19 Julho 2022
"O Papa Francisco poderá acertar legalmente essa situação inaugurada pelo Papa Bento XVI, e se ele se tornar emérito saberá ser bispo da Igreja Católica sem jamais interferir na missão daquele que será eleito papa. Mas os católicos devem aprender a não criar concorrências entre quem desempenha um ministério e quem o deixou por obediência ao seu Senhor", escreve Enzo Bianchi, monge italiano e fundador da Comunidade de Bose, em artigo publicado por La Repubblica, 18-07-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Já estamos acostumados aos rumores que tentam fazer uma obra de adivinhação sobre a possível renúncia do Papa Francisco. A venerável idade de 85 anos, a recente hospitalização para uma operação difícil, as dificuldades para caminhar, ainda que acompanhadas por uma mente e um espírito lúcidos, provocam a "fofoca" não só da mídia, mas também do mundo eclesial.
O Papa Francisco, por isso, interveio com palavras claras: por enquanto não pensa em renunciar, mas em obediência ao Senhor e ao seu discernimento o fará quando julgar que seu estado de saúde prejudique o ministério do sucessor de Pedro. Para muitos católicos, a renúncia do Papa Bento XVI causou grande desconforto e, também agora, a renúncia de Francisco correria o risco de ser mal recebida, especialmente devido à presença de dois papas eméritos.
Por isso seria urgentemente necessária uma meditação de parte da comunidade cristã sobre a figura do papa: mas, por enquanto, se prefere não iniciar a reflexão.
O papa é o bispo de Roma acima de tudo e, como tal, é o sucessor do apóstolo Pedro. Ele é seu sucessor a partir de sua eleição e enquanto estiver na cátedra de Pedro, mas deixa de sê-lo (o ministério petrino é uma função, não um sacramento) com sua renúncia ou morte. E para que este fato da cessação do ministério petrino fique claro para toda a Igreja, é necessária uma ordenação jurídica do ato da renúncia e a situação do papa emérito. Acima de tudo, porém, é necessária uma mudança na mentalidade dos católicos, que sacralizaram o papa a tal ponto que não conseguem aceitar a ausência de sua autoridade e de seu ser papa, quando fala, escreve e age depois de ter deixado a cátedra de Pedro.
A síndrome do antipapa continua presente na Igreja Católica: este é o problema em nome do qual se vigia, se controla o papa emérito, prontos a censurá-lo. Talvez se preferiria o papa emérito em um mosteiro, que ficasse mudo. Mas um emérito não pode "se suicidar", não pode fechar-se no silêncio, não escrever, não anunciar o Evangelho! Vimos como Bento XVI foi tratado como emérito: foi impedido de falar. Mas o que deveria ser permitido a um papa emérito é o equivalente a um bispo emérito: é correto que ele não intervenha no governo da Igreja, mas que seja deixado livre para dizer o que pensa. O papa emérito terá que deixar todos as insígnias pontifícios, os palácios e as sedes da cátedra romana, mas não deve terminar seus dias na clausura.
O Papa Francisco poderá acertar legalmente essa situação inaugurada pelo Papa Bento XVI, e se ele se tornar emérito saberá ser bispo da Igreja Católica sem jamais interferir na missão daquele que será eleito papa.
Mas os católicos devem aprender a não criar concorrências entre quem desempenha um ministério e quem o deixou por obediência ao seu Senhor.
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O papa emérito não está em clausura. Artigo de Enzo Bianchi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU