28 Outubro 2021
Aumento de 44% no desmatamento ameaça povo Karipuna e dificulta combate às mudanças climáticas.
A reportagem é de Greenpeace e CIMI, publicada por Conselho Indigenista Missionário - CIMI, 26-10-2021.
Monitoramento recente feito pelo povo Karipuna, o Greenpeace Brasil e pelo Conselho Indigenista Missionário (CIMI) na Terra Indígena Karipuna, em Rondônia, identificou uma nova frente de desmatamento naquela região.
Uma incursão a campo encontrou 850 hectares de desmatamento ilegal nos últimos doze meses dentro da Terra Indígena – um aumento de 44% em relação ao período anterior. Por ali, foram encontradas áreas com mais de 100 hectares de corte raso. A grilagem de terras e a destruição em larga escala da floresta colocam em risco a sobrevivência do povo Karipuna – e dos povos que vivem em isolamento voluntário naquela região.
A produção de carne e soja pressiona as florestas daquela área: a pecuária cresceu 87% no município de Porto Velho nos últimos nove anos e o território voltado à produção de soja em Rondônia triplicou na última década, passando de 111 mil hectares para 400 mil hectares em 2020.
Nova frente
O rio Formoso – uma área que não concentrava atividades de grilagem, situada no sudeste do território indígena e mais distante dos grandes centros de exploração ilegal e predatória de Rondônia – começou a apresentar números cada vez maiores de desmatamento. Anteriormente, o desmatamento aparecia mais no noroeste da Terra Indígena.

Monitoramento realizado pelo Cimi na TI Karipuna, em agosto de 2021. (Foto: André Karipuna)
Entre agosto de 2020 e julho de 2021 a região do rio Formoso registrou 510,3 hectares desmatados – 65% do total de novos desmatamentos verificados no interior da Terra Indígena Karipuna no ano inteiro. Desse total, 94,7% – ou seja, 483,77 hectares – foram desmatados em 2021, entre janeiro e junho deste ano.
Ataque legislativo
A Terra Indígena Karipuna é um dos territórios gravemente prejudicados pela Lei Complementar 1089/2021, que aprovou a redução, em abril de 2021, da Reserva Extrativista Jaci-Paraná e do Parque Estadual Guajará-Mirim.
Essas duas áreas protegidas funcionavam como “escudos” que dificultavam a entrada de desmatadores dentro da TI Karipuna. Com a redução dessas áreas protegidas, por decisão do governador do Rondônia, Marcos Rocha (PSL) – que sancionou a lei em maio – o território do povo Karipuna ficou aberto para a entrada de grileiros e madeireiros que, impulsionados pela política anti-indígena e antiambientalista do Governo Bolsonaro, ameaçam a integridade física, cultural e territorial dos Karipuna e dos povos isolados que circulam naquela área.
Na ocasião, a Reserva Extrativista Jaci-Paraná perdeu 168 mil hectares (quase 90% de seu território) e o Parque Estadual Guajará-Mirim perdeu 55 mil hectares. O ataque legislativo contra as áreas protegidas de Rondônia continua: em setembro, uma nova lei de zoneamento ecológico foi aprovada pelos deputados, abrindo diversas terras para a criação de gado e a plantação de soja.
Crise climática
Líder do povo Karipuna, Adriano Karipuna disse que as autoridades precisam viabilizar meios de proteger o território: “O monitoramento da floresta, feito por nós junto aos parceiros, nos ajuda a entender o que acontece dentro de nossa terra e é fundamental para denunciar atividades ilegais. O Estado deve implementar um plano de proteção permanente para nosso território, com o objetivo de acabar com as invasões e o roubo de madeira de nossa floresta”.

Aumento de 44% de desmatamento mostra a vulnerabilidade da TI Karipuna, que permanece sendo bastante ameaçada. (Foto: Christian Braga/Greenpeace)
A missionária do CIMI Rondônia, Laura Vicuña, contou que a destruição verificada no chão da floresta guarda relação muito próxima com as grandes discussões globais, como o enfrentamento das mudanças climáticas.
“A crise climática começa aqui, com territórios indígenas sendo saqueados, povos indígenas sendo atacados enquanto um governo negligente e conivente não cumpre seu papel para proteger nosso povo e recursos naturais. Para mitigar os impactos da emergência climática, os governos deveriam aumentar as terras protegidas em vez de reduzi-las”, disse Laura, que acumula mais de 20 anos de trabalho junto aos povos indígenas.
Invasão e destruição
Coordenador do Projeto Todos os Olhos na Amazônia, do Greenpeace Brasil, Oliver Salge disse que o Brasil ‘fecha os olhos’ para os criminosos ambientais: “Enquanto o mundo busca desesperadamente soluções para a crise climática na COP26, o Brasil faz exatamente o contrário e permite que criminosos invadam áreas protegidas e destruam a casa dos povos indígenas”.
A Terra Indígena Karipuna possui 152 mil hectares e está situada a 100 quilômetros de Porto Velho, capital de Rondônia. Ela é cercada por fazendas e vem sendo invadida e desmatada desde 2015 – mais de 5 mil hectares de florestas já foram destruídos nos últimos seis anos.
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Carne e soja pressionam a Terra Indígena Karipuna - Instituto Humanitas Unisinos - IHU