03 Julho 2018
Emmanuel Macron fez uma visita ao Papa Francisco em Roma. Uma hora de conversas para se conhecer e passar em revista todos os assuntos.
A reportagem é publicada por Paris Match, 01-07-2018. A tradução é de André Langer.
“Na próxima terça-feira, vou receber o presidente Macron”, avisou-me o Papa com seu sorriso caloroso. Era quinta-feira, 21 de junho, e ele estava a caminho de Genebra. Esta viagem, sem ser qualificada como visita de Estado, é, no entanto, um ato muito solene e protocolar. Mesmo com uma agenda extremamente carregada, o Santo Padre fez questão de reservar o tempo necessário para receber o chefe de Estado.
Semana rica, de fato, para Francisco, que, no dia 28 de junho, deve ter um consistório, cerimônia durante a qual irá criar 14 novos cardeais, incluindo um de seus colaboradores mais próximos, dom Angelo Becciu, 70 anos. O substituto da Secretaria de Estado será nomeado na sequência prefeito da Congregação para as Causas dos Santos. No dia seguinte, o Papa presidirá a missa dos Santos Pedro e Paulo, durante a qual serão abençoados os pálios, ornamento litúrgico que os novos arcebispos metropolitanos recebem. Antes disso, no entanto, terá discutido com o presidente francês alguns temas que lhe são muito caros.
No dia 09 de abril de 2018, no Colégio dos Bernardinos, na presença de todo o Estado católico e de dignitários de outras religiões, Emmanuel Macron explicou que deseja “reparar” a “fracassada” relação entre a Igreja e o Estado, e chamou “os católicos para se envolverem politicamente” estendendo a mão. Este exercício inovador foi acompanhado com atenção pelo Vaticano. De fato, Emmanuel Macron não se parece com nenhum dos chefes de Estado que o papa jesuíta já encontrou.
Macron pode compreender melhor que outra pessoa sua linguagem, porque eles compartilham o mesmo caráter forte, um temperamento reformista, mas sobretudo porque o jovem presidente é um ex-aluno dos jesuítas. Ele recebeu de fato essa educação rigorosa que pertence à maior tradição humanista. Ele é o segundo chefe de Estado da Quinta República a ser contado entre os ex-alunos da Companhia de Jesus. O precedente era o general De Gaulle, cujo pai, além disso, era professor de história em um dos seus colégios parisienses.
O padre Benoît Vermander, professor de ciências religiosas da Universidade de Xangai, participante assíduo de colóquios na Sciences Po, é um dos jesuítas mais brilhantes da sua geração. Ele me explica: “Há, sem dúvida, em Emmanuel Macron uma certa arte do discernimento que o levou a pesar ao mesmo tempo fatores éticos, históricos e práticos, antes de tomar uma decisão. E de ir, de acordo com sua própria expressão, direto ao ponto. Eu também vejo uma característica da nossa educação na maneira como seu discurso mobiliza a memória e a imaginação. Isto é ensinado, entre outras coisas, pela prática do teatro, que foi uma característica da pedagogia jesuíta no século XVII”.
“Tudo isso – prossegue Benoît Vermander –, somado à ambição que ele tem pela Europa e pelo respeito que ele mostra para com as convicções espirituais, apreciadas como uma contribuição para o debate público, é suscetível de encontrar um eco em Francisco. Desde que a arte do discernimento não seja uma simples arte do verbo. Uma atenção concreta deve ser dada à situação dos mais pobres, dos excluídos, e o presidente se comprometa com responsabilidade e humanidade na adoção do pacto global sobre os refugiados que o Vaticano defende ardorosamente no cenário internacional”.
Será que algum dia saberemos o que eles conversaram durante a sua longa conversa privada no famoso escritório papal do Palácio Pontifício, na presença apenas do intérprete francês, o padre Landousies? Podemos facilmente imaginar: acolhida urgente dos migrantes, defesa do meio ambiente, construção europeia, situação dos cristãos mais desfavorecidos do Oriente e a revisão das leis da bioética, o tema mais delicado.
