18 Março 2025
Houve uma evidente ânsia de ouvir e trocar ideias, com perguntas acumuladas, perguntas respondidas e até mesmo discussões do público no final. Aplausos fervorosos e gratidão. Foi uma demonstração poderosa da necessidade que existe entre um certo público nestes tempos. O salão principal do Centro de Cooperação Cultural, com seus 200 lugares, mais as 100 cadeiras que haviam sido dispostas com telão e sistema de som do lado de fora, e até os dois níveis da ampla escada de acesso e os corredores do salão, ficaram lotados na última segunda-feira.
Foi na apresentação de Álvaro García Linera, que começou com uma palestra sobre o papel e a definição do Estado, e terminou destacando os erros do progressismo latino-americano, com um forte apelo à ação da sociedade civil mobilizada, que ele definiu como "em preocupante estado de paralisia, como se esperasse algo que não cairá somente sobre o líder". O ex-vice-presidente e intelectual boliviano estava acompanhado pela pesquisadora e diretora do programa Lectura Mundi da Unsam (coorganizadora da atividade), Micaela Cuesta, e pelo diretor deste espaço cultural, que se destaca entre os teatros da rua Corrientes, Juan Carlos Junio.
A reportagem é de Karina Micheletto, publicada por Página/12, 17-04-2017.
O núcleo anunciado da palestra, que durou duas horas, foi o discurso principal intitulado "O que é o Estado? O ideal e o material da política". Como em um curso teórico de Ciência Política, o público acompanhou de perto definições e contextualizações, citações de Mann, Marx e Weber, abordagens sobre a questão do que fazer com o Estado e aproximações do Estado como aquele definido por crenças compartilhadas, o comum, o grande gerador de vínculos, ou a "tensão paradoxal" entre Estado e sociedade, entre "monopólio e desmonopolização do comum".
Após a palestra, o público começou a perguntar sobre Bolívia, Argentina, Venezuela e Equador. García Linera revisou aquela "primeira onda bem-sucedida de transformações sociais, que foi acompanhada por um plano de ação que permitiu a implementação dessas grandes transformações", como ele a definiu. Ele lembrou que, naquele período, "o progressismo na América Latina tirou 70 milhões de latino-americanos da pobreza extrema e permitiu que eles comessem três vezes ao dia".
E ele continuou explicando como esse progressismo "tende a se tornar prisioneiro de seu próprio trabalho", sendo incapaz de administrar a transição entre aquela primeira onda bem-sucedida e a seguinte. "As primeiras reformas serviram a um propósito, em um contexto. Mas permanecer unicamente requentados e requentados das coisas boas que fizemos foi um erro estratégico grave. Se nos detivermos apenas no passado, querendo repeti-lo em contextos que mudaram, nos tornamos ultrapassados. E é assim que damos origem a propostas disruptivas da direita. O grande problema do progressismo é que ele não conseguiu oferecer um novo modelo."
Depois de destacar que "o progressismo hoje está em greve de ideias; falta-lhe criatividade, projetos que inspirem entusiasmo, uma audácia credível para resolver os anseios das pessoas" — com exceção do México nesta análise, que ele situou em outro lugar nas ondas históricas que propôs — García Linera passou a identificar o problema da "reação dos que estão em pé de igualdade: aqueles cujos privilégios estão ameaçados não porque passaram a ter mais, mas porque se dão conta de que aqueles que tinham menos agora têm o mesmo que eles."
"Na Bolívia, (a advogada e apresentadora de televisão que assumiu o papel de presidente de fato após o golpe, Jeanine Añez) foi a reação daqueles em pé de igualdade, daí sua ferocidade, sua disposição de matar índios como moscas. Daí sua brutalidade racista, que os levou a tentar matar Evo e dançar sobre seus ossos se possível, pelo ódio visceral que sentiam por ele."
Nesse estado de coisas, as mudanças, esclareceu, "não necessariamente vêm por uma mudança geracional. O líder lidera, expressa a experiência histórica do popular, porque é de lá que emanam, do povo. E permanece até que haja outra efervescência popular da qual surja outro grande líder. É por isso que Cristina e Evo permanecem. É por isso que a esquerda na Argentina nunca conseguiu avançar, porque não conseguiu entender o cheiro plebeu do popular que o peronismo tem."
A partir dessa certeza, ele passou a fazer um forte apelo à sociedade civil mobilizada, aos militantes: "Hoje é urgente produzir outro curso de ação possível, um que oriente as ações do líder. Esperamos que o líder nos diga para onde ir, e às vezes o líder não vê. É o militante que pode ver o terreno porque é ele quem o percorre, o conhece e o entende. Mas aqui o vejo em estado de paralisia, como se esperasse algo que cairá do líder. E não. Os militantes tradicionais não viram a outra Argentina, a que existe nos bairros, a da informalidade. Eles não a conhecem e não a entendem. Se não podemos falar com essa outra Argentina plebeia, não sindicalizada, não poderemos avançar com a segunda onda de reformas."