14 Agosto 2024
Sem agir, petroleira faz mais uma promessa de investimento em fontes renováveis quase um ano e meio após criar uma diretoria específica para transição energética.
A opinião é de Alexandre Gaspari, jornalista, em artigo publicado por ClimaInfo, 14-08-2024.
Em abril do ano passado, o conselho de administração da Petrobras aprovou o nome de Maurício Tolmasquim para assumir a recém-criada diretoria de Transição Energética e Sustentabilidade da companhia. A nova pasta gerou grande expectativa: um sinal positivo de que a estatal viraria de vez a chave para um planeta em emergência climática, deixando de ser uma empresa de petróleo e gás fóssil e se tornando uma empresa de energia, com mais investimentos em fontes renováveis e menos recursos para combustíveis fósseis.
O Plano de Negócios 2024-2028, anunciado em novembro de 2023, alimentou o otimismo. Ainda que a área de exploração e produção de petróleo e gás fóssil representasse quase 72% dos US$ 102 bilhões em investimentos previstos para o período, a cifra destinada à descarbonização dobrou em relação ao plano anterior. Dos US$ 11,5 bilhões previstos para projetos de baixo carbono, US$ 5,2 bilhões foram planejados para projetos em energia eólica e solar.
Até agora, porém, nada aconteceu. Durante todo esse tempo, o comando da petroleira se preocupou mais em pressionar o IBAMA para liberar a licença para exploração de combustíveis fósseis no bloco FZA-M-59, na foz do Amazonas, região de altíssima sensibilidade ambiental e risco máximo, como já constatado pelo órgão ambiental. Sobre renováveis, a diretoria da estatal falou mais em eólicas offshore – segmento que ainda carece de regulamentação – do que em projetos em terra, já regulados e disponíveis. De quebra, insistiu que atuava para reduzir as emissões dos combustíveis fósseis produzidos pela petroleira [o que não estanca as mudanças climáticas] e que aposta na cara e ainda pouco conhecida tecnologia de captura, utilização e armazenamento de carbono (CCUS).
E mais um balde de água fria foi jogado na semana passada, quando Maurício Tolmasquim anunciou que a estratégia da petroleira em renováveis está focada em fusões e aquisições em projetos de geração eólica terrestre, totalizando 3 gigawatts (GW) de capacidade instalada. Ou seja, em vez de novos investimentos em energia renovável (chamados “greenfield”), a Petrobras está de olho em projetos já em andamento. Algo muito bom para a “descarbonização” das operações da companhia, mas que não altera em nada a necessidade urgente do planeta de ampliar as fontes renováveis e reduzir a produção e o uso de combustíveis fósseis.
Para piorar, Tolmasquim ainda disse que a Petrobras quer tentar a recontratação da energia suja produzida por suas termelétricas a gás fóssil no leilão de reserva de capacidade que o governo deve promover ainda este ano. Não apenas isso: além das plantas já em operação, a petroleira avalia oferecer um novo projeto termelétrico a gás fóssil.
Em paralelo, a presidente da petroleira, Magda Chambriard, voltou a insistir na exploração de combustíveis fósseis na foz do Amazonas, em uma teleconferência com analistas sobre os resultados financeiros da Petrobras no 2º trimestre. Magda, que era diretora-geral da ANP quando a agência promoveu o leilão no qual a Petrobras e a britânica BP arremataram o bloco FZA-M-59, disse que a empresa não pode prescindir da “exploração responsável” da região. Seja lá o que isso signifique.
Enquanto isso, o 1º estudo de atribuição sobre os incêndios no Pantanal, feito pela rede de cientistas climáticos World Weather Attribution (WWA), mostrou que as mudanças climáticas tornaram as condições que alimentam o fogo – calor, seca e vento – 40% mais intensas e de 4 a 5 vezes mais prováveis no Pantanal ocidental. Há dois meses, outro estudo da WWA sobre a catástrofe das chuvas no Rio Grande do Sul também relacionou o evento extremo às mudanças climáticas. Mudanças estas causadas principalmente pela queima dos combustíveis fósseis que Magda quer “explorar de forma responsável” na foz do Amazonas.
Trabalhadoras e trabalhadores da Petrobras, representados pela Federação Única dos Petroleiros (FUP), também têm cobrado mais ações da empresa em direção à transição energética justa. Sabem que disso depende não apenas o futuro de seu trabalho, mas também o futuro do planeta.
A Petrobras é motivo de orgulho por seu papel no desenvolvimento socioeconômico do país. Mas precisa usar esse papel para liderar e acelerar a transição energética justa, e não para produzir petróleo “até a última gota”.
A perenidade da companhia também depende disso. Afinal, projeções da Agência Internacional de Energia (IEA) mostram que o consumo de combustíveis fósseis vai começar a cair globalmente a partir de 2029-2030. Investir em mais petróleo e gás fóssil e ignorar as fontes renováveis é um mau negócio. Para as finanças e para o planeta.
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Até quando, Petrobras? Artigo de Alexandre Gaspari - Instituto Humanitas Unisinos - IHU