Por: André Martins | 22 Outubro 2020
O debate sobre a renda básica universal e incondicionada aumentou após os efeitos da crise pandêmica no mundo. A Covid-19 não atingiu somente a saúde da população, mas também afetou a economia e, com a crise, os trabalhadores foram muito mais afetados do que os ricos. A desigualdade existente foi desmascarada após um forte colapso econômico, fazendo com que a renda universal, uma ideia antiga, fosse posta novamente como solução para diminuir a desigualdade e proteger os mais necessitados em momentos de crise.
A reportagem é de André Martins, estagiário do Curso de Jornalismo da Unisinos.
O assunto, porém, ainda diverge os especialistas. Uma das principais questões de disputa é como a renda universal pode ser implementada pelo Estado. Para tratar sobre essa e outras questões, o Instituto Humanitas Unisinos – IHU promoveu, nesta quarta-feira, 21-10-2020, a palestra “Renda básica universal. Novos modelos econômicos, de proteção social e de reapropriação comum”, com o Prof. Dr. Andrea Fumagalli, da Universita di Pavia, Itália.
Fumagalli iniciou a palestra falando sobre pontos que devem ser vistos como importantes para serem implementados em um programa de renda básica universal. Ele elencou cinco elementos decisivos para que um programa tenha sucesso, entre eles, uma proposta de renda base que seja baseada em questões individuais, ou seja, todos que necessitam e estejam residindo num território precisam receber a renda, independente da cidadania e de qualquer vínculo de comportamento ou obrigação de trabalho. Ele também sugere a criação de um fundo para financiar a renda, para que ela não seja retirada de um balaço público e, caso necessário, a criação de critérios para que a renda seja destinada para a população necessitada. “Minha opinião é que a renda universal seja dada a todos incondicionalmente. Mas nem sempre existem as condições efetivas para serem realizadas. Depende muito da quantidade de liquidez do Estado para realizar a proposta”, afirma.
Para que a implementação da renda universal seja viável, Fumagalli entende que a renda não deve ser entendida somente como uma assistencial social, mas, sim, como uma remuneração que permite ao cidadão decidir o que é melhor para ele.
O economista também explicou que nos últimos 30 anos ocorreu uma grande mudança na valorização do capital, a qual gerou duas alterações: a ampliação da base capitalista – ou seja, atividades que ontem não eram produtivas, hoje, são – e, consequentemente, a valorização social desses trabalhos através de um salário. Por conta disso, ele defende que a renda primária seja vista como lucro e, portanto, renda para os cidadãos.
Mesmo durante a pandemia, ele lembra que houve um aumento do desenvolvimento do trabalho em casa e, independentemente do que possa ocorrer, a produção do capitalismo nunca para. “Nós produzimos valores, viver produz valor. Estamos inseridos em um mundo de valor; hoje nós temos o trabalho sem fim e não o fim do trabalho”. Apesar disso, inúmeras atividades não são nem certificadas nem remuneradas. “Quando estamos no Facebook, por exemplo, temos acesso a atividades gratuitas, mas estamos cumprindo uma atividade”, exemplifica.
Quem lucra com tudo isso são as grandes empresas de tecnologia, que utilizam diversas ferramentas para lucrar em cima de qualquer atividade que realizamos e levam esses lucros para serem capitalizados na bolsa de valores. Isso pode ser visto durante a pandemia, quando essas empresas duplicaram ou até triplicaram seu valor no mercado e seus ganhos. “Hoje as maiores empresas de informática, que usam o Big Data, criaram divisões de educação com o objetivo de produzir mais dados e mais lucros para capitalizar na bolsa”, informa.
Para Fumagalli, a tendência é que se entenda a renda básica como um trabalho não remunerado. A remuneração da vida levanta a ideia de que há uma precificação sobre o cidadão, mas, na verdade, o capitalismo lucra com a vida de todos, sendo ela própria definida como uma mercadoria. Segundo ele, o trabalhador que gera lucros para uma empresa durante a vida toda também precisa de uma renda básica já que, em tese, é peça fundamental do mecanismo que ajuda os ricos a conquistarem mais dinheiro.
Fumagalli explica que a renda universal representaria uma grande mudança no capitalismo, a partir da criação de um fundo amplo, e colocaria até mesmo os trabalhadores em uma condição de vida muito melhor. “Na Itália, onde a porcentagem de pessoas abaixo da linha da pobreza é de 14%, seria possível criar um fundo para pagar uma renda universal a essas pessoas e ainda sobraria 40 bilhões para o governo italiano”, diz. Ou seja, a renda universal é uma realidade possível de ser implementada e traria melhorias na qualidade de vida, além de dar liberdade para o cidadão decidir o seu futuro.
O Instituto Humanitas Unisinos - IHU continuará com o ciclo de debates “Emergência climática: ecologia integral e o cuidado da nossa casa comum” e “A Renda Básica Universal (RBU) para além da justiça social”.
Na próxima segunda-feira, 26-10-2020, o Prof. Dr. Gael Giraud, da Gerogetown University - EUA, ministrará a palestra “A renda universal e a justiça socioambiental. Fundamentos econômicos éticos e teológicos”.
Para participar, acesse o canal do YouTube do IHU ou assista pela plataforma Microsoft Teams.
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Andrea Fumagalli no IHU: A renda básica universal pode dar ao cidadão a liberdade de escolher o seu futuro - Instituto Humanitas Unisinos - IHU