Se muitos analistas políticos querem ver neste evento, em primeiro lugar, uma arma de sedução para o mundo católico, devemos lembrar que todos os presidentes da Quinta República (com exceção de Georges Pompidou) foram recebidos em audiência privada pelo Sumo Pontífice. As visitas de Estado são mais raras: de Gaulle, em junho de 1959, sob o pontificado de João XXIII, depois Jacques Chirac, em janeiro de 1996, sob o pontificado de João Paulo II. De Gaulle retornaria novamente ao Vaticano, recebido por Paulo VI, em maio de 1967.
Valéry Giscard d'Estaing foi recebido por Paulo VI em dezembro de 1975, “ano santo”, e em outubro de 1978 por João Paulo II, que o presidente Mitterrand, por sua vez, encontra em uma visita privada em fevereiro de 1982, poucos meses após sua eleição. Nicolas Sarkozy irá duas vezes à Santa Sé, em 2007 e 2010, sob Bento XVI. Por fim, François Hollande fez uma visita privada ao Papa Francisco em janeiro de 2014. Ele voltaria a se encontrar com o Santo Padre em agosto de 2016, depois dos ataques em Nice e Saint-Etienne-du-Rouvray, e em março de 2017 em Paris, às vésperas do aniversário dos Tratados de Roma.
Geralmente, é durante o primeiro ano de seu mandato que os nossos políticos se encontram com o Bispo de Roma. Isso, obviamente, não representa um questionamento da laicidade. O Papa é um chefe de Estado, de um país de 44 hectares, mas cujo raio de influência é mundial. Sua influência ultrapassa amplamente as muralhas da cidade do Vaticano.
Neste contexto, Giovanni Maria Vian, diretor do L’Osservatore Romano, o jornal diário da Santa Sé, recordou recentemente o peso de Paulo VI na ONU: “Foi ele que, no dia 4 de outubro de 1965, durante o seu apelo à paz na Assembleia Geral da ONU, pediu à ONU para que aceite países até então excluídos, como a China comunista e a Indonésia, mas também aqueles países divididos, como a Alemanha, a Coreia e o Vietnã”.
Essas visitas oficiais dificilmente são uma oportunidade para sondar a alma dos nossos políticos. Elas revelam, antes, uma tradição secular: a França é “a filha mais velha da Igreja”. Desde Clóvis, batizado no século V, nosso país foi construído e unificado em torno da defesa da religião católica. Deste patrimônio, resta um testemunho um pouco desatualizado: o título de “primeiro e único cônego de honra da Basílica de São João de Latrão”, a catedral de Roma. Essa honra foi conferida a Henrique IV e aos seus sucessores em reconhecimento à generosidade do “bom rei”, que destinou as rendas de uma rica abadia francesa à famosa basílica.
Do mesmo modo que o general De Gaulle, Valéry Giscard d'Estaing, Jacques Chirac, Nicolas Sarkozy e agora Emmanuel Macron, os chefes de Estado franceses geralmente recebem essa distinção no final da sua primeira visita. Como revelou Sua Eminência Paul Poupard, decano dos cardeais franceses em Roma, “apesar das aparências, a Santa Sé nunca teve um aliado mais fiel do que a França. Essa bela continuidade está na ordem das coisas”.
Vinte e quatro horas que vão marcar o mandato de Emmanuel Macron, esse jovem presidente tão sensível à História. Quanto à primeira-dama, alguém provavelmente irá salientar que, nas proximidades do palácio Farnese onde, excepcionalmente, o casal presidencial ficou hospedado, há um convento de religiosas suecas, as brigidinas, cujo frontão está adornado com o lema “In Honorem Sanctae Brigittae” (“Em honra de Santa Brígida”). Isso não pode ser inventado!
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Macron e o Papa: nos bastidores da visita ao Vaticano - Instituto Humanitas Unisinos - IHU