28 Fevereiro 2024
A Coalizão Energia Limpa fez, no ano passado, um estudo sobre as vulnerabilidades do setor elétrico brasileiro diante das mudanças climáticas. Ao mostrar que ainda faltam políticas públicas que considerem os impactos da crise climática sobre o sistema elétrico do país, a pesquisa indicou o “caminho das pedras” para o problema: o abandono da geração de eletricidade por combustíveis fósseis e o fortalecimento de um sistema hidro-solar-eólico para garantir energia à população.
A reportagem é de Alexandre Gaspari, publicada por ClimaInfo, 26-02-2024.
O levantamento foi uma resposta àqueles que insistem na geração termelétrica a gás fóssil como ‘bateria’ para as fontes solar e eólica na matriz elétrica brasileira. Esse grupo costuma usar a intermitência dessas fontes como desculpa para encher o país de usinas a combustíveis fósseis, inclusive em lugares onde não há oferta de gás.
Os defensores das térmicas a combustíveis fósseis ignoram que sua expansão vai aumentar as emissões de gases de efeito estufa do setor elétrico brasileiro, um dos mais limpos do planeta. E também esquecem que o país já dispõe de potentes ‘baterias’: as hidrelétricas. A grande maioria delas já foi amortizada há muito tempo, e por isso oferta eletricidade muito mais barata. Além de renovável e muito mais limpa que qualquer energia gerada a gás ou derivado de petróleo.
As usinas movidas à água representam hoje pouco mais de 50% da capacidade instalada do país. Já responderam por 90%. Essa queda, porém, ao contrário do que alguns “barrageiros” costumam proclamar, não é negativa. Isso porque boa parte dessa perda foi substituída por outras fontes renováveis, principalmente solar e eólica.
A maior parte da instalação das hidrelétricas no país ocorreu num momento em que a legislação ambiental era falha ou mesmo inexistente. Assim, muitas dessas usinas, mesmo produzindo energia renovável, foram construídas sem considerar os impactos à fauna e à flora e expulsando populações tradicionais e indígenas. Foram instaladas com grandes reservatórios de água, que inundaram áreas extensas.
É algo inimaginável atualmente. Mesmo com a mudança ocorrida nos últimos anos para projetos a fio d’água, com área inundada infinitamente menor, mas ainda assim impactante.
O último anti-exemplo desse desastre é Belo Monte. Depois dela, os planos de grandes projetos hidrelétricos pelo país minguaram. Não à toa, a Eletrobras desistiu de levar adiante os estudos de viabilidade de um complexo hidrelétrico na bacia do Tapajós, em plena Floresta Amazônica. Um monstrengo que iria inundar áreas de conservação e Terras Indígenas.
Assim, as usinas já instaladas, antes fundamentais para oferecer energia renovável e mais barata aos consumidores brasileiros, hoje vão se tornando uma garantia a outras fontes tão renováveis e baratas, e menos impactantes ambiental e socialmente. Enquanto o desenvolvimento de baterias físicas para guardar eletricidade não ganha escala, o Brasil pode “guardar” energia nos reservatórios hidrelétricos já existentes e usá-la quando há baixa de produção das fontes solar e eólica. Situação que pode ser ampliada com investimentos na tecnologia de hidrelétricas reversíveis, capazes de armazenar mais água.
É verdade que o país vai ter de observar e se preparar para os efeitos das mudanças climáticas na hidrologia e no regime de chuvas. Esse passo é fundamental para evitar surpresas no futuro. Mas também é cada vez mais evidente que o Brasil pode continuar sua expansão elétrica sem precisar usar combustíveis fósseis, usando seu potencial de fontes renováveis com respeito às populações e ao meio ambiente.
Nossa “bateria” limpa já está disponível. Basta usá-la com planejamento e responsabilidade.
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A “bateria” do Brasil é água, não gás fóssil - Instituto Humanitas Unisinos - IHU