“Mais perto do que nunca da guerra atômica. Os políticos são ignavos". Entrevista com Ira Helfand

Mísseis de defesa iranianos | Foto: Fatemeh Bahrami/Agência Anadolu

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22 Abril 2024

Alguém o definiu como “a pessoa mais tranquila e assustadora do mundo”. “O medo serve para conscientizar as pessoas”, garante Ira Helfand. Médico de pronto-socorro do Massachusetts, é um dos líderes da campanha pela abolição das armas atômicas. A sua primeira associação antinuclear, a Physicians for Social Responsibility, recebeu o Prêmio Nobel da Paz em 1985. Em 2017 foi a vez da Campanha Internacional pela Abolição das Armas Nucleares (Ican), da qual é membro, receber o Prêmio Nobel da Paz.

Conversamos com ele na exposição Senzatomica em Roma, durante um tour italiano que o levou também à Câmara do país. “Estamos mais perto do que nunca da guerra nuclear e a política parece não entender isso. Na década de 1980, mobilizamos milhões de pessoas. Haviam 70 mil ogivas atômicas e desmantelamos 50 mil. Agora temos que terminar o trabalho."

A entrevista é de Riccardo Antonucci, publicada por il Fatto Quotidiano, 19-04-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.

Eis a entrevista.

No entanto, as bombas atômicas servem à doutrina da dissuasão nuclear...

A dissuasão nuclear pressupõe três condições impossíveis: uma tecnologia perfeita, uma inteligência perfeita e uma classe política racional. Enquanto um Estado tiver uma arma nuclear existirá sempre o risco de a utilizar: com o Ican trabalhamos há tempo para afirmar esse princípio lógico no debate público estadunidense.

Com a guerra na Ucrânia falou-se em "armas nucleares tácticas", é uma forma de normalização do risco?

As armas nucleares táticas não são menos potentes que as outras. Os EUA realizaram muitas simulações de conflito entre OTAN e Rússia: toda vez que formularam a hipótese de uma bomba nuclear tática, terminava-se numa guerra nuclear total. É um dado factual que se Washington atacasse a Rússia ou a China com armas atômicas, destruiria também o território estadunidense. Na Ucrânia não podemos excluir que os russos utilizem armas nucleares táticas, dada a irresponsabilidade demonstrada por Putin.

No Médio Oriente, à beira de uma guerra regional, o Irã ameaça rever a sua doutrina nuclear...

É difícil controlar a escalada uma vez iniciada, razão pela qual Israel não deve responder ao Irã. Temos quase certeza de que Teerã não possui armas nucleares, mas se sabe onde está o reator israelense, em Dimona. As consequências também recairiam sobre os palestinos e os estados árabes vizinhos. Para eliminar as armas nucleares, temos de responder às preocupações de segurança de Estados como Israel, Paquistão e Coreia do Norte. Mesmo que não gostemos, temos de garantir a Kim Jong-un que poderá permanecer no poder mesmo sem uma bomba atômica.

Como poderemos convencer a favor da desescalada se expandimos a OTAN e aumentamos as despesas militares?

A dissuasão militar convencional pode ser eficaz, mas deve ser separada da dissuasão nuclear. Durante a Guerra Fria, os EUA e a URSS eram inimigos ferrenhos, mas iniciaram uma fase de distensão após a crise de 1963. Agora o diálogo deveria recomeçar a partir dos EUA e da China. Os outros seguirão.

Você se encontrou com a Comissão de Relações Exteriores e Defesa da Câmara, o presidente Lorenzo Fontana, a líder do PD Elly Schlein e, no Vaticano, o cardeal Michael Czerny. O que pediu?

Pedi ao Vaticano que fizesse mais. O Papa Francisco foi claro, mas nos EUA poucos bispos falam de risco nuclear. Expliquei aos políticos italianos que a Itália pode desempenhar um papel muito importante, como aliada dos EUA e membro da OTAN. Pode exercer pressão sobre Washington, começando pela ratificação do Tratado sobre a Proibição de Armas Nucleares. Também é possível continuar na OTAN pedindo aos EUA que retirem as ogivas atômicas guardadas nas bases italianas de Ghedi e Aviano.

Nota

Uma entrevista com Ira Helfand pode ser vista, em inglês e tradução italiana, aqui.

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