gália. Valentiniano, por sua vez, foi assassinado pelos amigos de Aécio. O próximo imperador, um rico oligarca romano chamado Petrônio Máximo, tentou consolidar o poder casando seu filho com a filha do falecido Valentiniano — rompendo um tratado anterior com o Reino Vândalo no norte da África, segundo o qual a filha de Valentiniano estava prometida ao filho do rei Genserico, governante dos vândalos. Logo um exército vândalo estava às portas de Roma, e Petrônio Máximo foi assassinado por uma multidão romana por covardia ao tentar fugir da cidade.
Nesse vácuo de liderança, o Papa Leão I interveio novamente. Embora não tenha conseguido repetir o feito de convencer os invasores a recuar, ele obteve de Genserico a promessa de poupar a população civil durante o saque vândalo de Roma. A primeira Basílica de São Pedro tornou-se um refúgio durante a invasão, e o povo de Roma escapou de grande parte da violência que teria sido infligida.
Costumo imaginar o Papa Leão I celebrando a primeira missa em Roma após a invasão vândala, reunindo a elite humilhada ao lado daqueles que sempre foram pobres — e talvez até alguns poucos dos invasores bárbaros. Ele pode ter lembrado aos romanos que as coisas importantes sempre estariam ali, e que era hora de seguir vivendo como Deus queria, mesmo em meio às ruínas.
É esse momento, talvez mais do que seu milagre com Átila, que realmente faz de Leão um grande papa. A fé católica já havia feito a jornada notável de uma pequena seita perseguida na Palestina romana nos tempos do imperador Augusto até tornar-se religião oficial do Império Romano. O título de pontifex maximus, ou sumo sacerdote de Roma, que Augusto havia reivindicado para si como imperador, havia passado aos bispos de Roma, os sucessores de São Pedro, que agora lideravam uma Igreja a partir do próprio local onde Pedro foi crucificado de cabeça para baixo. Mas o caminho que o Papa Leão I iniciou para a Igreja foi igualmente notável e ainda mais duradouro: a transição de uma religião estatal imperial para uma Igreja universal acima de qualquer poder temporal. Foi a liderança de homens como Leão que garantiu que o catolicismo perdurasse muito além do Império Romano, com consequências que nem o próprio poderia ter previsto.
Essa capacidade de sobreviver à ascensão e queda das ordens mundiais abriu caminho para que o catolicismo se tornasse a maior religião nas Américas — os continentes que nos deram nossos dois papas mais recentes. Se a conversão do Império Romano ao catolicismo foi um milagre, o fato de o catolicismo ter resistido à sua queda foi ainda mais milagroso.
Leão é, portanto, um nome apropriado para um papa de nossa atual era de declínio imperial. É um lembrete de que nossa fé está acima da política contemporânea e acima da autoridade temporal.
Os comentaristas têm sido rápidos em analisar as declarações de Leão XIV, sua biografia e suas redes sociais em busca de pistas sobre sua inclinação política. Recebi inúmeras mensagens de amigos, católicos e não católicos, perguntando se o novo papa é liberal ou conservador, de esquerda ou de direita. A própria pergunta, que implica que é preciso primeiro conhecer as posições do papa para então decidir se se respeita sua autoridade, é um instinto decididamente moderno — onde o dever e a lealdade são sempre escolhidos e condicionais, nunca herdados ou incondicionais.
Mas a grande força do catolicismo é que ele se apoia numa tradição moral mais antiga do que qualquer ordem social moderna. A Igreja está perfeitamente situada para criticar a sociedade injusta de nosso tempo justamente porque pode recorrer a valores que nos precedem. A Igreja pode estar conosco, aqui e agora, enfrentando a pobreza, a violência e a miséria do mundo ao nosso redor. E, ainda assim, pode transcender nosso mundo — porque não é deste mundo.
Então lembre-se: nosso papa quer que sejamos bons com os migrantes e os pobres, não porque deseje que algum candidato específico vença uma eleição, mas porque eles também são seres divinos, dignos de misericórdia e possuidores da dignidade inerente de terem sido criados à imagem de Deus. O momento político atual simplesmente não é sua preocupação. Como aquele cujo nome carrega, o Papa Leão XIV está aqui para nos guiar por todas as crises que virão, com nosso olhar fixo nas coisas que realmente permanecem.
É algo notável sobreviver à era em que se nasceu — no nosso caso, a era da hegemonia global americana. Não sabemos o que o restante do século XXI trará, mas certamente haverá vencedores e perdedores nas transformações, assim como houve vencedores e perdedores na queda do Império Romano. Se nos couber o papel de vândalos, hunos ou romanos, nosso primeiro papa americano pode nos consolar com o fato de que nossa Igreja, que antecede e sobreviverá ao país em que ele e eu nascemos, sempre estará lá por nós — mesmo quando um império inevitavelmente ceder lugar ao próximo.