08 Julho 2019
Organizações de direitos humanos comemoraram o 43º aniversário do Massacre de San Patricio, quando três padres e dois seminaristas da congregação palotina foram mortos por uma milícia da ditadura.
A reportagem é de Washington Uranga, publicada por Página|12, 08-07-2019. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.
A Casa por la Identidad, o edifício das Abuelas de la Plaza de Mayo, localização no Espacio Memoria y Derechos Humanos (ex-ESMA), foi o lugar onde neste sábado, e com a presença de Estela de Carlotto e Taty Almeida, os organismos defensores dos direitos humanos comemoraram o 43º aniversário do chamado “Massacre de San Patricio”, nome com o qual se recorda o assassinato de três padres e dois seminaristas católicos da congregação Palotina, por parte dos militares, em 4 de julho de 1976.
Livro de Eduardo Kimel
O fato aconteceu na paróquia de San Patricio, no bairro de Belgrano em Buenos Aires, onde uma "força-tarefa" crivou a tiros dentro da igreja os padres Pedro Dufau (76 anos), Alfredo Kelly (43) e Alfredo Leaden (57), e os seminaristas Salvador Barbeito (25) e Emilio Barletti (24). No livro intitulado “La Masacre de San Patricio”, o jornalista Eduardo Kimel concluiu que era um grupo da Marinha o responsável pelas mortes. Jorge Bergoglio, hoje papa Francisco e depois arcebispo de Buenos Aires, promoveu em 2005 a abertura da causa de beatificação dos cinco palotinos, que invocando o martírio como motivo. Hoje em Roma, na igreja de San Silvestre, da ordem dos palotinos, há uma placa em memória dos cinco religiosos mortos.
A presidente das Abuelas de la Plaza de Mayo disse na cerimônia realizada na antiga ESMA que os religiosos assassinados representam "a Igreja de Cristo, que todos queremos, comprometidos com os pobres, com os necessitados". Estela de Carlotto também ressaltou que "os mártires nos acompanham, nos honram e nos dão forças para continuar".
Placa na igreja de San Silvestre, em Roma, em homenagem aos mártires palotinos. Foto: Presidencia de la Nación Argentina
Ramiro Varela, membro do Palotinos por la Memoria, destacou "a vontade dos mártires de transformar a realidade dos mais esquecidos e alcançar uma sociedade mais justa e igualitária".
O encontro, coordenado pelo padre Juan Sebastián Velasco, representante da congregação religiosa que as vítimas pertenciam, teve participação do ex-secretário de Culto da Nação (2003-2015) Guillermo Oliveri, e o ex-chefe de governo da cidade Anibal Ibarra.
Ibarra, que, como um promotor foi encarregado de investigar o caso entre 1986 e 1990, fez memória de que "mal tinha entrado na causa, e veio um empregado, Sergio Delgado, que hoje é juiz, com o expediente, e disse 'Isso é indignante, você tem que seguir'". O ex-promotor acrescentou que desde então "olhei folha por folha e uma das coisas que mais me impactou no pessoal foi a camiseta da Mafalda atirada no chão, com traços de sangue dos Palotinos”. Para Ibarra, "a morte de todos eles não foi em vão e é por isso que hoje estamos aqui, em um lugar de memória, lembrando deles".
Camiseta da Mafalda junto aos corpos dos mártires palotinos. Foto: Policia Argentina
O delegado provincial da Congregação Palotina, Juan Sebastián Velasco, que também serve como postulador (promotor) da causa, que é realizada no Vaticano buscando o reconhecimento eclesiástico das vítimas como santos da Igreja Católica, disse: "Esta homenagem nos faz muito bem, porque a causa da canonização não deixa de ser uma causa processual da lei, e os tempos da lei canônica costumam ser muito incômodos”. Ele também admitiu que "a religiosidade popular tem um ritmo diferente, porque a sabedoria do povo vai muito mais rápido", reconhecendo que os assassinados em 1976 já são objetos de culto pelos fiéis católicos, que os reconhecem como testemunhas da fé, sem esperar pela declaração institucional da Igreja.
Para Guillermo Oliveri, os palotinos "foram assassinados pelas costas, como se tivessem traído a fé" e recordou que o assassinato em massa "foi o primeiro e mais brutal dos mais de 150 crimes," que o terrorismo de Estado cometeu contra as diferentes comunidades religiosas da Argentina.
Na mesma ocasião, Taty Almeida, da Madres de la Plaza de Mayo Línea Fundadora, disse que os cinco religiosos assassinados "estão em algum lugar, sei que estão escutando, não os esqueceremos" e encerrou seu discurso dizendo que "para eles e para os 30 mil desaparecidos, continuaremos na luta pela Memória, Verdade e Justiça".
Por ocasião da data comemorativa, a comunidade palotina na Argentina emitiu uma declaração em que afirma, entre outras considerações, que "juntos viveram e juntos morreram". Foi um ataque a uma comunidade comprometida em proclamar o Evangelho. O compromisso de fé os levou a defender o valor de todas as vidas e promover os valores evangélicos da justiça, da paz e do compromisso com os indefesos da humanidade.
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Argentina. 43º aniversário do Massacre de San Patricio. “Os mártires nos dão força para continuar” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU