08 Outubro 2020
“Não gostaria de parecer como opositor do Cardeal Ruini, a quem respeito e venero, muito menos faltar-lhe com o respeito. Mas nas suas palavras sinto o eco de um tempo da Igreja que também vivi, mas que hoje mudou profundamente. Em particular, gostaria de fazer um esclarecimento: quem critica o Papa Francisco critica o Concílio”. Herdeiro do pensamento do cardeal Carlo Maria Martini, o padre Bartolomeo Sorge, jesuíta, vive em Gallarate, em uma pequena cela dentro da cidadela filosófica "Aloisianum" ao lado daquela que pertenceu ao grande arcebispo de Milão.
Noventa e um anos, nascido na ilha de Elba de pais de origem de Catania, ex-diretor da Civiltà Cattolica, nos anos 1980 entre os animadores da Primavera de Palermo contra a máfia, Sorge nos convida a ir ao fundo no dissenso ao Papa olhando em geral para o relação existente "entre Francisco e a Igreja italiana".
A entrevista com Bartolomeo Sorge é de Paolo Rodari, publicada por La Repubblica, 07-10-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
Existe um problema entre a Igreja italiana e o Papa?
Tenho a impressão de que a Igreja italiana hoje sofre um pouco de afasia. O Papa expressou sua opinião sobre a Igreja italiana no discurso que proferiu na conferência eclesial de Florença, mas depois se queixou de que esse discurso tenha acabado na gaveta. Seus pedidos ainda não foram atendidos.
O que Francisco pedia?
Mais sinodalidade e uma Igreja em saída e missionária. Não colocar as próprias certezas nas estruturas e nos discursos, mas antes pensar num Sínodo em que todos juntos pudessem enfrentem os desafios do presente. Entre estes, a nova presença dos católicos na política que não pode ser conseguida, aqui concordo com Ruini, por meio de uma nova DC, mas sim no empenho por uma boa política.
Por que parte da Igreja, especialmente italiana, critica o Papa?
Francisco é o primeiro papa do pós-concílio a enfrentar a reforma interna da Igreja de maneira direta e enérgica e isso levanta enormes dificuldades, porque há muito tempo nada se fazia.
Alguns dizem, porém, que ele é um herege, que trai a doutrina.
O que é herege em Francisco é apenas a coragem profética com que enfrenta a reforma interna. Essa reforma traz à tona também os escândalos, como a pedofilia, a má gestão das finanças até o “caso Becciu”. Mas são um sinal de que ele está atuando de forma séria. Se todos baterem palmas, significa que nada mudou. Se, ao contrário, alguns apupam em vez de aplaudir, significa que algo está realmente mudando.
Afinal, por que essas críticas?
Voltam por causa de um mal-entendido de base. Já em 1976, críticas semelhantes foram feitas na primeira convenção eclesial nacional da Igreja italiana. A conferência, por outro lado, trouxe à luz o que o Concílio já havia explicado: o empenho pela justiça é uma parte essencial da evangelização. Setores da Igreja italiana, lembro-me por exemplo da CL, nos criticaram porque diziam que estávamos traindo a doutrina. O mesmo aconteceu com a trigésima segunda congregação de jesuítas, criando dificuldades para o padre Arrupe, porque em um decreto importante afirmava-se que para serem evangelizadores os jesuítas também deveriam promover a justiça. Esse empenho também é exigido pela fé. Muitos católicos hoje não aceitam essa ideia porque pensam que a pregação do Evangelho não tem nada a ver com comprometimento social. Não é assim.
Ruini sempre defendeu os princípios, mas não hesitou em tomar partido politicamente. Hoje ele defende a Lega e os Fratelli d’Itália. O que pensa disso?
A Igreja defende os valores, e esta é a política com o ‘p’ maiúsculo; mas não apoia este ou aquele partido, porque isso significaria fazer política (com o ‘p’ minúsculo!).
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“Dissenso inevitável: Bergoglio está fazendo limpeza”. Entrevista com Bartolomeo Sorge - Instituto Humanitas Unisinos - IHU