Quais são as pistas para procurar a porta estreita? Comentário de Ana Casarotti

Foto: canva

22 Agosto 2025

A leitura que a Igreja propõe neste domingo é o Evangelho de Jesus Cristo segundo Evangelho de Lucas 13, 22-30 que corresponde ao 21° Domingo do Tempo Comum, ciclo C do Ano Litúrgico. O comentário é elaborado por Ana Maria Casarotti, Missionária de Cristo Ressuscitado.

Naquele tempo, Jesus atravessava cidades e povoados, ensinando e prosseguindo o caminho para Jerusalém. Alguém lhe perguntou: "Senhor, é verdade que são poucos os que se salvam?" Jesus respondeu: "Fazei todo esforço possível para entrar pela porta estreita. Porque eu vos digo que muitos tentarão entrar e não conseguirão. Uma vez que o dono da casa se levantar e fechar a porta, vós, do lado de fora, começareis a bater, dizendo: 'Senhor, abre-nos a porta!' Ele responderá: 'Não sei de onde sois.' Então começareis a dizer: 'Nós comemos e bebemos diante de ti, e tu ensinaste em nossas praças!' Ele, porém, responderá: 'Não sei de onde sois. Afastai-vos de mim todos vós que praticais a injustiça!' Ali haverá choro e ranger de dentes, quando virdes Abraão, Isaac e Jacó, junto com todos os profetas no Reino de Deus, e vós, porém, sendo lançados fora. Virão homens do oriente e do ocidente, do norte e do sul, e tomarão lugar à mesa no Reino de Deus. E assim há últimos que serão primeiros, e primeiros que serão últimos".

O texto do evangelho deste domingo nos apresenta Jesus a caminho de Jerusalém: Jesus atravessava cidades e povoados, ensinando e prosseguindo o caminho para Jerusalém. É um caminho com um destino claro e, embora não diga quais vilas nem quais cidades, relata a atividade que realizava nessa viagem: ensinando e ressaltando a vontade explícita de “prosseguir o caminho para Jerusalém”.

Mais uma vez, Lucas nos apresenta Jesus como um mestre “em caminho”. Ele é alguém que não caminha sozinho, numa peregrinação focada apenas na oração silenciosa e pessoal. Ele instrui enquanto caminha, conversa com as pessoas ao seu redor e responde às suas dúvidas e necessidades. Durante o tempo que passa pelas cidades, o grupo que o acompanha é testemunha de suas curas e de seus diálogos com diferentes pessoas e situações. Nesse andar “alguém lhe perguntou: "Senhor, é verdade que são poucos os que se salvam?" O texto não disse quem fez a pergunta, possivelmente era uma dúvida e incerteza que tinham várias pessoas que escutavam sua mensagem: a questão de se salvar.

Hoje também existe essa pergunta, embora formulada de outra maneira e assim palpita no coração de muitas pessoas: o que acontece depois da morte? O que nos espera do outro lado? Essa pergunta se intensifica diante da morte de alguém querido, e somam-se celebrações e rituais para que “essa pessoa descanse em paz”, como se, do nosso lugar, pudéssemos ajudá-la a viver uma eternidade tranquila...

Tentar prever o nosso futuro, compreender a razão pela qual certos acontecimentos ocorrem, sejam eles bons, sejam eles maus, administrar o nosso presente para conquistar um bom futuro após a morte, acompanha as perguntas de cada pessoa e da humanidade desde sempre. Diante da insegurança do futuro, alguns preferem viver esta vida tentando negar o que causa dor e nos torna conscientes da nossa limitação como criaturas. Ignorar o próprio sofrimento e o que nos rodeia é tentar viver em pequenos submundos que passam, mas que em algum momento serão atingidos por aquilo que tentamos ignorar. Tentar controlar o presente e prever o nosso futuro, como se isso gerasse tranquilidade, é um engano contínuo que busca fechar os olhos à dor, à injustiça, às muitas formas de violência. É fechar os olhos para a dor própria e alheia, para as injustiças que atingem nossas sociedades. É agarrar-se a mentiras que nos tranquilizam e nos transformam em pequenos autômatos que não complicam o sistema.

