24 Mai 2025
Enchentes que atingiram o estado acabaram por devastar um dos principais biomas do Brasil.
A informação é de Lucas Azeredo, publicada por Sul21, 22-05-2025.
No último domingo (18), o Sul21 trouxe a realidade da destruição da vegetação nativa do Pampa, bioma que toma 69% do território gaúcho. Os outros 31% do Rio Grande do Sul são ocupados pela Mata Atlântica, bioma historicamente o mais devastado no Brasil e agora ainda castigado pela crise climática, que provocou a remoção forçada de árvores por deslizamentos ou pela enxurrada.
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“A Mata Atlântica é o bioma mais vulnerável do Brasil, com a menor cobertura de vegetação nativa entre todos os biomas. Qualquer perda gera um impacto importante na sua conservação”, diz Natália Crusco, pesquisadora do MapBiomas, uma rede colaborativa que estuda temas relacionados ao território e ao ecossistema do Brasil.
Segundo o Relatório Anual do Desmatamento de 2024 do MapBiomas, o país perdeu 3 mil hectares de Mata Atlântica por conta de eventos climáticos extremos no ano passado. Do total, 2.800 foram no Rio Grande do Sul. Hoje, só restam 42% da vegetação nativa da Mata Atlântica gaúcha, sendo a maioria (74%) florestas.
“De todos os vetores identificados como motivadores da perda de vegetação, os eventos climáticos extremos foram os que apresentaram os maiores aumentos relativos a 2023”, comenta a pesquisadora. Natália ainda diz que “cerca de 55%” de todos os eventos de perda de vegetação nativa no RS estão relacionados aos eventos climáticos extremos.
“A Mata Atlântica é fundamental para absorver a água e regular o clima contra eventos extremos”, afirma Enéas Ricardo Konzen, professor da UFRGS – Campus Litoral Norte e diretor do Centro de Estudos Costeiros, Limnológicos e Marinhos (Ceclimar). No Centro de Estudos, Konzen trabalha com a conservação genética de palmeiras subtropicais em ambientes costeiros e de Mata Atlântica.
“Ter uma mata estabelecida ajuda a distribuir melhor a chuva”, diz Enéas. O pesquisador explica também que as árvores ajudam a filtrar a água e que “sem a mata, a água iria toda para os mananciais”. Ele afirma que a falta de vegetação nativa “com certeza ajudou” para que os efeitos das enchentes fossem mais trágicos.
Durante o ápice da crise climática em 2024, o vereador Sandro Fantinel (PL), de Caxias do Sul, propôs a derrubada da mata nativa no município para “evitar desastres”, afirmando que o peso das árvores causavam deslizamentos que atingiam a região da Serra Gaúcha. “É justamente o contrário. Deveria parecer óbvio. As raízes ajudam a fixar a terra”, explica Enéas.
Ricardo Machado, professor da Universidade Estadual de Feira de Santana (BA), estudou a relação entre preservação de áreas de mata nativa e a contenção de desastres como enchentes, inundações e deslizamentos, e é categórico: “Existe uma correlação”. “As condições precisam ser preservadas do jeito que elas evoluíram”, diz Ricardo.
Entre os fatores apontados por Machado para a ocorrência de um desastre como uma enchente, estão a cobertura vegetal, a impermeabilização do solo, declive e até mesmo a renda. Em áreas de concentração de alta renda, os terrenos são preparados levando em consideração essas questões. Por outro lado, nos locais de baixa renda, a construção ocupa espaços que são propícios para calamidades climáticas, como as proximidades de rios. “Todo rio tem uma planície de inundação. Se a cidade não tem ideia até onde essa planície vai, o rio vai tomar ela de volta”, comenta o professor.
Sobre a cobertura vegetal, Ricardo Machado diz que o ambiente “estava preparado e agora não está mais”. “A água cai mais devagar com mata densa. Dá mais chance da água infiltrar o solo”, afirma.
No Rio Grande do Sul, assim como o Pampa, a Mata Atlântica sofre com o avanço da agricultura nas áreas de vegetação, especialmente para as plantações de soja, milho e trigo. A aposta para a recuperação da mata que antes ocupava quase toda a metade norte do Rio Grande do Sul é, além da preservação do que resta, o resgate de áreas desmatadas. “Não é que a gente seja contra o desenvolvimento, mas o desmatamento é injustificável. Não precisa destruir mais”, complementa Enéas Konzen.