21 Março 2024
"Para sobreviver, após ser banido da sinagoga sob acusação de heresia, o famoso filósofo holandês do século XVII, Baruch Spinoza, foi forçado a exercer a profissão de limpador de lentes de telescópios e microscópios. Mas a sua obra-prima, a Ethica more geometrico demonstrata, à qual se dedicaria ao longo da sua curta vida de apenas 45 anos, marcou uma encruzilhada de pensamento ocidental moderno", escreve o cardeal italiano Gianfranco Ravasi, em artigo publicado em Il Sole 24 Ore, 17-03-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
A existência humana seria certamente muito mais feliz se nos homens a capacidade de ficar calados fosse igual à de falar. Mas a experiência ensina bem até demais que os homens não governam nada com maior dificuldade do que a língua.
Para sobreviver, após ser banido da sinagoga sob acusação de heresia, o famoso filósofo holandês do século XVII, Baruch Spinoza, foi forçado a exercer a profissão de limpador de lentes de telescópios e microscópios. Mas a sua obra-prima, a Ethica more geometrico demonstrata, à qual se dedicaria ao longo da sua curta vida de apenas 45 anos, marcou uma encruzilhada de pensamento ocidental moderno. Aquela obra, tão complexa e rigorosa quanto um tratado de geometria, oferece muitas vezes ideias muito concretas que poderiam até sustentar a existência de pessoas que nunca ousariam ascender pelas elevadas sendas da filosofia.
É o caso do tema que propomos, expresso por Spinoza numa linguagem e numa advertência clara e incisiva que pode ser resumida no convite a sermos capazes de falar na mesma medida em que somos capazes de ficar calados. Essa é uma lição constante de ética de todos os tempos porque é mais fácil arrepender-se de ter falado do que de ter ficado calado. Ironicamente, Woody Allen teve que suspirar: “Deus está em silêncio. Ah, se ao menos os homens se calassem!” O grande Cervantes já nos lembrava no Dom Quixote que “em boca fechada não entra mosca”.