"Fazei todo esforço possível para entrar pela porta estreita”

Jesus não responde diretamente à pergunta feita sobre a salvação, mas convida a viver de uma determinada maneira. E nos deixa uma nova pergunta em aberto: qual é essa porta estreita? Onde a encontramos? A imagem da porta estreita é sugestiva, ainda mais considerando que está falando para um grupo de pessoas que eram geralmente campesinos ou pescadores e suas casas possivelmente não tinham portas. Em que circunstância aparece uma porta? Geralmente uma porta separa um ambiente de outro e em algumas circunstâncias serve para restringir a entrada ou passagem de um espaço com outro.

Uma porta estreita deve ser procurada, porque não é fácil de ver à primeira vista, e isso requer um esforço de busca, um diálogo com outras pessoas para ir no caminho dessa porta e assim entrar nela. Para procurar essa porta estreita é preciso viajar com pouca bagagem, ter mobilidade suficiente para percorrer e procurar.

Vivemos em uma sociedade onde se constroem muros que aparentemente protegem determinados grupos de outros, construções que separam e dividem. Lá não há portas que permitam espaços compartilhados ou que protejam uma determinada privacidade e intimidade. Um muro bloqueia o diálogo e, ao contrário, uma porta permite a livre circulação e, ao mesmo tempo, protege do ar frio, do vento e oferece certa proteção.

Em primeiro lugar, Jesus nos convida a fazer o esforço de buscar essa porta estreita que está dentro de nós para que a vida que se esconde nela ilumine nossa existência. Para isso, devemos nos despojar de tudo o que nos pesa, deixar nossas perguntas em suas mãos, colocar nossa vida sob seu olhar para que seja Ele quem nos guie. Ele tem uma resposta de amor para nos dar, mas nos convida a buscá-la, a fazer o esforço para entrar por essa porta!

Uma porta estreita impede a entrada, nesse interior mais íntimo das coisas que são excessivamente grandes. Não é possível entrar aí com uma vida cheia de fardos que engordam a pessoa e impedem viver na lógica do Reino: o egoísmo, a riqueza, o orgulho, o desejo de poder e domínio, a busca de um bem-estar pessoal quando ao nosso redor milhares de pessoas morrem de fome a cada dia. Tudo aquilo que impede a pessoa humana de entrar na lógica do serviço, da partilha, da entrega da própria vida.

Considerando a imagem de proteção, podemos perguntar-nos qual é o tesouro que devemos manter cuidadosamente e exige-nos vigilância para que não seja arrebatado por qualquer vento que sopra ao nosso redor. A salvação chega quando aceitamos Jesus e procuramos seguir suas pegadas. Essa é a porta estreita, uma porta única que leva à vida. A porta estreita converte-se assim em porta grande aberta a todos e todas, sem exclusivismos. Todos somos convidados a seguir o caminho do Senhor. A abertura à universalidade não dilui o conteúdo do convite!

Deixamos ressoar no nosso interior as palavras do Papa Francisco no sábado 28 de agosto 2012 na audiência na Sala Paulo VI:

“Alguns acham que a porta é deles e colocam um cadeado nela e fecham para eles. Outros têm medo de bater à porta. É esse medo que temos de saber se seremos recebidos e aceitos. Outros querem entrar, mas têm medo da porta e tentam entrar pela janela. E assim podemos imaginar tantas situações e me perguntar, que relação tenho com a porta? A porta é Deus, então qual é a minha relação com a porta?”

Nós, homens e mulheres da Igreja, aprendamos a abrir sempre a porta e a ter um ouvido atento a quem bate à porta às vezes com dificuldade. (“Rezar para que a Igreja aprenda a abrir sempre a porta a quem bate, às vezes com força”)

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