28 Junho 2024
"O budismo é conhecido no Ocidente sobretudo pelas suas práticas meditativas e pelo acesso a novas e inexploradas zonas do pensamento. E isso é totalmente natural, dada a grande ênfase que o budismo coloca sobre a busca do não eu (Anatta) como remédio para aquele 'mal-estar', insatisfação e sofrimento que permeia o homem e para o qual parece não haver remédio", escreve Tiziano Tosolini diretor do Centro de Estudos Asiáticos dos missionários xaverianos em Osaka, em artigo publicado por Settimana News, 26-06-2024. A tradução é de Luísa Rabolini.
No “primeiro giro da roda do Dharma”, que teve início com a pregação do primeiro sermão proferido pelo Buda em Benares depois de ter alcançado o Despertar sob a árvore da bodhi, inúmeros outros se seguiram, difundindo assim a doutrina e a disciplina por toda a Ásia até finalmente chegar às costas do Ocidente. O budismo passou, assim, a fazer parte do cenário e do vocabulário religioso atual e o seu olhar particular sobre a realidade começou a ampliar o conhecimento que um indivíduo possui sobre o mundo, sobre os outros e sobre si mesmo.
Contudo, um fato continua sendo inegável: o budismo é conhecido no Ocidente sobretudo pelas suas práticas meditativas e pelo acesso a novas e inexploradas zonas do pensamento. E isso é totalmente natural, dada a grande ênfase que o budismo coloca sobre a busca do não eu (Anatta) como remédio para aquele “mal-estar”, insatisfação e sofrimento que permeia o homem e para o qual parece não haver remédio até que ele decida trilhar o caminho das Quatro Nobres Verdades que o conduz do reino da impermanência e do samsāra ("vagar sem fim") ao do nirvāna ("extinção"), pondo assim fim ao ciclo dos renascimentos.
Contudo, chegar ao nirvāna não é apenas uma questão de sabedoria (paññā) e de meditação (samādhi), mas também de reto comportamento (sīla), de um cumprimento constante dos deveres e das virtudes morais que devem acompanhar aquelas intelectuais e meditativas. A relação entre esses aspectos ou componentes do nirvāna pode ser expressa em termos filosóficos, afirmando que cada um deles é certamente uma condição necessária, mas não suficiente: a sabedoria, a meditação e a moralidade devem estar todas presentes para que o Despertar seja alcançado.
Pois bem, se o budismo provou certamente ser extraordinariamente dedicado a refletir sobre o ensinamento do Buda e a ilustrar as diversas práticas meditativas, e se nos seus textos existem certamente listas mais ou menos extensas de ensinamentos e preceitos a serem levados em consideração para realizar uma vida moralmente satisfatória, não parece que nele esteja presente uma articulada reflexão sobre as diversas questões éticas.
É claro que o budismo oferece uma doutrina moral (ou seja, um ensinamento sobre as normas e os valores presentes em um contexto social e cultural específico), mas também parece haver uma incrível falta de interesse em relação aos conceitos e aos princípios éticos em que esses ensinamentos se baseiam (ou seja, uma explicação racional para aquelas normas e valores que já encontra presentes em uma cultura ou ambiente religioso).
A doutrina budista inclui, sem dúvida, aspectos normativos (como, por exemplo, os cinco preceitos que todos os budistas devem respeitar e as regras do Vinaya dirigidas sobretudo à comunidade monástica), mas esses são apresentados principalmente como prescrições, mais que como conclusões deduzidas logicamente de princípios e valores explicitamente descritos e fundamentados. Em outras palavras, nos textos budistas os preceitos são simplesmente anunciados, mas pouco se conhece sobre aquela superestrutura invisível da qual foram deduzidos.
O objetivo do recente livro Lineamenti di etica buddhista (Esboços da ética budista, editora Chisokudō, 2024) é, portanto, contribuir para a tentativa de preencher - pelo menos em parte - essa lacuna dentro dos discursos budistas, oferecendo (talvez pela primeira vez ao público italiano) uma breve introdução a algumas questões éticas importantes.
Livro Lineamenti di etica buddhista (Chisokudō Publications, Nagoya 2024) de Tiziano Tosolini
Os seis capítulos que estruturam o livro oferecem uma exposição sobre temas de ética social (ambientalismo e ética dos direitos dos animais, violência, guerra e terrorismo, visão política e econômica) e bioética (sexualidade, aborto e suicídio-eutanásia). O número das temáticas abordadas não é certamente exaustivo (outros temas de interesse poderiam ter incluído o tema da clonagem, do transplante de órgãos, da identidade de gênero, dos direitos humanos, etc.), mas o objetivo declarado da obra não é o de cobrir todas as áreas da ética, mas sim de começar a construir pontes entre a proposta moral budista e a sua necessidade de responder aos desafios éticos que está encontrando no seu diálogo com o Ocidente.
No que diz respeito ao desenvolvimento das temáticas, que pressupõe que o leitor já possua um certo conhecimento básico do budismo, o leitor encontrará nas notas um uso massivo de referências aos discursos e sermões proferidos pelo Buda, ajudando-o assim a familiarizar-se com as próprias palavras do Buda, algo que parece faltar ou estar ausente em muitos textos que tratam do budismo em língua italiana.
Quanto às citações dos textos, a maioria delas é retirada do Cânone Pāli, embora não faltem referências a outras fontes que remontam às tradições Mahāyāna e Vajrayāna.
O objetivo declarado é que o livro possa contribuir para continuar com profundidade e paixão o debate entre budismo e Ocidente não só no campo da meditação e da espiritualidade, mas também no campo ético e sociopolítico, ajudando assim o homem, considerado agora também nas suas dimensões comunitárias e públicas, a refletir e avançar para novos horizontes de possibilidade e de realização.
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O budismo e a sua ética. Artigo de Tiziano Tosolini - Instituto Humanitas Unisinos - IHU