Olhos e coração constantemente na África e nos territórios italianos, unidos em um único abraço. Existem duas frentes nas quais médicos e operadores da CUAMM, médicos com a África, a ONG católica que desde 1950 trabalha pelo direito à saúde e à vida junto aos africanos. Dom Dante Carraro, o diretor, retornou do Sudão do Sul na semana passada e de Pádua está coordenando os operadores para se preparar para a onda do vírus na África, onde os contágios aumentam rapidamente e onde, alertou a OMS, o Covid-19 poderia causar uma hecatombe. Mas neste momento, Dom Carraro também está perto da rede de “seus” muitos voluntários que retornaram à Itália de áreas missionárias no continente.
“Juntamente com a dor pelas vítimas, também há muito bem. Exemplos luminosos. Como profissionais de saúde que passam 24 horas por dia, com infinita generosidade, sob risco de vida, muitas vezes com equipamentos escassos. Muitos são amigos que dedicaram anos de serviço na África e agora estão em nosso sistema de saúde, incógnitos e invisíveis, mas com a mesma paixão e resistência. Vivemos de caridade, mas colocamos 100 mil euros como sinal de proximidade na compra de 4 respiradores e dispositivos de proteção nos hospitais de Schiavonia (Pádua), Cremona, Parma e Carate (Milão)”.
A entrevista com Dante Carraro, médico, padre e diretor da "Cuamm-Médicos com a África", é de Paolo Lambruschi, publicada por Avvenire, 29-03-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
Eis a entrevista.
Qual é a situação na emergência Covid-19 na África?
Os números absolutos ainda estão contidos, abaixo de 3.500 positivos em todo o continente. Mas há três semanas, os contágios crescem 22% ao dia. Infelizmente, é uma tendência alarmante. Em alguns países como Egito, Argélia, Marrocos e África do Sul, estão aumentando mais rapidamente. Na África Subsaariana (a mais pobre NdE), existem mais de 100 casos em Burkina Faso e Senegal.
E nos países onde a CUAMM está presente?
Alguns, como Serra Leoa, não foram tocados porque fecharam as fronteiras imediatamente. Eles estavam preparados porque passaram pela epidemia de Ebola com 14 mil casos e uma alta mortalidade. Na Etiópia e na Tanzânia, 13 casos foram registrados. No Sudão do Sul, não há casos confirmados. Nos outros Estados, não ultrapassam a dezena.
Por que tanta preocupação com a África então?
Porque os sistemas sanitários são muito frágeis. Não há capacidade séria de diagnóstico de coronavírus. Em um caso suspeito com tosse, febre e dificuldades respiratórias, no máximo, pode se fazer um raio-X nos pulmões, em áreas rurais nem isso. Pode-se fazer um diagnóstico indutivo visualizando as radiografias, porque existem muito poucos laboratórios capazes de analisar as coletas por swab. Para as terapias, estamos zerados. Vemos na Itália as dificuldades em montar locais de terapia intensiva com respiradores. Outra dificuldade é o oxigênio. Normalmente, um paciente em reanimação após uma intervenção precisa de dois litros por minuto; para um paciente de Covid-19 são necessários 30. Na África, não é possível consegui-los.
O que pode ser feito?
Trabalhamos em três frentes nos 23 hospitais onde temos projetos incluídos nos serviços de saúde locais. A primeira é a contenção, com o isolamento de casos suspeitos que devem ser colocados em tendas separadas e seguidos para preservar os outros doentes e as mulheres grávidas. A segunda medida é a proteção dos operadores italianos e locais com luvas, máscaras, aventais descartáveis. A terceira é a busca dos contatos de um paciente positivo. Portanto, podemos conter e prevenir, mas não podemos diagnosticar e curar. Além disso, se os números forem altos, até o sistema italiano está com dificuldades, vamos pensar no que pode acontecer na África subsaariana, onde os médicos são escassos e a saúde é frágil. Portanto, precisamos de apoio para conter a onda. Será difícil para todos, mas, como o Papa diz, estamos no mesmo barco e devemos ajudar uns aos outros.
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